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É mais difícil mulher que namora mulher tornar pública a relação?

Alice Braga revelou relacionamento com a também atriz Bianca Comparato: a confirmação foi dada pelas assessorias das famosas à imprensa -
Alice Braga revelou relacionamento com a também atriz Bianca Comparato: a confirmação foi dada pelas assessorias das famosas à imprensa

Nathália Geraldo

De Universa

15/01/2020 04h00Atualizada em 15/01/2020 11h42

Para pessoas LGBT, falar sobre a própria orientação sexual pode ser uma tarefa emocional pesada, principalmente porque os dados de crimes de homofobia no Brasil ainda são aterrorizantes. Fato é que, de uns tempos para cá, atrizes como Alice Braga e Bianca Comparato, Camila Pitanga e Beatriz Coelho, o casal Maria Maya e Laryssa Ayres e a cantora Ludmilla (que forma o 'Brumilla' com sua mulher Bruna Gonçalves) revelaram o namoro com mulheres.

As duas primeiras, segundo informou a imprensa, mantiveram o relacionamento por mais de três anos antes que ele viesse a público.

A atriz Nanda Costa e a percussionista Lan Lahn, hoje casadas, também preferiram manter o relacionamento em segredo por mais de cinco anos - antes de mostrarem o amor para o Brasil inteiro, na capa da revista MarieClarie, em agosto de 2018. Nanda, que está no ar como Erika na novela "Amor de Mãe" afirmou que o casal não tratou do tema em público antes "por medo e por preconceito, entre outros motivos".

Nanda Costa e Lan Lanh  - Reprodução/Instagram - Reprodução/Instagram
Nanda Costa e Lan Lanh falaram sobre relacionamento cinco anos depois de estarem juntas
Imagem: Reprodução/Instagram

Para a psicóloga Beatriz Rosa Moreira, o tempo de espera para revelar um relacionamento não heterossexual é influenciado por vários fatores -o medo de ser hostilizado é um deles.

"Falar sobre isso está mais comum, e acredito que, para mulheres, com a chegada do feminismo, do feminismo negro, há um impulsionamento para elas lutarem [e terem coragem de se expor]", analisa. "Mas o fato de essas atrizes revelarem relacionamentos pode atingir de alguma forma mais as pessoas que não são LGBTs; gera mais visibilidade do que representatividade."

A psicóloga da linha de psicodrama Daniela Cardoso, focada em pessoas trans e LGBTs, pondera que a abertura de mais mulheres falando que amam mulheres pode facilitar que outras pessoas LGBT também se sintam livres para falar sobre sua sexualidade, ainda que a sociedade esteja sob uma estrutura de relações machista e patriarcal.

"Falar abertamente sobre a orientação sexual e o modo com que têm a vida sexual/afetiva pode incentivar as outras. Mas vale dizer que não é necessário fazer esse anúncio, já que os heterossexuais não fazem esse tipo de movimento."

Sexualidade x vida pública

Na opinião da blogueira de Universa Ana Angélica Martins, a Morango, mulheres bi, lésbicas ou de outra orientação sexual falarem sobre suas relações não heterossexuais é sempre um ato de coragem, especialmente quando são pessoas públicas. Ela escreveu sobre o tema em sua coluna, aliás, falando sobre o fato de amor ser resistência.

Ela avalia ainda que a ideia de que o homem gay sofre mais preconceito e tem mais dificuldade de assumir namoros por conta de vivermos em uma sociedade machista nem sempre condiz com a realidade.

"Abrir uma parte tão íntima da vida, que é a sexualidade, não é mais fácil para mulheres do que para homens. Se assumir não é mais fácil. Isso pode trazer impactos que podem ser negativos, a maioria das pessoas que se assumiu conta que perdeu contrato, por exemplo", explica.

"Disseram que a Alice Braga, por exemplo, falou da relação porque era conivente porque vai lançar um trabalho. Na verdade, não tem nada de conveniente, é corajoso fazer isso agora. Afinal, se ela não tivesse nenhuma produção no momento, diriam que a informação era para chamar atenção."

Alice Braga e Bianca Comparato - montagem com fotos de Gil Inoue e Zanone Fraissat/Folhapress - montagem com fotos de Gil Inoue e Zanone Fraissat/Folhapress
Neste ano, Alice Braga e Bianca Comparato assumiram publicamente seu relacionamento amoroso
Imagem: montagem com fotos de Gil Inoue e Zanone Fraissat/Folhapress

Assumir sexualidade não é obrigação

Beatriz avalia que, se uma pessoa pública ou anônima tem uma orientação sexual que vai contra a heteronormatividade social, deve respeitar suas próprias condições e limites ao falar sobre com quem se relaciona.

"Não adianta se forçar a falar sobre orientação, se tem noção do ambiente hostil em que vive. É preciso formar um círculo social seguro, ambientes em que você possa se expressar."

Na opinião da psicóloga Daniela Cardoso, que se identifica como lésbica, a definição de as artistas serem bissexuais ou lésbicas cabe a elas. "Uma coisa é certa: dar nome às coisas faz com que elas existam, mas ninguém precisa dizer a qual 'quadradinho' pertence. Por fim, só elas podem dizer como elas são."

Se uma pessoa LGBT se sente com vontade de compartilhar sua vivência com familiares e amigos, é necessário um movimento de autoconhecimento e reconhecimento da rede de apoio que terá para se colocar no mundo.

"Eu mesma fiquei por muito tempo pensando se ia assumir minha sexualidade ou não, e eu sou psicóloga". "Aí, fui entendendo que era uma questão de marcar lugar e que talvez não me interessaria ter relações com pessoas que não aceitariam quem eu sou de fato".

Como se assumir de forma segura?

Não há um manual para falar sobre sexualidade para amigos, familiares, no trabalho. O apoio de profissionais da psicologia, no entanto, pode fazer diferença.

"É importante se respeitar, entender o quanto é importante que as pessoas saibam. E se não conseguir fazer esse diálogo sozinha, por que não procurar um profissional? A ajuda terapêutica, por vezes, pode ser procurada antes mesmo de a pessoa LGBT se relacionar com alguém. Aí, a pessoa pode estar mais preparada para um relacionamento", afirma Daniela.