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Herói? Vencedor do Oscar já chamou muçulmanos de baratas e pediu extermínio

De Splash, em São Paulo

13/03/2023 11h11Atualizada em 14/03/2023 11h25

Alexey Navalny é a estrela da produção que levou o Oscar de Melhor Documentário na noite de ontem. O filme, que leva o sobrenome do russo, apresenta a luta do opositor de Vladimir Putin, conhecido por denunciar casos de corrupção no Kremlin, e preso desde 2021 em uma cela de segurança máxima. Já nos comentários sobre a premiação, algo além da estatueta chamou a atenção: as controvérsias do ativista.

No discurso após a vitória, Yulia Navalnaya, sua mulher, exaltou a luta do marido, que ainda não teve a chance de ver o documentário. Já os críticos de Navalny lembraram vídeos gravados pelo próprio homem em que ele comparou muçulmanos a baratas e defendeu a expulsão de todos os imigrantes "não brancos" que vivem na Rússia.

As falas islamofóbicas de Navalny aparecem em um vídeo pró-armas feito em 2007. Nele, o russo se apresenta como um "autêntico nacionalista" que desejava "exterminar moscas e baratas", enquanto imagens de homens muçulmanos aparecem na tela. Na mesma gravação, ele surge com uma pistola e finge atirar contra um ator que veste um keffiyeh — um lenço de cabeça muito comum no mundo árabe.

Segundo veículos como o Al Jazeera, o vídeo de 42 segundos foi divulgado pelo Movimento de Libertação Nacional Russo, um grupo com fundamentos nacionalistas criado por ele em parceria com Zakhar Prilepin, escritor famoso que recentemente se juntou a um movimento socialista pró-Putin.

Em outro vídeo, gravado em 2011, Navalny se apresenta como um nacionalista que deseja deportar imigrantes não-brancos vindos de antigos territórios soviéticos na Ásia Central e norte do Cáucaso, uma área majoritariamente muçulmana, de acordo com o Washington Post.

Ligação com 'marcha' de extrema-direita

O ativista marcou presença na Marcha Russa, uma manifestação anual que reúne milhares de nacionalistas de extrema-direita, monarquistas e supremacistas brancos.

Durante os protestos não é incomum observar pessoas levantando o braço direito, em saudação semelhante à nazista, de acordo com a Al Jazeera. Navalny compareceu ao evento três vezes. Em 2011, questionado sobre seu apoio, ele afirmou que a marcha era um "evento político significativo e que não havia nada de perigoso nele".

Lev Ponomaryov, ativista listado por Putin como um "agente estrangeiro", afirmou que cortou laços com o ex-colega por suas visões preconceituosas.

"Quando ele me disse que o futuro da Rússia pertencia apenas ao nacionalismo russo eu respondi: 'Ok, nós não vamos conversar mais", justificou o rapaz, que comanda uma associação que defende direitos humanos em Moscou.

Ativista adotou tom moderado, mas reforçou oposição a imigrantes

Navalny não pediu desculpas, mas adotou um tom mais moderado a partir de 2013, quando concorreu à prefeitura de Moscou, ficando em segundo lugar, com 27% dos votos.

Apesar de não comparecer mais às Marchas Russas, o ativista ainda tinha propostas antimigratórias em sua plataforma, em meio às ideias anticorrupção que o fizeram famoso.

Ele reafirmou visões preconceituosas também em declarações recentes. Em 2019, durante conversa com o Financial Times, Navalny usou várias vezes um termo pejorativo para se referir a pessoas LGBT.

Já em outubro de 2020, em entrevista a um jornal alemão, ele afirmou que continua apoiando políticas contra imigrantes na Rússia.

Anistia Internacional chegou a condenar declarações

Na versão do governo russo, Navalny foi preso por fraude. Já para parte da comunidade estrangeira, incluindo a Anistia Internacional, ele é considerado um "Prisioneiro de consciência" — termo usado para definir pessoas presas por sua raça, religião, sexualidade ou visão política.

A organização, uma das defensoras de direitos humanos mais respeitadas no mundo, chegou a revogar o status do ativista em 2021, mencionando seus "comentários do passado", mas o restabeleceu meses depois, afirmando que a decisão estava sendo usada pelo governo russo para "violar ainda mais os direitos" do prisioneiro.

"Esse foi o auge da hipocrisia vinda de um governo que não apenas tentou matar Navalny envenenado, mas foi responsável por atos inconcebíveis ao longo das últimas duas décadas, incluindo tortura, desaparecimentos e repressão das liberdades políticas na Rússia e no exterior, assim como crimes de guerra na Síria", justificou a Anistia em seu site.

"Nós reconhecemos que as opiniões e comportamentos de um indivíduo podem evoluir com o tempo e é parte da missão da Anistia encorajar as pessoas a aderir à defesa dos direitos humanos, e não sugerir que elas estão presas para sempre em sua conduta do passado. Além disso, designar alguém como Prisioneiro de Consciência não implica um endosso à suas visões", concluiu a organização.