Luciana Bugni

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Opinião

Leandra Leal e o alerta: a gente já tem corpo de gostosa que queríamos ter

Não sei quando eu aprendi que ter um corpo decente era ter um corpo magro. Seco. Fino. Sou da mesma geração da atriz Leandra Leal e chegamos à quinta década de nossas vidas questionando os 40 anos anteriores. Quem falou que precisava ficar cada dia mais magra para ser bonita mesmo?

Se eu não sei explicar de onde saiu essa máxima, pulverizada em modelos muito magras na capa da revista Capricho (que eu consumia como leitora adolescente) ou nas dietas quase impossíveis na capa da revista AnaMaria (que eu validava como editora, já na idade adulta). O negócio é que para estar bom, tinha que estar magra. Grávida de três meses, eu escutei uma mulher dizer para eu dar uma contida na postura para não parecer muito barriguda (juro).

Leandra deve ter vivido essa cobrança muito mais de perto e desabafou sobre o assunto em um vídeo em suas redes sociais. Na tela da TV e na capa das revistas onde eu trabalhei, era mandatório exibir um corpo além do normal: ser magra, mas ser peituda e ter uma bunda interessante também. O conceito de gostosa, ali distorcido, era estar destruída pela pressão estética e provavelmente com fome. E eu nem estou entrando na distorção de imagem que leva algumas mulheres à morte em procedimentos estéticos perigosíssimos.

Demos uma caminhada. Na mesma AnaMaria, que editei entre 2011 e 2018, fazíamos ensaios plus size com temas que pareciam banais, mas na prática, descobria-se nas pautas, não eram. Foram produções de moda como "Botas que fecham na sua canela" que fizeram com que pessoas tidas como padrão como eu (padrão de quem, gente) percebessem que canelas grossas não cabem em qualquer bota de cano longo porque o zíper simplesmente não fecha. E o mercado precisa, se for inteligente, contemplar também essas pernas. No nosso time ali na revista, produtoras de moda que eram mulheres reais corriam atrás de peças que vestissem de fato a mulher à época tida como plus size. O debate se estende até hoje e quem veste mais que um 42 (quase todo mundo) vive reclamando que nada veste bem porque a modelagem não foi pensada para seu corpo. Plus o que mesmo? É gente que fala.

Leandra, no entanto, faz uma reflexão interessante: ao ver seu personagem na reprise de Cheias de Charme, conclui que estava ótima naquele corpo. Como está ótima hoje, grávida aos 42 anos. Mas enquanto gravava a novela, tem viva na sua memória a sensação de que não bastava. Aquele corpo "ideal" abrigava uma mente insegura porque nada basta. E fome e esforço e mau humor para quê?

A atriz defende que hoje, na maturidade, podemos ficar mais tranquilas em relação ao fato do corpo ideal ser esse aqui que temos. Porém, a mesma maturidade traz a cilada de perceber — talvez tarde demais — que sem exercício físico a mente não anda tão bem assim. E aí é um tal de musculação aqui para controlar uma ansiedade ali... E dá-lhe postar nas redes sociais o resultado. Isso, mesmo que sem intenção, cria um efeito reverso em quem não está na pilha fitness. Se todo mundo está malhando e postando que está gostoso, quem não está se sente pressionado. Parece que os avanços dos anos 10 deram uma degringolada com a onda do "corpo são mente sã" que assola o reels. Quando o foco devia ser o que não se vê em músculos nem em lugar nenhum — vamos falar a verdade, é complicado medir felicidade na mentirada que é o Instagram.

No mesmo 2024, um portal de notícias divulga "dicas das famosas para ter um bumbum durinho". É meio anos 90, mas com internet agora. As dicas incluem se privar de coisas e se esforçar em outras. Não tem muita novidade. A revista Marie Claire, entretanto, afirma que o lance do momento é ter a energia de gostosa. Como funciona? Eu sou gostosa porque me acho gostosa, ué. E digo para as amigas no WhatsApp que gostosas passam por situações difíceis. E que ser gostosa infelizmente não resolve meus problemas. E que tudo isso é verdade e não preciso de validação do tal padrão. Quer ser gostosa? Decrete-se gostosa e siga em frente, gostosíssima.

Saí da academia outro dia afirmando que estava me sentindo a cara da Shakira. As meninas malhadas de verdade riram da minha presunção. No Instagram uma meia hora mais tarde, uma amiga postou uma selfie decretando estar linda "se eu não falar ninguém fala". Concordei. Contei sobre minha energia de Shakira naquela manhã. Ela disse que eu estava até melhor que a Shakira. E assim seguimos. A gente mente um pouco, claro. Ah, mas todo mundo mente, né?

Já temos o corpo e a vida que deveríamos ter, pena que só nos damos conta na maturidade. Você já percebeu o quanto está gostosa hoje?

Você pode concordar comigo no Instagram.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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