Smurfs e bosque encantado ajudam pequenas aldeias da Espanha a sobreviver

Há anos a Espanha luta contra o despovoamento de pequenas áreas rurais. Algumas de suas regiões, principalmente as aldeias, têm poucos habitantes, quase nenhuma criança e a maioria da população é de pessoas idosas.

No meio da bela serra da Andaluzia, no sul do país, vários povoados mais remotos sofrem desse mal. É o caso de Júzcar, que tem apenas 240 habitantes, e de Parauta, que fica a poucos quilômetros, que também não chega aos 300 moradores.

Vizinhos e políticos vêm tentando encontrar saídas para evitar que os moradores dessas regiões tenham que abandonar sua terra natal em busca, principalmente, de novas oportunidades de trabalho em cidades maiores.

A cidade de Parauta, na Espanha, tem apenas 240 habitantes
A cidade de Parauta, na Espanha, tem apenas 240 habitantes Imagem: Lucila Runnacles

E aí vem a pergunta do milhão: como fazer para levar turismo e desenvolvimento a essas cidades pequenas e manter a qualidade de vida de seus habitantes?

Parauta parece ter encontrado uma saída, pelo menos por enquanto. A ideia veio de um escultor que mora nesse pequeno povoado de ruazinhas estreitas e empinadas. Diego Guerrero começou a talhar troncos de árvores de castanhas criando figuras coloridas e formando um bosque encantado.

Apresentei a ideia à prefeitura, eles toparam e comecei o trabalho. Quando algumas figuras estavam talhadas e pintadas, as fotos começaram a viralizar nas redes sociais e, num piscar de olhos, os turistas começaram a chegar.
Diego Guerrero, artista

Artista faz escultura em árvores e cria bosque encantado em Parauta, na Espanha
Artista faz escultura em árvores e cria bosque encantado em Parauta, na Espanha Imagem: Lucila Runnacles

Efeitos positivos e negativos

Uma senhora de cabelo branco sobe a ladeira carregando uma pesada sacola cheia de lenha e quando apoia a madeira na porta da sua casa, lembra de quando era jovem e as crianças corriam pela praça de Parauta.

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¨Hoje em dia há muito poucas. A cidade ficou sem vida. Está muito diferente. Minhas filhas, por exemplo, se mudaram para cidades maiores onde há mais oportunidades e empregos¨, lamenta Micaela Gutiérrez.

Atualmente, 17 crianças estudam na escola rural da cidade. Se você achou esse número baixo, Parauta é o povoado da região com o maior número de alunos matriculados.

Se por um lado Micaela sente falta de movimento na cidade, ela não acha que a fama do Bosque Encantado traga muitos benefícios.

O povoado de Parauta, na Espanha
O povoado de Parauta, na Espanha Imagem: Diego Guerrero

A única coisa que os visitantes deixam é muito lixo pelas trilhas nos fins de semana que é quando recebemos mais visitas.
Micaela Gutiérrez, moradora de Parauta

Quem também sente os efeitos negativos é Pepa Gutiérrez. ¨Aos sábados e domingos recebemos tantos visitantes que às vezes fica difícil sentar-se pra tomar uma cerveja porque o único bar está sempre lotado¨, diz essa moradora que faz bicos limpando casas de aluguel de temporada e também trabalha como taxista informalmente.

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Entrada do bosque encantado de Parauta
Entrada do bosque encantado de Parauta Imagem: Lucila Runnacles

Mesmo assim, Pepa diz estar feliz com a fama que Parauta ganhou nos últimos anos. ¨É verdade que houve um maior interesse pela cidade e até alguns estrangeiros vieram morar aqui. Sei de um casal argentino, russos e um belga que compraram casas aqui¨, revela.

A prefeita que está no comando há cinco anos diz que as pessoas precisam decidir se querem viver em um lugar tranquilo ou se preferem receber turistas e ter uma cidade com vida.

Nos fins de semana alguns moradores colocam barraquinhas no começo do bosque para vender comida, souvenirs, produtos típicos e com isso conseguem fazer um bom pé de meia.
Katrin Ortega, prefeita de Parauta

E o sucesso local também ajuda os povoados vizinhos. ¨Muitas vezes os visitantes perguntam que outros lugares podem conhecer aqui pela região e a gente sugere Júzcar ou Cartajima, que ficam a poucos quilômetros daqui. Se os nossos restaurantes estão cheios, também mandamos eles para lá¨, diz Katrin.

A aldeia dos Smurfs

Cidade de Júzcar ficou conhecida como 'povoado dos Smurfis'
Cidade de Júzcar ficou conhecida como 'povoado dos Smurfis' Imagem: Lucila Runnacles
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Todas as pequenas localidades dessa região são conhecidas como pueblos blancos (povoados brancos) por conta das fachadas das casas que são todas dessa cor. Pelos belos caminhos sinuosos dessa serra, eles vão aparecendo como pequenas manchas no meio dos bosques, mas tem um que chama muito a atenção.

No meio do vale encontramos um povoado completamente azul. Todas as casas, o cemitério, a prefeitura e até a igreja têm as fachadas dessa cor.

A história é curiosa; em 2011 a pequena cidade de Júzcar foi escolhida por um famoso estúdio de cinema para receber o lançamento de dois filmes dos Smurfs.

Povoado de Júzcar
Povoado de Júzcar Imagem: Lucila Runnacles

No começo, os imóveis seriam pintados somente para a promoção dos longas, mas a ideia deu tão certo que os moradores decidiram em um plebiscito que queriam continuar com as fachadas azuis.

Para pintar todas as casas foram usados nove mil quilos de tinta. Com o tempo a cor foi desbotando e a cada quatro anos é preciso renovar a tinta. Hoje em dia a pintura é fornecida pela prefeitura, eles compram o material e cada morador pinta a sua fachada.

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Tornar-se a vila dos Smurfs em tamanho real mudou a vida dos moradores dessa pacata cidade de apenas 240 habitantes. Antes o lugar contava só com um bar, mas depois do sucesso já tem seis restaurantes.

Precisamos aceitar que se não fosse pela fama que ganhamos graças ao desenho, ninguém viria nos visitar. Antigamente Júzcar tinha alojamento para receber 25 pessoas, no máximo, e agora temos espaço para hospedar 100 turistas
Alicia Guerrero, lojista de Júzcar

Além de camisetas com estampas dos Smurfs penduradas à espera de algum cliente, Alicia também oferece, nos fins de semana, por três euros (R$16 aproximadamente), pintar as unhas das crianças de azul e a possibilidade de customizar o famoso chapéu branco dos bonecos do desenho animado. ¨A gente precisa se reinventar para continuar crescendo¨, diz.

Povoado de Júzcar
Povoado de Júzcar Imagem: Lucila Runnacles

Durante mais de uma década Júzcar ficou conhecida como o ¨primeiro povoado Smurf do mundo¨, mas por conta de uma disputa recente com a produtora cinematográfica, este ano eles tiveram que retirar grandes bonecos que estavam na entrada da cidade e mudar seu nome turístico para Aldeia Azul.

Pelas ruas ainda é possível ver algumas fachadas e muros pintados com os bonecos, mas segundo o responsável pelo turismo da cidade, esses também vão ter que ser apagados.

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Mesmo assim, os moradores esperam continuar colhendo os frutos e a sorte que os Smurfs lhes deram. Enquanto a maré azul durar, Júzcar vai continuar atraindo visitantes e, quem sabe, também mais moradores.

¨Ficamos famosos graças ao desenho, mas agora queremos encontrar o nosso próprio atrativo, aproveitando a fama que isso nos trouxe. O fato de algumas pessoas não terem que abandonar a cidade para conseguir emprego é superpositivo. Por enquanto não conseguimos aumentar o número de moradores, mas também não diminuímos¨, explica Alfredo Oballe, prefeito de Júzcar.

Sobre os efeitos negativos da fama, Oballe diz que os que mais sofrem são as pessoas mais velhas. ¨A parte ruim é que alguns moradores querem tranquilidade e com a chegada dos turistas isso mudou nos últimos anos. Todos tivemos que nos adaptar.¨

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