Topo

Gustavo Cabral

O problema da judicialização da vacina é a não compreensão da ciência

Colunista do VivaBem

18/12/2020 10h56

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

O termo "obrigatoriedade de vacinação" tem gerado certa rejeição em muitas pessoas. Porém, há uma lista enorme de vacinas que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) torna obrigatória, por questões de recomendações pelas autoridades sanitárias. Ou seja, obrigatoriedade já existe.

Mas no caso da covid-19, isso não deveria ter chegado a esse ponto. Qualquer pessoa com o mínimo de educação e compreensão do básico deveria querer ser vacinada e não fazer isso só por obrigação. Entre os fatores que deveriam fazer as pessoas desejarem a imunização podemos citar a questão de o "mundo estar parado", com um prejuízo humano e financeiro incalculáveis, e por sabermos que a maneira mais eficiente de voltarmos a fazer "o mundo girar" novamente é com a vacinação em massa. Lembrando que, depois da água potável e do saneamento básico, a vacina é a "arma" mais eficiente de combate a doenças infecciosas.

No entanto, a sociedade brasileira anda desorientada ao ponto de haver a judicialização da obrigatoriedade de vacinação contra a covid-19. E o problema de judicializar a vacinação, neste momento, é que gera uma questão crucial: a obrigatoriedade é a partir da liberação para uso emergencial ou apenas com o licenciamento em definitiva para uso humano?

Esse fato é de extrema importância, pois a autorização para uso emergencial é com dados preliminares que levam à vacinação com as imunizações ainda em teste. Devido a isso, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) solicitou a possível assinatura do chamado "Termo de Consentimento Livre e Esclarecido", que é muito comum, na verdade, obrigatório, para pessoas que aceitam se voluntariar em qualquer teste científico, como esses das vacinas. E isso tem acontecido em outros lugares, por exemplo, na Inglaterra, onde a vacina da Pfizer/BioNTech foi autorizada para uso emergencial.

Vale ressaltar que o STF (Supremo Tribunal Federal) tomou uma decisão racional, ninguém vai entrar em nossas casas com uma agulha e nos obrigar a se vacinar, mas deu o aval para Estados e Municípios imporem restrições para quem não quiser se vacinar contra a covid-19

Ou seja, uma pessoa que decidir não se vacinar, está colocando seu direito pessoal de escolha sobre o direito da saúde pública. Desta forma, o estado e/ou município pode exigir que essa pessoa não frequente lugares públicos, como clubes, ou que obrigue uma empresa de transporte a exigir que a pessoa apresente o cartão de vacinação, ou até mesmo uma empresa só contrate alguém que esteja vacinado, ou uma pessoa só consiga assumir um concurso prestado e aprovado se estiver vacinado. Resumindo: pode haver diversas restrições para as pessoas que decidirem colocar sua decisão pessoal acima do direito social.

Todavia, tudo isso poderia ter sido evitado se o Ministério da Saúde tivesse trabalhado de forma correta. Se tivesse proposto um Plano Nacional de Imunização (PNI) com bastante antecedência, negociado com diversas fontes (empresas, laboratórios?) de vacinas e, o mais importante, se tivesse no PNI um esquema de orientação social de forma correta e que levasse a sociedade ao engajamento da vacinação.

Mas, infelizmente, isso não tem acontecido. Pelo contrário, as pessoas que deveriam estar liderando a campanha, em especial o presidente da república, têm trabalhado fortemente para gerar o caos, a desordem e a politização da "arma" mais importante contra a covid-19, a vacinação. Ao ponto de o presidente falar que as pessoas que queiram se vacinar terão de assinar um termo de responsabilidade e irão assumir qualquer efeito colateral que ocorra —disse ainda não se responsabilizar se a "pessoa virar jacaré" por causa da vacina (!) e mais algumas bobagens. Também afirmou que não irá se vacinar.

Ainda houve a famosa batalha contra a Coronavac (a vacina chinesa), gerando preconceito, rejeição e politização, além das ações contínuas a favor do coronavírus que o presidente tem. Tudo isso acaba influenciando nessa desorientação social e, consequentemente, acabamos chegando à judicialização da vacinação contra a covid-19.