Conteúdo publicado há 8 meses

Por onde anda Geraldo Vandré, autor do hino cantado em protesto em Israel?

"Para Não Dizer Que Não Falei Das Flores", de Geraldo Vandré, 87, virou hino de protesto em Israel. Os manifestantes entoaram uma versão em hebraico da música contra o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

A canção foi um hino de resistência contra a ditadura militar na década de 60 no Brasil. Outra música de Vandré usada para o mesmo fim foi "Disparada".

Mas por onde anda o compositor?

Vandré se afastou da vida pública após voltar do exílio nos anos 70. Viveu quase 40 anos num apartamento no centro de São Paulo, mas hoje mora com a irmã, no Rio de Janeiro — como revelado pela Folha de S. Paulo em junho.

O artista tem como forma de sustento a aposentadoria de quando trabalhou na Sunab (Superintendência Nacional do Abastecimento) e o rendimento de seus direitos autorais.

O paraibano de João Pessoa foi exilado ainda em 1968, com a outorga do AI-5. Ele ficou exilado em países da América do Sul e da Europa.

Quando retornou ao Brasil, em 1973, parecia ter mudado radicalmente de posicionamento: em entrevista ao Jornal Nacional (Globo), afirmou que suas músicas não tinham o objetivo de fazer denúncias contra a ditadura e defendeu o regime.

Telé Cardim, amiga de Vandré, disse em entrevista à revista Trip em 2010: "Ele foi convencido, essa parte é nebulosa mesmo e só ele sabe. Ele estava muito amargo quando voltou, em depressão mesmo. Acho que deve ter sido torturado no Chile".

Ele sempre disse que nunca foi torturado, e reafirmou isso à Folha. "Nem preso eu fui", declarou.

No entanto, o biógrafo Vitor Nuzzi levanta em seu livro a hipótese de que a entrevista foi uma condição para que o regime militar permitisse o retorno de Vandré ao Brasil.

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Vandré passou a morar num quartel da Força Aérea Brasileira e compôs a música "Fabiana" em homenagem à Aeronáutica. Até hoje, em suas raras aparições públicas, ele costuma usar o logo da FAB num boné ou na camisa.

Jair Rodrigues, intérprete de "Disparada", reencontrou Vandré nos anos 80. À revista Trip, ele relembrou:

Eu cheguei todo animado e disse: 'Vandré'. Aí ele me olhou e falou: 'Eu sou o Geraldo Pedrosa, o Geraldo Vandré morreu em 1968'.

Seu último show como Geraldo Vandré foi em 1982, no Paraguai. Depois, subiu ao palco em raríssimas ocasiões: em 1995, em São Paulo, num evento organizado pelo IV Comando Aéreo Regional (IV COMAR), em 2014, quando a cantora estadunidense Joan Baez veio ao Brasil pela primeira vez desde que foi proibida de se apresentar aqui pelo regime militar, e em 2018, quando foi homenageado no Festival Aruanda em João Pessoa por seu trabalho na trilha sonora do filme "A Hora e a Vez de Augusto Matraga" (1985). Na ocasião, disse à plateia: "Desde 1968 que praticamente não canto no Brasil, canto aqui porque é a Paraíba".

Na entrevista à revista Trip em 2010, Telé Cardim disse que o amigo estava lúcido, apesar de isolado: "Ele vive do jeito dele, com a aposentadoria de quando trabalhava na Sunab. Vive de uma maneira muito simples, com pouco dinheiro. Ele cozinha, lava suas roupas e frequenta aqueles restaurantes populares perto do prédio dele, mas sabe cuidar de si e até faz exercícios em casa".

À Folha, em junho, Vandré disse que ficou viúvo há dois anos. "Não tem nada de reclusão, estamos aqui conversando", afirmou.

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Ele não quis opinar sobre Lula ou Bolsonaro e negou ser "cantor de protesto": "Isso é uma alienação. Cantor de protesto é americano. Eu fazia música brasileira".

Sobre a vida "misteriosa", ele disse que a própria imprensa construía essa imagem: "A gente só coloca uma lenhazinha na fogueira".

O que faço hoje é ver televisão, dormir muito e comer bastante. Geraldo Vandré à Folha em junho de 2023

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