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Cris Guterres

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Como 'Pantera Negra' e 'Wakanda' mudaram relação do povo preto com o cinema

Filme "Pantera Negra", de 2018, levou multidões aos cinemas - Marvel Studios
Filme "Pantera Negra", de 2018, levou multidões aos cinemas Imagem: Marvel Studios

Colunista de Universa

16/11/2022 04h00

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A espera dos fãs afoitos como eu acabou. "Pantera Negra: Wakanda Para Sempre" estreou nos cinemas mundiais batendo recordes de bilheteria. No Brasil, a franquia da Marvel —o filme de agora é uma continuação de "Pantera Negra"—, mudou a relação da população negra com o cinema e tem movimentado encontros especiais em diferentes cidades do país.

Quando foi lançado em 2018, "Pantera Negra" estremeceu o cinema mundial. O longa chegou a ser indicado ao Oscar de melhor filme ao contar a saga do super-herói negro que iria salvar a nação africana fictícia de Wakanda. O território mais rico, estável e tecnológico do planeta logo conquistou o público negro brasileiro ávido pela representatividade que nos foi negada por um processo de destruição de nossas identidades.

Foi o enredo perfeito para fazer do Brasil um dos países com maior bilheteria para o filme. A estreia da continuação não fez diferente. No primeiro final de semana, foi responsável por tirar a poeira que se alojava sobre as poltronas dos cinemas do país desde o pós-pandemia. Mais de R$ 29 milhões arrecadados em quatro dias. No mesmo período, "Adão Negro", filme estrelado por The Rock, arrecadou R$ 3,8 milhões e caiu para a segunda posição no ranking semanal.

O longa, sem dúvida, marca um ponto de virada na maneira como as histórias de pessoas negras são contadas. É o primeiro filme de super-herói a ter a maioria dos protagonistas, direção e equipe de produção negros, e contestou estereótipos sobre a África —o que pra nós já era uma discussão avançada, mas sabíamos que o mesmo não acontecia com o grande público.

Em 2018, eu e a advogada Mayara Silva ajudamos a articular grupos de espectadores para assistir a "Pantera Negra". Naquela ocasião, fiquei muito impactada com o filme e com a maneira como as pessoas saíam da sala de cinema completamente emocionadas e mostrando satisfação por terem visto toda aquela potência em tela. Me lembro de um garoto em especial, que entrou na sala dizendo que seu super-herói favorito era o Super-Homem, mas saiu me dizendo que havia mudado, pois o Pantera Negra tinha a pele e o cabelo iguais a ele.

Mais do que a cor da pele ou o cabelo crespo, estamos falando de um filme que se propõe a destruir todas as lógicas colonialistas. A começar por Wakanda, que representa um território que nunca recebeu a visita dos maiores destruidores do planeta, os colonizadores europeus. As mulheres também ocupam um lugar importante na saga, assim como na cultura africana. São representadas de maneira plural, numa liderança matriarcal, assim realmente eram, segundo estudos sobre a estrutura de muitas das nações africanas.

Desde aquele momento em 2018, a comunidade negra brasileira passou a se relacionar de maneira mais íntima com o cinema e as artes. As pessoas começaram a entender a importância de apoiarmos produções pretas e grupos para assistir filmes protagonizados por atores negros se espalharam por todo o país. É o caso do Intelectualidade Afrobrasileira, organizado pelo casal Ana Paula Evangelista e Durval Arantes. De sessão de cinema a jantar black, o casal tem movimentado a cena com encontros entre a comunidade negra de São Paulo.

Os encontros para assistir aquilombados a segunda versão de "Pantera Negra" já estão acontecendo pelo país. De São Paulo a Salvador, há pessoas mobilizando o povo preto para lotar as salas de cinema e assistir à sequência do filme. O diretor Ryan Coogler e o roteirista Joe Robert Cole tiveram um difícil desafio pela frente, reescrever a história sem Chadwick Boseman, astro do primeiro longa que faleceu em 2020 após lutar contra um câncer. Para não te dar spoiler, vou me ater a dizer apenas que eles conseguiram cumprir a tarefa: o filme é muito emocionante. Wakanda para sempre!