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Impasse judicial trava liberação de cremação do corpo de Zé Celso

Zé Celso morreu na manhã desta quinta-feira (6) - Allan Calisto/Agencia F8
Zé Celso morreu na manhã desta quinta-feira (6) Imagem: Allan Calisto/Agencia F8

Bruna Calazans

Colaboração para Splash, em São Paulo

06/07/2023 23h39

Durante o velório do diretor, ator e dramaturgo Zé Celso, que aconteceu na noite de quinta-feira (6), no Teatro Oficina, em São Paulo, Eduardo Suplicy, 82, relatou que há um impasse jurídico travando a cremação do artista.

Em conversa com Splash, o deputado estadual de São Paulo relatou que esteve no IML, na tarde de ontem, junto com Helena, sobrinha de Zé, para conseguir a aprovação da cremação — que era desejo do dramaturgo. Entretanto, ele não conseguiu obter a liberação.

Segundo apuração de Splash com a equipe de Zé Celso, o impasse ocorreu em virtude da juíza do caso ter encerrado o expediente antes de conceder a liberação para a cremação do artista.

Assim, Eduardo Suplicy e a sobrinha do dramaturgo irão retomar os contatos, na manhã de sexta-feira (7), para dar andamento na liberação da documentação.

Famosos vão ao velório de Zé Celso no Teatro Oficina, em São Paulo

O velório

O corpo de Zé Celso chegou ao Teatro Oficina por volta das 23h desta quinta-feira (6). Um cordão de pessoas se formou na frente do local para a liberação, e a chegada do caixão foi marcada por gritos de "Viva Zé" e músicas.

O marido de Zé Celso estava na frente do carro, liderando o cortejo. O corpo ficará aberto para visita do público até às 9h.

Depois disso, a família do artista estará em uma cerimônia reservada programada para ocorrer até às 11h.

Público fica do lado de fora do Teatro Oficina para chegada do corpo de Zé Celso - Bruna Calazans/Splash - Bruna Calazans/Splash
Público fica do lado de fora do Teatro Oficina para chegada do corpo de Zé Celso
Imagem: Bruna Calazans/Splash

Homenagens, músicas e festa!

Antes da chegada do corpo de Zé Celso, fãs e amigos de Zé Celso encheram o Teatro Oficina para se despedir do dramaturgo.

Pessoas vestidas de branco e cantando prestigiam a vigília, que aconteceu como uma verdadeira festa, com direito a bebidas e comida.

Coroas de flores foram colocadas no centro do teatro, local em que Marcelo Drummond, marido de Zé Celso, estava sendo consolado por quem veio ao teatro.

Por volta das 21h30, a organização pediu a colaboração das pessoas com o lixo, e passou com sacos recolhendo latinhas de cerveja para liberar passagem para o corpo do dramaturgo.

Fãs e amigos se reunem no Teatro Oficina para velório de Zé Celso - Leo Franco/Agnews - Leo Franco/Agnews
Fãs e amigos se reunem no Teatro Oficina para velório de Zé Celso
Imagem: Leo Franco/Agnews

A morte

Morreu hoje, dia 6 de julho, o dramaturgo José Celso Martinez, o Zé Celso, aos 86 anos. A informação foi confirmada por Splash pela assessoria e também nas redes oficias do Teatro Oficina.

O dramaturgo estava internado no Hospital das Clínicas, em São Paulo, após ter 53% do corpo queimado em um incêndio em seu apartamento.

Segundo apuração de Splash, o laudo do Instituto de Criminalística (IC) da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) indica que a provável causa do incêndio no apartamento de Zé Celso, na última terça (4), seja o aquecedor de ar.

A hipótese considerada é que o fogo pode ter "iniciado em virtude do contato entre um aquecedor e materiais de fácil combustão, presentes no cômodo", os materiais não foram especificados.

As causas do incêndio são investigadas por meio de inquérito policial instaurado pelo 36º DP, da Vila Mariana. Com a morte de Celso, será realizado o exame necroscópico visando ao devido esclarecimento do caso.

Trajetória artística

Uma figura irreverente, José Celso Martinez Corrêa nasceu em Araraquara, interior de São Paulo, em 1937. Desde a década de 1960, ele se destacou por sua presença de palco e por sua inovação cênica. Porém, sua personalidade começou a ser lapidada pouco tempo depois para nunca mais ser esquecida.

O movimento contracultura dos anos 1970 foi uma grande força motriz para que Zé Celso mostrasse a que veio: peças disruptivas, movimento coletivo no palco e liberdade para que o corpo de cada pessoa, artista ou não, pudesse ser a mais pura expressão do que é arte.

O Teatro Oficina, foi fundado por Zé Celso em 1958 com colegas da Faculdade de Direito do Largo São Francisco e vive até hoje com atrações pulsantes em seus palcos. A proposta sempre foi contra o estilo de encenação trazido por peças europeias da época. Além disso, o principal objetivo do Oficina era e é fazer com que o público tenha participação ativa em suas apresentações.

Polêmicas e resistência

Considerado um dos diretores de teatro mais revolucionários do Brasil, Zé Celso teve sua postura no palco questionada por muitas pessoas, que o colocaram como radical ou extravagante demais. Em 1966, a sede do Teatro Oficina pegou fogo em São Paulo. Na ocasião, Zé atribuiu o incêndio a um golpe de militares que perseguiam o grupo desde 1964.

No auge da ditadura militar brasileira, em 1968, alguns membros abandonaram o grupo Oficina ou foram obrigados a se exilar. Em 1974, Zé Celso foi um dos nomes a serem presos. Ele se exilou em Portugal, onde conseguiu gravar o filme "O Parto". Sua volta para São Paulo aconteceu em 1978.

Com o gradual restabelecimento da democracia no Brasil, o Teatro Oficina empenhou-se em reabrir e reconstruir seu espaço, seguindo um audacioso projeto arquitetônico concebido por Lina Bo Bardi. Já em 1993, o grupo renasceu como Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona e entrou em uma fase altamente produtiva, culminando na emocionante encenação da obra-prima do romance jornalístico de Euclides da Cunha, "Os Sertões".

Desde então, o Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona tem se destacado como um centro cultural vibrante e provocador, explorando novas abordagens artísticas e desafiando os limites convencionais das artes cênicas. Sua trajetória pós-ditadura reflete a resiliência e a determinação em preservar a liberdade de expressão e promover o diálogo social por meio da arte.

Peças famosas

Os primeiros textos de Zé Celso foram levados ao palco do Teatro Oficina desde o início do projeto. "Vento Forte para Papagaio Suvir", de 1958, e "A Incubadeira", de 1959, são alguns exemplos.

Outros roteiros ganharam sucesso conforme o trabalho do diretor foi ganhando o gosto de um público mais ligado a propostas artísticas revolucionárias. São eles: "Pequenos Burgueses", um texto de Máximo Gorki que estreou em 1963, e "O Rei da Vela", de Oswald de Andrade, levado ao palco em 1967.

Para coroar a proximidade de Zé Celso com o movimento tropicalista e antiditadura, temos como referência até hoje a montagem de "Roda Vida", de Chico Buarque, em 1968. Considerado o grande herdeiro da tradição modernista, ele influenciou Os Satyros, uma companhia teatral fundada por Ivan Cabral e Rodolfo García Vázquez em 1989, também influenciados pelo movimento tropicalista.

Zé Celso: criador do Teatro Oficina revolucionou as artes cênicas