Não precisa se privar para ter dieta saudável: conheça o "comer intuitivo"
Resumo da notícia
- Comer intuitivo é uma abordagem que visa mudar a relação com a comida e estimular o autoconhecimento
- Permissão incondicional para comer, comer quando tiver fome e parar ao ter saciedade são os pilares desse método
- Tem como princípio abolir a ideia de dietas tradicionais e padronizadas
- Fazer as pazes com a comida, respeitar seu corpo e evitar usar a comida para lidar com problemas emocionais são alguns dos princípios
- Pessoas que praticavam o comer intuitivo melhoraram sua autoestima, a imagem corporal e a qualidade de vida, além de terem menos depressão e ansiedade
Quantas vezes você já fez dietas ou deixou de comer alimentos que gostava para emagrecer? Uma abordagem conhecida como comer intuitivo (intuitive eating, em inglês) define que esses comportamentos não são eficazes, pois o ideal é ter uma relação saudável com a comida, conhecer o próprio corpo e as emoções.
O método, que foi criado na década de 1990, baseia-se no princípio de que as dietas restritivas não funcionam e a pessoa precisa se alimentar quando estiver com fome e parar ao se sentir saciada, seguindo um processo intuitivo, de acordo com a sabedoria interna do corpo. Por isso, acredita-se que cada um é o especialista e o responsável pelo seu próprio organismo.
"A proposta é aprender a confiar na habilidade de reconhecer sensações físicas e emocionais e desenvolver um autoconhecimento para atender às necessidades individuais para se alimentar adequadamente", destaca Marcella Garcez, nutróloga e diretora da Abran (Associação Brasileira de Nutrologia).
O comer intuitivo se baseia em três pilares:
- Permissão incondicional para comer;
- Alimentar-se para atender necessidades fisiológicas e não emocionais;
- Seguir os sinais internos de fome e saciedade.
De acordo com os especialistas consultados, não se trata de permissividade, ou seja, comer tudo o que encontrar pela frente, mas de não seguir as regras externas ou impostas por terceiros para se alimentar. E para conseguir comer de forma intuitiva, a pessoa precisa distinguir entre a fome emocional e a física, ou seja, identificar o processo biológico da fome e não se alimentar como uma forma de compensação ou se privar de determinados alimentos.
"O comer intuitivo é um modelo baseado em estudos que tinham a proposta da 'não-dieta', tratam das consequências das dietas restritivas e a importância de seguir os sinais internos do organismo. A fome e a saciedade são usadas como um guia para comer saudavelmente e manter uma sintonia entre corpo, comida e mente", explica Marle Alvarenga nutricionista, idealizadora do Instituto Nutrição Comportamental e especialista no método Comer Intuitivo.
É importante destacar que as pessoas nascem com a habilidade de se alimentar e com a sabedoria interna para regular a alimentação, segundo as suas necessidades corporais. O desafio é conseguir identificar os sinais de fome e saciedade.
Os 10 princípios do comer intuitivo
As criadoras do método Comer Intuitivo, Evelyn Tribole e Elyse Resch, destacaram no livro Intuitive Eating: A Revolutionary Program That Works quais são os princípios que podem contribuir para que ocorra uma relação mais saudável com os alimentos. Veja detalhes, a seguir.
1. Rejeite a mentalidade da dieta
O primeiro princípio destaca a importância de abolir a ideia de dietas tradicionais e padronizadas. Por isso, é importante abandonar a falsa esperança de perder peso rapidamente de forma fácil com as novas dietas "milagrosas" que surgem todos os dias.
Além disso, é necessário fugir das restrições e privações indicadas por essas dietas, uma vez que geram comportamentos que não são saudáveis e não costumam ser sustentáveis por muito tempo, o que pode gerar a sensação de fracasso. Para começar a comer de forma intuitiva é necessário abandonar as regras externas e passar a respeitar o próprio corpo.
2. Honre a sua fome
A fome não é inimiga. Ela é um processo biológico que indica que o corpo precisa ser alimentado com os nutrientes adequados. É importante perceber os sinais de fome, tais como perda de energia ou estômago "roncando" para se alimentar adequadamente, evitar comer demais e depois se sentir culpado por esse comportamento. Por isso, aprenda a respeitar esses sinais biológicos (fome e saciedade) para restabelecer a confiança no seu corpo.
3. Faça as "pazes" com a comida
É importante abandonar a ideia de que há alimentos proibidos ou "inimigos" da dieta. A relação com a comida deve ser leve e prazerosa e os alimentos não devem ser categorizados em bons ou ruins. Dessa forma, a pessoa sente mais liberdade para escolher os alimentos e diminui o risco de entrar em ciclos de restrições e exageros.
"Nos relacionamos com o alimento desde o ventre materno e isso perdurará até nossa morte. Assim, se existem problemas com a comida, eles devem ser solucionados, pois não devemos esquecer dos múltiplos papeis que a alimentação desempenha em nossa vida. A culpa só traz sofrimento e alimenta o ciclo de compulsão alimentar", destaca Vera Salvo, nutricionista clínica e pós-doutorada em Mindful Eating pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
4. Desafie a "polícia" alimentar
É importante parar de julgar a sua alimentação e também evitar que os outros façam isso. Essas críticas apenas destacam que existe apenas uma forma correta de se alimentar, o que não é verdade. Além disso, evite pensamentos depreciativos logo após comer um doce, por exemplo.
5. Sinta a saciedade
É preciso aprender a sentir a saciedade e respeitá-la. Por isso, é fundamental comer com atenção e calma e prestar atenção aos sinais do corpo. Compreender se está comendo por necessidade ou apenas por compulsão ou tédio também é importante.
"As pessoas não conseguem identificar a fome e confundem com a vontade de comer. A fome é a necessidade física de comer e há sinais corporais para isso. Se alimentar muito rápido também atrapalha processar a saciedade. A regra número um é comer quando está com fome e parar quando se sente saciado", destaca Alvarenga.
6. Encontre o fator satisfação
Tornar o ato de comer um prazer e uma experiência agradável faz toda a diferença. É importante sentir o sabor dos alimentos, ter apetite, comer lentamente, observar o corpo recebendo energia e ficando nutrido.
"A alimentação é um ato social e tem relação com o prazer, portanto se alimentar sem ter culpa é sempre o ideal", expõe Guilherme Renke, endocrinologista, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).
7. Lide com as emoções sem usar a comida
A alimentação não deve ser usada como um mecanismo para aliviar os problemas emocionais. É comum que os alimentos sejam consumidos para regular emoções como estresse e ansiedade. É importante buscar outras maneiras de lidar com os problemas cotidianos para evitar comer mesmo sem fome.
"O processo de escolha alimentar é muito complexo e por isso é importante estar consciente dos motivos que nos levam a comer. Alimentação e emoção andam juntas e para entender essa relação é preciso olhar para dentro e buscar autoconhecimento", destaca Thais Perricelli, nutricionista comportamental da Clínica de Estudos e Tratamento em Transtornos Alimentares e Obesidade da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro.
8. Respeite o seu corpo
Não existe um corpo "ideal" e por isso é fundamental respeitar e aceitar cada tipo físico, independentemente de tamanho ou peso. Comer de forma intuitiva exige metas realistas de mudanças corporais e uma relação positiva com o corpo e a alimentação.
9. Pratique exercícios físicos
Ter uma rotina de atividade física é importante para a saúde, mas não deve ser focada em queimar apenas calorias. O exercício ajuda a dar mais prazer ao corpo e a prevenir doenças. Escolha um esporte ou atividade que proporcione bem-estar.
10. Honre a sua saúde
Procure sempre fazer escolhas saudáveis e evite restrições alimentares. É importante buscar o equilíbrio das ações e os alimentos que dão prazer para transformar o corpo e a mente.
"O ideal é que as pessoas tenham um relacionamento saudável com seu hábito alimentar, sem culpas, sem ansiedade, sem estresse. Porém, é importante fazer boas escolhas, ter um conhecimento mínimo sobre as condições de saúde e as necessidades pessoais", expõe Marcella.
Mas seguir isso faz bem à saúde?
Os estudos científicos sobre o assunto crescem a cada dia. Uma pesquisa mostrou que as pessoas praticantes de um comer intuitivo melhoraram sua autoestima, imagem corporal e qualidade de vida em geral, além de apresentarem menos depressão e ansiedade.
Sabe-se que o comer intuitivo contribui para escolha de alimentos mais saudáveis e menos calóricos. Também reduz os fatores de risco para transtornos alimentares e diminui o risco cardíaco. Uma pesquisa mostrou que essa abordagem também estava associada a um menor IMC (índice de massa corpórea) em mulheres de meia-idade.
Outro benefício pode ser a diminuição do peso, apesar de não ser esse o objetivo. "Quando estamos mais atentos a possíveis sintomas clínicos, conectados com nossas necessidades físicas e emocionais, honrando nossa fome e respeitando nossa saciedade, a tendência é o corpo ir se ajustando aos poucos. Dessa forma, vão diminuindo os excessos alimentares que, juntamente com um estilo de vida mais ativo, pode contribuir com a perda de peso", afirma Perricelli.
Não há riscos de praticar o comer intuitivo, mas há algumas situações em que essa abordagem não é recomendada. É o caso de quem tem anorexia nervosa ou compulsão alimentar. Isso porque essas pessoas possuem os sinais de fome e saciedade totalmente alterados pela dinâmica das doenças. Por isso, esse grupo precisa primeiro tratar esses transtornos alimentares antes de iniciar o comer intuitivo.
Por onde começar?
Nem sempre é fácil reconhecer os sinais fisiológicos e emocionais relacionados ao consumo alimentar. E mudar os hábitos também pode ser bastante complicado. Por isso, para quem está querendo comer de forma intuitiva, a indicação é buscar um especialista que possa fornecer informações sobre o assunto, propor estratégias e promover a autorreflexão dos hábitos alimentares.
"Se alimentar de forma intuitiva propõe novos relacionamentos fisiológicos, sociais e emocionais com a comida. Tem como objetivo quebrar paradigmas da rígida visão atual das dietas ditas saudáveis. É uma ótima proposta, mas deve ser mediadas com orientação de especialistas da área para ser eficaz", diz Marcella.
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