Ela tem 75 anos e acaba de tirar a primeira habilitação para dirigir
A dona de casa Agostinha Vidal dos Santos, que completa 76 anos no dia 28 de agosto, tirou recentemente sua permissão para dirigir, um sonho que tinha desde jovem. Quando a reportagem do UOL conversou com ela, Agostinha havia acabado de receber a ligação da autoescola, avisando que o documento estava pronto. Abaixo, ela narra a própria história.
“Desde que eu me entendo por mulher, eu tenho vontade de aprender a dirigir. Até os meus 20 e poucos anos eu tentei dominar o volante. Meu marido tinha um fusquinha e se ofereceu para me ensinar, mas ele não tinha paciência. Uma vez, estávamos em uma estrada e ele gritou comigo enquanto eu dirigia, porque o carro não estava reto na pista. Eu encostei, desci e bati a porta. Disse que nunca mais aprenderia com ele.
Cumpri a palavra e nem sequer coloquei a chave de um carro no contato por décadas. Mas, em 2001, o meu marido morreu, e eu percebi que o meu orgulho tinha me prejudicado. Sem ele, eu precisava toda hora pedir aos meus filhos para me levarem aos lugares, especialmente ao mercado. Eu já não considerava a ideia de aprender a dirigir, por medo de não passar nos exames médico e psicológico, que são a primeira etapa do processo. Até que, este ano, a minha neta, a Lohaine, foi tirar a carta de motorista dela e me deu vontade de fazer o mesmo.
Tive dúvidas, mas ela me convenceu que aquilo era o que eu precisava para provar a mim mesma que era capaz. Já nas aulas teóricas, os outros alunos e o professor me apoiaram muito. Mas no dia de fazer o exame teórico no Detran [Departamento Estadual de Trânsito], eu me apavorei. Cheguei lá e a prova era feita em computadores, e eu não sabia mexer. Levantei o braço e falei para a monitora que estava desistindo da prova. Mas ela teve paciência e me mostrou o passo a passo, onde eu tinha que clicar até chegar ao teste. Fui em frente e fiz. Acabei a prova muito rápido, porque eu tinha estudado em casa. Peguei meu resultado na hora e eu estava aprovada. Mais uma fase concluída!
Então, comecei a fazer as aulas práticas. Primeiro no simulador e depois no carro. No começo, foi difícil aprender a pisar na embreagem e trocar a marcha, mas eu peguei o jeito na terceira aula. Fiz todas as aulas necessárias e marquei a prova prática. Só que, na semana, eu fiquei com medo. Falei para a autoescola que queria desmarcar, porque não estava segura. Aí eles me deram, sem cobrar, mais uma aula. Eu estava confiante, porém, no fim da aula, fiz a baliza e derrubei os cones. Desanimei de novo. Aí o instrutor me disse que me daria uma última aula no dia seguinte, que eu deveria encontrá-lo às 6h30.
Eu fui. Mas achei muito esquisito, porque cheguei no ponto de encontro e vi um monte de carros de autoescola, várias pessoas na rua. Percebendo a minha cara de espanto, ele olhou e disse: ‘Se eu contasse que o exame era hoje, a senhora ficaria nervosa de novo. E eu quero que dirija como se estivesse nas nossas aulas’. Ele tinha razão. Já estava lá, né? Fui em frente.
Logo que eu acabei o teste, o instrutor do Detran olhou para mim e disse: ‘A senhora vai ter que treinar muito ainda’. Eu respondi que sabia disso, mas que, mesmo se não fosse aprovada, já estaria de parabéns. Porque até pouco tempo eu sequer colocava a chave no contato. E eu me orgulhava de ter enfrentado a realidade e aprendido alguma coisa.
Ele só sorriu. Soube um pouco depois que havia sido aprovada. Foi uma alegria! Liguei para minha neta, minha filha e meu filho, nessa ordem. Meus filhos ficaram muito surpresos, porque nem sabiam que eu estava fazendo aulas. Me encheram de perguntas, é claro. Mas acho que agora acreditam que eu consigo.
Hoje, o plano é tentar comprar um carro com direção hidráulica, porque o que o meu marido deixou é muito duro e eu tenho dores no ombro. Tirar a carteira de motorista foi mais um desafio que eu enfrentei na minha vida. Logo, eu vou encarar outro, para começar a usar o computador. Pretendo entrar em uma escola de informática. Eu acho que temos de tentar algo novo sempre, mesmo com medo.”
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