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Por que isolar idosos traz ameaça à saúde mental: "A gente indica o oposto"

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Imagem: iStock

Carlos Madeiro

Colaboração para o Viva Bem, em Maceió

24/03/2020 04h00

O isolamento social de idosos em casa, abrigos ou clínicas de repouso foi uma decisão inevitável para protegê-los da covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Entretanto, a medida deve cobrar um custo emocional alto e gerar muitos casos de transtornos mentais como ansiedade e depressão, além de agravar quadros já existentes. O aumento de taxas de suicídio também é uma hipótese que deixa especialistas em alerta.

A necessidade de suspensão de visitas é consenso entre médicos, já que o vírus tem maior taxa de mortalidade em pessoas com mais de 60 anos. Para eles, é indicado apenas o contato por ligações e videochamadas.

Segundo Raphael Boechat Barros, psiquiatra e professor da UnB (Universidade de Brasília), o isolamento pode gerar ou agravar quadros depressivos e de ansiedade. "Depressão em idoso já é difícil de tratar. Um dos pontos que mantemos como crucial no tratamento é a interação, as visitas. O isolamento é o oposto do que a gente indica. Então está perdendo essa parte crucial do tratamento", diz.

Segundo ele, os cuidadores e familiares devem ficar atentos ao primeiro sinal de um idoso com quadro de tristeza aguda. "Nesse período haverá aumento de quadros psiquiátricos. Há clínicas e abrigos que têm médicos, outras não, mas que tem agentes sociais, que têm de ficar atento, e o psiquiatra tem de ser procurado em casos necessários", relata.

Barros afirma que, em outras crises sociais, foi verificado um aumento do número de casos de depressão e até de suicídios. "Isso foi demonstrado em 2008, com H1N1, e vem sendo notado desde a quebra da bolsa, em 1929. Houve quantidades enormes de suicídios. Independe de vírus, há muito problema pela depressão causada tanto pelo isolamento, quanto pela questão econômica", explica.

O médico ainda relata que a crise atual é "gigante" e diferente das outras. Ele afirma que não é momento de se parar os atendimentos ambulatoriais de psiquiatria, como propôs o CFM (Conselho Federal de Medicina). "Isso é uma medida muito questionável. Você tem um paciente estável com o atendimento; se suspender, a chance de entrar numa crise é muito grande. Os atendimentos clínicos são contínuos e necessários".

Inclusive, o professor defende que o protocolo de atendimento emergencial deve incluir a questão de psiquiatria e psicologia, especialmente para os idosos. "Já houve esse protocolo em crises do passado. Agora ainda é recente, mas acredito que vão surgir esses protocolos. Defendemos muito isso, que o Ministério da Saúde amplie agenda", diz.

Cuidados necessários

José Reinaldo Júnior, geriatra e professor da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco), concorda com os riscos, mas alerta que não se deve abrir brechas para visitas.

"Esses pacientes, se têm problemas, vão surgir comorbidades: um que vai afetar o rim, outro vai ter infecção e precisar de antibióticos de largo espectro; aí haverá necessidade de leitos, assistência de enfermagem. Tem uma série de situações que, se o vírus chegar lá, será terrível", diz.

Para ele, este é um momento de grande responsabilidade dos funcionários das casas de longa permanência para tentar suprir essa falta. "Os poucos funcionários que mantêm contato devem ter um bom grau de empatia, acolhimento e perspicácia de saber perceber quando alguém tiver em um nível de sofrimento emocional maior, o que pode gerar até um suicídio", explica.

Ajuda é fundamental

Para Mariza Baumbach, pedagoga e analista comportamental, uma das preocupações que também deve ser levada em conta é o acesso às informações nesse período. "Idosos ficam expostos a uma quantidade de informações excessiva, e isso gera muita ansiedade. É preciso filtrar um pouco, tanto os abrigos, como aqueles que estão isolados em suas casas. Esse filtro é importante, porque gera até um pânico já que eles estão em um risco maior", diz.

Baumbach defende que, já que o isolamento é fundamental, são necessárias ações em abrigos que mantenham os idosos ativos.

"É preciso trabalhar um pouco mais desse relacionamento para que a gente tenha qualidade de vida nesse período. O que a gente já vê são pessoas que têm acesso ao WhatsApp adotando idosos para dar um bom dia, um boa tarde. Como nem todo mundo tem acesso a esse tipo de tecnologia, é necessário que haja um trabalho para fazer uma contação de história, conversar com eles —cumprindo a exigência de espaçamento. Essas pessoas que estão no dia a dia precisam ter um pouco mais de paciência, de carinho", finaliza.