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Óvnis no Brasil? O que são as luzes avistadas no Sul do país

Simone Machado e Marcella Duarte

Colaboração para Tilt, em São José do Rio Preto (SP); De Tilt, em São Paulo

21/11/2022 04h00Atualizada em 21/11/2022 20h50

Os céus do Sul do país vêm atraindo os olhares de astrônomos, ufólogos, aeronautas e leigos desde o final de outubro, com a ocorrência de diversos fenômenos luminosos não identificados. Até o momento, foram ao menos oito dias de avistamentos, estranhos e muito brilhantes, relatados por pilotos de aviões.

Estas luzes misteriosas podem ser chamadas de óvnis (sigla para "objetos voadores não identificados"). Isso não significa necessariamente que sejam fenômenos de outro planeta; são chamados assim simplesmente porque não há confirmação do que se tratam. Tilt ouviu especialistas que estão atentos à questão.

"Precisamos separar o que é de efeito natural para depois avançar nos fenômenos não identificados. E, se for realmente um 'óvni', não necessariamente estamos falando de uma nave de extraterrestres, pode ser algum equipamento de tecnologia militar em teste de algum país ou até mesmo nosso", afirma Daniel Christian de Souza, ufólogo e fundador do Centro de Estudos Ufológicos (CEU) do Litoral Norte, de Cidreira (RS).

Luzes que acendem e apagam

O primeiro registro ocorreu em 22 de outubro e, o mais recente, na última terça-feira (15). A maior parte dos avistamentos aconteceu entre os dias 4 e 9 de novembro, em dias consecutivos. Muitos foram relatados por pilotos próximos a aeroportos do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, e amplamente divulgados nas redes sociais.

Os mais intrigantes envolvem luzes de cor azul, que se acendiam e apagavam, e também giravam em uma altura de 38 mil pés. Algumas seguiam ao lado da aeronave por grandes distâncias até se afastarem.

"Desconheço fenômenos naturais que possam explicar estas luzes erráticas, perseguindo aviões por grandes distâncias. Também não há drones que voem tão alto", ressalta Marcelo de Cicco, do Projeto Exoss, ligado ao Observatório Espacial Nacional.

O astrônomo ressalta o fato de que os casos foram relatados por profissionais experientes. "Pilotos de aeronaves, com centenas de horas de voo, conhecem bem os fenômenos meteorológicos e dificilmente seriam enganados por ilusões de ótica."

Ao que se sabe até agora, os eventos foram apenas luminosos: os pilotos não informaram nenhuma situação que afetasse o voo ou pouso dos aviões.

O que podem ser as luzes?

Não há explicações oficiais de órgãos do governo. Mas alguns pesquisadores têm suas hipóteses.

Para Roberto Dias da Costa, professor do departamento de astronomia da USP (Universidade de São Paulo), as características das luzes avistadas demonstram que elas são resultados da movimentação dos Starlink — pequenos satélites de comunicação da empresa SpaceX, que são lançados em lotes e podem refletir a luz solar.

Nas semanas após um lançamento, eles, ainda em órbita mais baixa, são visíveis da Terra, como um trenzinho de pontos luminosos cruzando o céu. A passagem deles, inclusive, pôde ser vista sobre o Rio Grande do Sul no final do mês passado.

"Os satélites são lançados em grupo e quando se soltam ficam enfileirados até que cada um siga para a sua posição de destino. Em algumas das imagens divulgadas, isso pode ser visto com clareza. Uma fileira de luzes brilhantes, exatamente como são os satélites", explica.

Ainda segundo o professor, o último lote de 51 Starlinks, lançados da Flórida no dia 24 de setembro, é de um novo modelo, mais brilhante, que pode ter confundido os pilotos.

Luzes que se movimentam

De Cicco concorda que parte das luzes relatadas pelos pilotos são, sim, reflexos dos satélites. Mas essa explicação vale somente para aquelas com padrões repetitivos, em dias consecutivos.

As luzes coloridas e erráticas, que seguem aeronaves, continuam sem explicação plausível. "Não são satélites e nem meteoros", acredita. "Precisamos analisar os avistamentos por partes. Algumas luzes que aparecem piscando na direção sul na linha do horizonte são Starlink, mas há outras."

"O problema é que nos áudios os pilotos relatam que há pontos de luz andando mais embaixo, rodopiando, seguindo avião e o satélite é apenas uma luz que pisca. Então não podemos colocar tudo na mesma caixa e dizer que é Starlink, porque há lacunas com a versão dos pilotos", acrescenta De Cicco.

"Além disso, por que a torre ainda pede para eles filmarem essas luzes? Se fosse tudo satélite, não teria motivo para isso." O astrônomo crê que as luzes envolvam ação humana: "posso vislumbrar a hipótese de uma tecnologia militar sendo testada".

Óvnis?

O ufólogo Souza é cauteloso ao falar sobre as luzes avistadas. Segundo ele, um estudo detalhado está sendo feito para explicar todos esses registros na região Sul do Brasil e em países vizinhos, como Uruguai, Argentina e Chile, onde também há relatos de avistamentos.

"Estamos em contato com estudiosos destes países, fazendo uma cronologia dos avistamentos e estudando caso a caso. Acreditamos que pode ter situações em que pode ser o Sol refletiu satélites, mas há relatos de pilotos que levam muito à interpretação de óvni, porque são pilotos de carreira, com 36 anos de experiência, que sabem diferenciar um satélite", explica.

Ele relata que as rotas de satélites, meteoros e a movimentação de aviões das forças armadas estão sendo monitoradas, para tentar esclarecer os avistamentos.

Lembrando que, este mês, a Força Aérea Brasileira (FAB) está realizando um exercício de guerra no Rio Grande do Sul, envolvendo mais de 50 aeronaves — como caças, helicópteros e drones.

Governo não se manifesta

Tilt procurou órgãos governamentais para comentar o assunto, como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e o Cindacta (Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo, da Aeronáutica), mas eles não se manifestaram a respeito dos avistamentos.

Assim, pode ser que o caso nunca seja totalmente desvendado, até porque muitas vezes os arquivos são confidenciais ou não há imagens e dados suficientes.