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Cadê a água? Como a ciência explica um lago ter esvaziado em 5 horas

Cientistas da Universidade de Cambridge analisaram como lago da geleira Store, na Groenlândia, foi esvaziado em cinco horas - Divulgação/Tom Chudley/Universidade de Cambridge
Cientistas da Universidade de Cambridge analisaram como lago da geleira Store, na Groenlândia, foi esvaziado em cinco horas Imagem: Divulgação/Tom Chudley/Universidade de Cambridge

De Tilt, em São Paulo*

03/12/2019 11h36

Sem tempo, irmão

  • Cientistas já sabiam que lagos presentes em geleiras perdiam água repentinamente
  • Pesquisadores britânicos conseguiram acompanhar esse raro fenômeno
  • Ele está conectado com aquecimento global e a movimentação de geleiras

Cientistas acompanharam em tempo real um fenômeno raro: viram um lago no meio de uma calota de gelo ser esvaziado. Detalhe: tudo isso ocorreu em poucas horas. Ainda que não seja algo que vejam todo dia, os pesquisadores possuem uma explicação para isso. E a resposta está relacionada a como as geleiras se movem ano a ano.

A raridade foi flagrada em julho de 2018 no oeste da Groenlândia por glaciologistas do Scott Polar Research Institute, da britânica Universidade de Cambridge. Eles presenciaram dois terços de um lago na geleira Store, com cerca de cinco milhões de litros d'água, ser engolido pelo solo e desaparecer da superfície em apenas cinco horas, segundo estudo publicado nesta segunda-feira (2) na revista científica PNAS.

Como se formam os lagos no meio do gelo?

Em um lugar tão frio, é difícil pensar que possa haver água líquida suficiente para formar um lago. Na Groenlândia, a camada de gelo pode chegar a um quilômetro de espessura. Durante o verão, no entanto, é comum que parte da superfície derreta e forme lagos.

Só que, tão logo surgem, estes lagos podem sumir misteriosamente. Acontece que o assoalho de gelo no fundo do lago possui grandes fendas. De tempos em tempos, A água encontra seu caminho até essas lacunas. Após exercer pressão sobre elas, acaba ampliando-as até que abrir imensos buracos que descem até a base da calota polar. Às vezes, isso pode chegar a ter um quilômetro de profundidade.

Como ver um lago esvaziar?

Para acompanhar o esvaziamento, os cientistas monitoraram a geleira com drones. Tiraram fotos aéreas com um pequeno drone. Com isso, conseguiram mostrar a situação do lago antes e após a infiltração.

"O drone é que nos permite fazer observações de alta qualidade em zonas que não são seguras para os cientistas", explicou Tom Chudley, doutorando e piloto remoto da aeronave não tripulada, à agência de notícias AFP.

Como as fotos eram georreferenciadas por GPS, os pesquisadores conseguiram reconstruir a evolução tridimensional do relevo do gelo.
Por que observar lagos que vazam?

Os cientistas, é claro, não foram para a Groenlândia com o intuito único de acompanhar o grande volume de água se esvair. O interesse deles é obter dados para descrever com mais precisão a formação das imensas fendas em geleiras. Elas acabam virando depois em "autopistas" para que a água corra da superfície até o leito da calota polar. E isso acelera o movimento das geleiras.

A geleira Store, por exemplo, avança 600 metros todos os anos. O que os cientistas conseguiram observar é que o desaparecimento repentino do lago acelerou temporariamente. Passou de dois metros a cinco metros por dia. Isso ocorreu porque a água que passou sob o gelo lubrificou a geleira e ampliou a vazão.

Os cientistas notaram ainda outro detalhe surpreendente: o nível da água havia elevado a gigantesca camada de gelo em 55 centímetros durante horas. "Um quilômetro de gelo levantado a meio metro... Deixo-os imaginar a pressão que isto implica", resume Tom Chudley.
Devido ao aquecimento global, os cientistas estimam que esse fenômeno será cada vez mais frequente.

"Com as mudanças climáticas, na Groenlândia, vemos mais lagos, maiores e mais altos nas partes mais frias da calota. E vemos como alguns destes lagos começam a se esvaziar. O volume de lagos que esvaziam aumentará potencialmente em lugares novos que não conhecíamos até o momento", explica Chudley.

*com informações da AFP