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Milícias digitais: entenda inquérito que levou STF a bloquear Telegram

Allan dos Santos deixou o Brasil e foi para os Estados Unidos em 2020 - Alessandra Dias/Agência Senado
Allan dos Santos deixou o Brasil e foi para os Estados Unidos em 2020 Imagem: Alessandra Dias/Agência Senado

Gabriel Daros*

De Tilt, São Paulo

18/03/2022 18h30

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), acatou os pedidos da Polícia Federal para derrubar o aplicativo de mensagens Telegram nesta sexta-feira (18). A decisão é acompanhada da falta de colaboração do mensageiro no banimento de perfis de Allan dos Santos, uma das pessoas investigadas no inquérito das milícias digitais.

Investigado por coordenar grupos que organizam ataques contra a democracia na internet, Allan é um blogueiro bolsonarista responsável pelo canal Terça Livre. Após decreto de prisão preventiva pela Polícia Federal em outubro do ano passado, ele manteve-se foragido nos Estados Unidos, onde continuou em operação.

"O investigado tem se utilizado do alcance de seu perfil no aplicativo Telegram (com mais de 121 mil inscritos) como parte da estrutura destinada à propagação de ataques ao Estado Democrático de Direito, ao Supremo Tribunal Federal, ao Tribunal Superior Eleitoral e ao Senado Federal, além de autoridades vinculadas a esses órgãos", diz Moraes em decisão anterior, publicada em fevereiro.

Mesmo com a exclusão de seus perfis no Twitter e bloqueio das contas bancárias, Allan continuou em operação no Telegram, onde coordenava grupos que, ao todo, somavam cerca de 180 mil inscritos. Nesta sexta-feira (18), após não responder formalmente aos pedidos da Suprema Corte para apagar estes perfis, o app de mensagens recebeu uma ordem de bloqueio em território brasileiro.

O que é o inquérito das milícias digitais

Moraes era relator de duas investigações paralelas com fundamentações e objetivos parecidos: os inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos, que buscavam investigar ataques virtuais ao STF e à democracia — crimes previstos em lei, sob pena de quatro a oito anos de prisão. Este último, no entanto, foi arquivado pelo magistrado em julho.

Na sequência, ele abriu uma terceira apuração para investigar a existência de uma organização criminosa que visa atentar contra a democracia. É o chamado inquérito das milícias digitais.

A investigação original foi aberta em abril de 2020, a pedido da PGR (Procuradoria-Geral da República) para identificar os organizadores e financiadores de uma série de protestos que pediam o fechamento do Congresso e do STF e a volta da ditadura militar.

Chegaram a ser alvos da investigação original o ex-ministro da Comunicação Fábio Wajngarten, o blogueiro Allan dos Santos e o empresário Otávio Fakhoury. A militante Sara Winter e o youtuber Oswaldo Eustáquio foram presos temporariamente.

Em junho, a PGR pediu o arquivamento da apuração, argumentando que não foram encontradas provas contra autoridades com foro especial. Moraes atendeu o pedido, mas abriu um novo inquérito para investigar a existência de uma organização criminosa digital que atuaria para abalar a democracia.

Para justificar o caso na Suprema Corte, o magistrado citou os filhos de Bolsonaro e a necessidade de esclarecer suspeitas de que aliados do presidente estariam usando dinheiro público para fazer ataques às instituições nas redes sociais.

O Telegram não aplica a moderação do que é compartilhado em sua plataforma, e isso pode ser um problema se pensarmos em discursos de ódio e propagação de fake news. O app diz que, seguindo os "princípios" do seu criador, não lida com o que considera "restrições de liberdade de expressão".

"Embora bloqueemos bots [robôs] e canais terroristas (por exemplo, relacionados ao Estado Islâmico), não bloquearemos ninguém que expresse pacificamente opiniões alternativas", diz a empresa na página de perguntas frequentes em seu site oficial. O Telegram ainda não respondeu ao pedido de Tilt por um comentário ou entrevista.

Logo, desinformação sobre vacinas, covid-19 e fake news que ameaçam eleições acabam entrando no pacote do que o app considera "liberdade de expressão".

*Com reportagem de Guilherme Castellar