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Cris Guterres

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Amor de mãe não deveria ser incondicional, ainda mais com filho adolescente

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Imagem: Getty Images

Colunista de Universa

02/11/2022 04h00

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Outro dia postei em minha rede social que estava muito brava com meu filho e que havia brigado com ele. Uma das pessoas que acompanham meu dia a dia ficou surpresa, pois a impressão que tinha da minha maternidade era de tudo ser perfeito, lindo, sem desavenças e regado a amor incondicional.

Eu acho que o Zuckerberg andou sabotando essa seguidora, pois tenho o costume de postar algumas das desavenças que acontecem aqui em casa. De vez em quando, divido com meus amigos e seguidores a raiva que sinto por ter louça na pia há mais de dois dias enquanto meu filho está lá curtindo o "finde". Costumo falar da necessidade de colocar alguns limites com bebida alcoólica, horário de saída e chegada que foram desrespeitados e outras desavenças que rolam numa casa com adolescentes.

Mas o que mais me chamou a atenção na mensagem dela foi a expressão "amor incondicional". Se formos ao dicionário, veremos que incondicional é aquilo que não está sujeito a qualquer tipo de condição, restrição ou limitação. Não posso amar meu filho dessa forma. Preciso impor limites e condições pro nosso amor, para nossa relação.

Sempre digo que todas as fases de um filho tem seus desafios, mas a adolescência, talvez, seja a mais difícil delas —ou só mais uma? Me tornei mãe por adoção, já de um adolescente, não vivi todas as fases da maternidade, mas o que sei é que, na adolescência deles, muitos de nós, pais, parecemos perdidos de olhos vendados num lugar inóspito enquanto tentamos mostrar ao nosso filho onde fica a saída. Ele, porém, insiste em ir para o lado que a gente já sabe que está cheio de espinhos.

Amor de mãe e de pai deve ter limites, impor condições e estabelecer restrições. Não posso deixar que meu filho viva do jeito que ele quer só para ser a mãe legalzona do momento. Eu não estou querendo ganhar o troféu "mãe de boa" do grupinho. Aqui em casa, falo alto se for preciso, coloco de castigo, proíbo de sair, deixo sem dinheiro. Faço o que for preciso para que meu filho entenda que meu amor tem condições. "Não posso aceitar que você fale assim comigo porque te amo", "não posso aceitar que você aja dessa maneira dentro de casa porque te amo".

Achava que seria mais fácil ser mãe. Mesmo. Achei que tiraria de letra, que seria tranquilinho ser amiga do meu filho, que a gente ia sair para se divertir juntos, que íamos rir, ouvir música, andar de patins ou dividir a caixa de uva verde que adoro. Mas meu filho nem gosta de comer frutas, e eu descobri que o desafio era muito maior do que eu imaginava, ainda mais quando a gente cria um filho preto adolescente numa sociedade racista. O medo vem de todos os lados.

Uma coisa é certa, descobri com a maternidade que a saúde do meu coração é muito boa. Haja emoção. Quando estou me recuperando de uma situação, ele me traz outra embrulhada para presente. É a vida me dizendo: "Espera aí que eu vou te mandar mais essa". A maternidade é feita de altos e baixos. A linha da jornada maternal não é reta, tem muitas curvas, às vezes tem queda.

Amo meu filho, até mesmo agora que ele finge que não está nem aí para mim. Não quer mais sair comigo, não quer ir no show dos Racionais, não quer conversar, não senta mais no meu colo e mal me fala bom dia. Alguns o verão como mal-agradecido, pois tem gente que acha que adoção é caridade e a pessoa adotada deve ser eternamente grata. Não.

Adoção é só mais uma via de parentalidade, e a gratidão existe em nossa relação, mas não dessa forma. Ver meu filho agindo assim também me acalma, pois percebo que ele realmente se acomodou neste ninho como filho e faz o que um jovem da idade normalmente faz.

Vou aproveitar esse texto e dizer ao meu adolescente que ninguém está preocupado se ele comeu, se ele vai passar a noite no baile desagasalhado, se vai experimentar drogas ou se vai beber até desmaiar. Ninguém está nem aí se ele vai ter dinheiro para voltar para casa depois de pagar bebida para todos os amigos, se vai pegar carona com alguém que está dirigindo completamente bêbado.

Ninguém liga se ele se tomar um médico ou se será uma pessoa privada de liberdade, ninguém quer saber se ele ficará doente ou se nunca será contratado para um bom emprego por ter cabulado as aulas. Ninguém se importa, além da sua mãe, que é chata, encrenqueira, faladeira, mas te ama condicionalmente, todo dia e sempre.

Quer saber um pouco mais sobre as minhas aventuras com o Rafa, meu adolescente favorito? Assista aqui o Tedx Blumenau em que conto um pouco mais sobre amor, maternidade e adoção.