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Como é (e quanto custa) comer no melhor restaurante da América Latina

Mundo Mater, do restaurante Central - Ken Motohasi
Mundo Mater, do restaurante Central Imagem: Ken Motohasi

Rafael Tonon

Colaboração para o UOL

18/11/2022 04h00

Usar a metáfora de uma montanha-russa pode ser um clichê enorme para falar do Central, o restaurante peruano que ganhou (pela quarta vez) como o melhor da América Latina na última edição dos 50 Best.

Mas é difícil buscar uma analogia melhor para explicar o trabalho sobre altitudes que fazem os chefs Virgilio Martínez e sua esposa e sócia, Pía León.

Dos lingueirões e algas que vivem no nível do mar às dezenas de batatas nativas cultivadas nos Andes a 4.200 metros, o menu do restaurante é uma viagem crescente (e descendente) pelos biomas do país.

Uma forma que os chefs encontraram de mostrar toda a biodiversidade que preserva o país que se tornou um destino gastronômico internacional — é difícil alguém que ame comer que não tenha o Peru como um dos primeiros países a visitar na lista.

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A entrada do resturante Central, em Lima
Imagem: Ken Motohasi

Cozinha superlocal

E o Central como desejo número 1. Desde 2013, quando abriu, o restaurante ganhou, mais que prêmios, o reconhecimento do público e da crítica por seu trabalho único e autêntico que mostra uma cozinha superlocal. Conseguir uma reserva pode levar até seis meses.

Isso porque o Central foi um pioneiro a criar metodologias de investigações sociológicas e botânicas para desbravar os altiplanos, o Valle Sagrado e a Amazônia atrás de entender não apenas os ingredientes de cada um desses biomas, mas como os povos tradicionais criaram maneiras e técnicas de consumi-los.

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Central foi abertro em 2013
Imagem: Gustavo Vivanco

Não é exagero dizer que o restaurante mudou a forma de outros colegas trabalharem na América Latina, valorizando o que têm em seu entorno, buscando dar mais destaque ao que têm no quintal.

E depois traduzi-los para os pratos criativos que eles criam, claro. Em um deles, por exemplo, batatas e outros tubérculos nativos são assados em um pequeno forno feito com uma argila comestível usada por séculos pelos povos andinos, com os Quechua.

Também surpreende o uso de ervas e plantas até então apenas medicinais (receita das pelos xamãs) usadas como ingredientes nas mãos dos chefs do restaurante.

Restaurante Central - Peru - Melhor da América Latina - Tubérculos de extrema altura - Divulgação - Divulgação
Tubérculos do restaurante Central, no Peru
Imagem: Divulgação

Ingredientes raros

A busca por produtos muito específicos é algo que beira uma obsessão ali: não existem trufas no menu, muito menos caviar.

Mas espere umas pequenas bolinhas verdes escuras (na realidade cianobactérias encontradas em lagos de altitude) boiando em um preparo com peixe: com sabor doce à clorofila, dão um toque único ao prato.

Restaurante Central - Peru - Melhor da América Latina - Ollucos de costa _ Ollucos from the coast By Ken Motohasi - Ken Motohasi - Ken Motohasi
Ollucos de costa
Imagem: Ken Motohasi
Restaurante Central - Peru - Melhor da América Latina - Pulpo _ Octopus - Divulgação - Divulgação
Pulpo
Imagem: Divulgação

Os menus-degustação no Central (entre R$ 700 e R$ 1.400) surpreendem com ingredientes desconhecidos, sabores inesperados e uma estética surpreendente e muito apurada: coloridos, com formatos inusitados, parecem emular seres de outros mundos.

Outro dos pratos, por exemplo, une uma variedade de melancia com pacu e folhas de coca. Do Valle Sagrado vêem a couve-flor e cherimoya que compõem uma das sobremesas que une produtos que dificilmente se encontrariam na receita de outro chef.

Restaurante Central - Peru - Melhor da América Latina - Azul By Ken Motohasi  - Ken Motohasi  - Ken Motohasi
Você encontrará pratos coloridos e cheios de vida, como o Azul
Imagem: Ken Motohasi

Cacau total

Mas um dos pratos mais impressionantes é o que destrincha o cacau Chuncho peruano. O chef serve tudo: uma geleia feita da mucilagem, um "chocolate" feito com a casca (que é descartado), além das sementes e das fibras. Tudo é aproveitado, tudo é delicioso.

Para acompanhar, há também um chocolate quente feito com o cacau que é torrado e processado por eles no próprio restaurante. Aliás, muitas das bebidas servidas são feitas ali, como um tipo de amaro com 12 botânicos cultivados a 3.685 metros de altitude.

Restaurante Central - Peru - Melhor da América Latina - _Virgilio _ Cacao  - Divulgação - Divulgação
Virgilio segura um fruto do cacaueiro
Imagem: Divulgação

Para abrir o apetite, o sommelier Diego Vásquez serve um coquetel fresco de melão-pepino que depois adiciona uma colher de cordial de alface do mar: em segundos, o líquido muda de um amarelo para um verde escuro no copo, como mágica.

O serviço também dá conta de reproduzir tanto conhecimento: antes de ia para a mesa, uma das atendentes mostra os produtos em uma bancada de mármore, onde os clientes podem não apenas ver o que estará no seu menu, mas também tocar, cheirar. Faz toda a diferença

Na experiência peruana que tentam trazer para as quatro paredes de seu restaurante elegante e arejado no artístico bairro de Barranco, Martinez e León nos colocam dentro de um simulador 4D da gastronomia peruana onde todos os sentidos são explorados. É impossível não sentir um frio na barriga de vez em quando.

Os chefs Virgilio Martínez e sua esposa e sócia, Pía León - Ken Motohasi - Ken Motohasi
Os chefs Virgilio Martínez e sua esposa e sócia, Pía León
Imagem: Ken Motohasi