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Dante Senra

O que você e seu médico devem saber antes de você tomar anticoncepcional

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

16/11/2019 04h00

Ao chegar no mercado na década de 60, a pílula anticoncepcional revolucionou o comportamento das mulheres e por isso, tornou-se o símbolo da revolução sexual feminina.

Mesmo sem conhecer plenamente os riscos, ela ganhou a confiança das mulheres, já que sempre foi extremamente eficaz para o que se propõe (sua taxa de falha é da ordem de 0,1%, se tomada corretamente). No Brasil, cerca de 27% das mulheres em idade fértil utilizam este método contraceptivo.

Estima-se ainda que até 2030, 778 milhões de mulheres no mundo usarão pílulas, sendo o aumento mais significativo nos continentes com países menos desenvolvidos (África e sul da Ásia), já que são os que registram menor uso de métodos eficazes para prevenir a gravidez.

Isto se deve basicamente a melhora no poder aquisitivo e a maior participação da mulher no mercado de trabalho, além do entendimento do casal da chamada "natalidade responsável".

Mesmo assim, uma pesquisa da Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (entre 2011 e 2012) mostrou que 55% das mulheres brasileiras que tiveram filhos não haviam planejado a gravidez, número acima da média mundial, de 40% de gestações não planejadas.

Benefícios do uso da pílula

Além de extremamente eficazes para evitar a gravidez não desejada, outros benefícios são alcançados quando bem indicadas e escolhidas conforme a ação desejada.

Algumas pílulas podem reduzir os sintomas da chamada TPM (tensão pré-menstrual) como irritação, ansiedade e o nervosismo típicos desse período. Podem ainda reduzir a quantidade do fluxo menstrual e as cólicas todos os meses.

São utilizadas também no tratamento da chamada síndrome dos ovários policísticos que pode se manifestar com irregularidade menstrual, acnes, oleosidade excessiva da pele ou aparecimento de pelos em diversas regiões do corpo, inclusive no rosto. Ainda podem ter efeito sobre uma das queixas mais frequentes das mulheres, a retenção de líquidos e o inchaço.

Outro benefício incontestável é a atenuação do risco de desenvolver câncer de ovário e de intestino grosso e reto.

Entretanto, como cada uma delas tem dosagens e tipos de hormônios diferentes (existe uma infinidade com características, indicações e efeitos colaterais distintos) é o seu ginecologista que deve avaliar qual é a melhor pílula para você e diga como ela deve ser tomada.

O que é preciso saber antes do uso?

Os efeitos desses hormônios contidos nas pílulas podem causar aumento da sensibilidade e dor mamária além da sensação de inchaço. Muitas mulheres experimentam um ganho real de peso decorrente do aumento de apetite. A perda da libido também é uma queixa frequente. Nestas situações, a troca do anticoncepcional pode resolver o problema.

Paradoxalmente, algumas situações em que ela se encontra indicada como dores de cabeça e alterações de humor, podem ser por ela produzidas e seu uso precisa ser revisto.

Embora incomum, algumas mulheres que tomam pílula podem ainda desenvolver aumento da pressão arterial e aí, a retirada da medicação precisa ser feita.

Mas, indiscutivelmente, seus efeitos colaterais mais temidos e com razão (embora as novas pílulas utilizem níveis mais baixos de hormônios, o que diminui a incidência), são as alterações na coagulação por elas produzidas, que podem ocasionar tromboses, embolias, infarto no coração e acidente vascular cerebral.

Dados da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) indicam que mulheres que usam anticoncepcional correm risco de quatro a seis vezes maior de desenvolver trombose em um ano do que aquelas que não utilizam métodos contraceptivos hormonais. Este risco aumenta substancialmente em mulheres obesas, com histórico familiar de trombose, idade acima dos 35 anos, hipertensas, fumantes e aquelas que sofrem com enxaqueca com aura.

Segundo o Ministério da Saúde, o risco de infarto do miocárdio, embolia pulmonar e trombose em mulheres que usam anticoncepcionais orais e fumam chega a ser dez vezes maior que o das que não fumam e utilizam esse método de controle de natalidade.

Em 2011, um estudo realizado no Hospital de Transplantes do Estado de São Paulo com 400 mulheres entre 20 e 45 anos que tiveram trombose venosa foram acompanhadas, das quais 180 (45%) fumavam e também usavam este método contraceptivo.

Para as que apresentam esses fatores de risco para trombose, óbvio que o ideal seria encontrar outro método contraceptivo, mas quando não há a aceitação da mudança, devem utilizar as chamadas pílulas simples. Também chamadas de minipílulas, elas contêm apenas o hormônio progesterona e sua escolha é uma opção "menos pior", visto que o que traz o risco maior para a trombose é o estrogênio.

Outra informação de extrema importância é que 10% das mulheres apresentam uma mutação genética que podem levar à formação desses temíveis coágulos nas artérias e veias —uma condição chamada Trombofilia. A simples presença dessa condição aumenta o risco de tromboses por si só em 10 vezes. Se ainda faz uso de anticoncepcional com hormônio combinado, esse risco pode chegar a 30 vezes mais.

Embora seja hereditária, transmitida de geração em geração, a trombofilia pode se manifestar em qualquer período da vida.
Mulheres com esse diagnóstico não devem fazer uso dos hormônios contidos nas pílulas anticoncepcionais e dos remédios para reposição hormonal (na menopausa).

Portanto, antes do uso vale muito pedir a seu médico o exame que detecta essa mutação —que desde 2017 é garantido a toda mulher do município de São Paulo.

Assim, toda mulher que decide usar um método contraceptivo deve:

  • Ser orientada pelo seu ginecologista (não é uma escolha que deva fazer sozinha);
  • Estar com seus exames médicos em dia e em boas condições de saúde (controle de peso, pressão arterial, glicemia, exames das mamas, fígado, além do Papanicolau);
  • Lembrar que a pílula é um medicamento como outro qualquer e, portanto, qualquer anormalidade seu médico precisa estar ciente;
  • Pedir a ele exames de sangue para investigar a possibilidade de trombofilia;
  • O simples histórico familiar de tromboses ou doenças cardiovasculares faz repensar a indicação do anticoncepcional.

Vale lembrar que a educação sexual de jovens, adolescentes e orientação dos pais, é fundamental para diminuir os índices de gestações indesejadas e construção de uma sociedade com paternidade responsável. Mas isso vai mais além... se o método escolhido para a contracepção for o anticoncepcional, não basta oferece-lo gratuitamente. É preciso facilitar o acesso à profissionais especializados que possam orientar a escolha de forma individualizada da melhor medicação.