Topo

Chico Barney

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

A Pequena Sereia é tão bobo que parece um filme infantil

Colunista do UOL

25/05/2023 07h49

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

A sereia pode até ser pequena, embora ela seja de uma altura pendendo mais para o mediano. Mas os problemas do filme são gigantescos, pelo menos sob alguns aspectos importantes.

Com estímulos visuais confusos e muita pirotecnia, A Pequena Sereia é um filme bobo, que fica no rasinho sem aprofundar nenhuma das suas possibilidades. As breves catarses e o clima pueril parecem feitos sob medida para agradar nostálgicos e principalmente as crianças —o que talvez até faça sentido, se considerarmos que é um filme infantil.

De qualquer forma, quando anunciaram que fariam uma versão live action do clássico animado da Disney, não imaginei que veria algo tão sombrio e realista, à moda das produções de Christopher Nolan.

A questão é que algumas cenas ficaram tão sombrias que nem dá para entender direito o que está acontecendo. E investiram milhões para deixar os personagens mais fofinhos do desenho, como o caranguejo e o peixinho, com a aparência típica de taxidermia.

E até aí, tudo bem —a opção estética poderia ser um bom complemento a uma narrativa radicalmente diferente, que justificasse o distanciamento do universo mais lúdico que nos acostumamos. Dizem que o conto original de Hans Christian Andersen tem um desenvolvimento sangrento e um final trágico, mas a única tragédia no filme quem vive é o público.

A produção perde a oportunidade de explorar novas razões e emoções da lenda das sereias. Eu particularmente nunca tinha assistido à animação, então estava curioso para entender mais sobre aquele rico universo. Fiquei atônito ao saber que existem sereios, por exemplo —algo que, parando para pensar, faz muito sentido.

Mas o maior choque foi quando descobri que, na verdade, A Pequena Sereia é um musical. Faço questão de frisar isso aqui, pois não sei se teria saído de casa se tivesse essa informação desde o início.

Sempre fico confuso com musicais. Não sei se na história as pessoas realmente estão cantando aquelas bobagens cafonas ou se tudo acontece na imaginação delas, ou se talvez elas saibam que estão em um filme que por acaso é um musical. Me perco completamente.

Em dado momento a protagonista perde a voz e eu achei que nos veríamos livres da cantoria, mas com recursos narrativos sofisticados ela continua cantando mesmo de boca fechada. Aparentemente a música ocorre na cabeça dela, ou na nossa, eu já não sei mais, mas ela segue cantando.

E como canta bem. No meio de um filme que nos seus melhores momentos parecem um protetor de tela do Windows 95, a extraordinária Halle Bayley é um oásis de carisma, talento e graça.

A Pequena Sereia, contudo, tem também um roteiro bastante fraco. E fico me perguntando se os responsáveis aderiram à greve antes do resto da categoria. Muitas coisas acontecem apenas "porque sim", o que deixaria o Zequinha do Castelo Rá-Tim-Bum muito frustrado, pois foi graças a ele que aprendi que "porque sim não é resposta".

Tramas exploradas pela metade, personagens desenvolvidos na base do fórceps e em uma cadência exaustiva —quem precisa de duas horas para narrar um conto de fadas? Se pelo menos fosse uma entrevista no podcast do Sérgio Mallandro. Mas não é.

Também incomoda a falta de humor do filme. As poucas tentativas de fazer comédia são desperdiçadas pelo tal caranguejo que parece ter sido empalhado por estudantes calouros.

É longa a lista de coisas que ficam sem maiores explicações. Se a Úrsula era tão poderosa, por qual motivo ficava escondida? Se podia trocar a parte debaixo do corpo dos outros, por qual razão mantinha aqueles tentáculos em si mesma? E para quê berrar tanto? Quanto ao pai da Ariel, qual era a bronca dele com os terráqueos? E o que explica aquela súbita ressurreição do completo nada? Mas o mais grave: o que diabos Ariel viu naquele príncipe que parece o Felipe Dylon cansado?

São questionamentos que não encontrarão respostas, pelo menos até anunciarem uma continuação. E agora também não estou com pressa.

Voltamos a qualquer momento com novas informações.