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Saiba como funciona a vacina chinesa que será testada no Brasil

Gabriela Ingrid

Do VivaBem, em São Paulo

11/06/2020 12h57

O governo de São Paulo anunciou hoje uma parceria entre o Instituto Butantan e a Sinovac Biotech, farmacêutica chinesa que está desenvolvendo um dos 10 protótipos de vacinas mais avançados do mundo contra o novo coronavírus.

O governador João Doria (PSDB) disse que os testes começam em julho, e o Instituto Butantan terá domínio da tecnologia para produção em larga escala. A previsão é de que a vacina esteja disponível até junho de 2021. "É a ciência que vai salvar vida", disse.

Ao todo, nove mil voluntários serão testados no Brasil.

Como é a vacina

A Sinovac está desenvolvendo uma vacina com o vírus inativado. Por não usar um agente vivo, ela é mais segura, porque é mais difícil causar uma doença. Mas também tem desvantagens.

Segundo Flávio Guimarães da Fonseca*, virologista do Centro de Tecnologia de Vacinas e pesquisador do Departamento de Microbiologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), essas vacinas que usam apenas um pedaço do vírus ou um vírus morto não "acordam" tanto o sistema imunológico e por isso precisam de adjuvantes, substancias que precisam ser adicionadas à vacina para induzir o "sistema de alarme" do corpo.

Esse alarme toca quando uma célula de defesa reconhece o vírus. Ela produz moléculas químicas que atraem mais células do sistema imune para aquele local. "E aí é montada uma resposta intensa, com produção de anticorpo e mais células de defesa". Ou seja, a vacina está funcionando.

O adjuvante usado pelo laboratório chinês é uma formulação de alumínio. "Elas parecem promover altas quantidades de anticorpos neutralizantes", mostrou um artigo da revista científica Nature, no dia 4 de junho. Os mecanismos reais pelos quais o alumínio induz esses altos níveis de anticorpos ainda são uma incógnita, segundo o texto, mas além das vantagens imunológicas que possui sobre outros adjuvantes, o alumínio tem um histórico comprovado e incomparável de segurança e eficácia, que remonta às décadas de 1930 e 1940.

Fonseca disse ainda que, por mais que se use um vírus inativado, o controle de qualidade deve ser grande. Segundo ele, houve um caso clássico de falha de segurança desse tipo de vacina na década de 1950. "Na época, os EUA estavam usando uma vacina contra a poliomielite com o vírus morto. Mas alguns lotes tinham falhas e alguns vírus escaparam vivos, ou seja, não foram mortos pelos processos químicos que eles usaram, resultando na morte de diversas crianças".

No caso da Sinovac, a vacina já passou pelos estudos pré-clínicos, demonstrando segurança em animais de laboratórios, e iniciou os estudos clínicos, em humanos. Assim como a vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford, eles também uniram os protocolos das fases um e dois, feitas na China.

Fase três

A terceira e última fase do teste clínico é o "test-drive" da vacina. "É quando os resultados das duas primeiras fases permitem que os cientistas avancem para um grupo de voluntários de milhares de pessoas", diz Fonseca. Os participantes são divididos em dois grupos: metade toma a vacina e metade recebe um placebo ou uma outra vacina que não protege contra o patógeno estudado.

"Ninguém sabe quem tomou o que, nem os cientistas nem os voluntários. É o que chamamos de duplo-cego. E ele é randomizado, ou seja, sorteia, equilibra os grupos, porque tem um monte de detalhes que podem influenciar no resultado, como a idade dos participantes", diz Alfredo Gilio*, coordenador da clínica de imunizações da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein (SP).

Essas pessoas vão para as suas casas e seguem o dia a dia. Eles são expostos ao coronavírus no ambiente, assim como nós, e são acompanhados durante um tempo. "Pode demorar de três a cinco anos, para saber se as pessoas que receberam a vacina ficam menos doentes em um ambiente natural do que as que receberam só o placebo", diz Fonseca. Entretanto, com a urgência da situação, a união de protocolos acelera o processo de desenvolvimento.

Por que São Paulo

No início de maio, a Sinovac já conversava com outros países e com a OMS para realizar ensaios clínicos de fase três em regiões onde o Sars-CoV-2 ainda se espalha rapidamente.

Em uma entrevista no dia 7 de maio, o diretor-presidente do laboratório Yin Weidong afirmou que "para avaliar se a vacina pode oferecer proteção", era preciso estudar a relação entre a incidência da doença e a vacinação. "Não podemos fazer isso quando não há casos".

A China reduziu o número de novas infecções, por esse motivo a Sinovac buscou cooperação internacional para fazer os testes em outros países, como o Brasil.

Doria afirmou que o contrato que formaliza o acordo foi assinado ontem, no Instituto Butantan, mas teve início no segundo semestre do ano passado, quando São Paulo abriu um escritório em Xangai, na China.

*Fontes entrevistadas para matéria publicada no dia 09/06/2020