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Rafael Leick

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Além do Qatar: ser LGBTQIA+ é ilegal em 69 países, como Maldivas e Egito

a segurança e liberdade de torcedores LGBTQIA+ nos estádios veio à tona com a Copa - RomoloTavani/Getty Images/iStockphoto
a segurança e liberdade de torcedores LGBTQIA+ nos estádios veio à tona com a Copa Imagem: RomoloTavani/Getty Images/iStockphoto

Colunista do UOL

22/11/2022 04h00

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Com o início da Copa do Mundo do Qatar, um assunto que foi pauta já no último mundial, na Rússia, voltou à tona: a segurança e liberdade de torcedores LGBTQIA+ nos estádios e outros locais do país-sede escolhido pela Fifa.

No Qatar, os torcedores gays estarão sujeitos a confisco e prisão, além de apedrejamento para homens gays que moram por lá. Infelizmente, a situação ainda é problemática em diversos outros lugares do mundo.

Hoje, ainda é ilegal ser LGBTQIA+ em 69 países e uma jurisdição não independente, em alguns com punições extremas, como pena de morte. Em dois países, é ilegal "somente" em algumas regiões ou províncias. E os países homofóbicos incluem destinos bastante turísticos, como Egito e Marrocos. Maldivas, a queridinha da vez de viajantes de redes sociais, não fica de fora.

Há também 42 países, como Paraguai, China e Indonésia, onde há barreiras legais para a liberdade de expressão sobre diversidade sexual e de gênero. Outros, incluindo Turquia, Lituânia e Bielorrúsia, têm barreiras não explícitas... legalmente, eu digo, pois alguns são bastante vocais sobre o tema, como a Rússia.

Os cuidados que viajantes LGBTQIA+ devem ter em países hostis são vários, mas é curioso pensar sobre a origem dessas restrições. Afinal, várias civilizações antigas tinham a homossexualidade e a transgeneridade como parte de suas culturas até as proibições intensificadas entre os séculos XV e XX. A explicação mais aceita por estudiosos diz que elas foram tentativas de forçar um crescimento populacional para aumentar rapidamente o exército de combatentes de guerra, proibindo a sodomia (prática de sexo anal entre um homem e outro homem ou uma mulher) ou relações homossexuais.

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Hoje, ainda é ilegal ser LGBTQIA+ em 69 países
Imagem: nito100/Getty Images/iStockphoto

Exemplos que embasam essa teoria trazem a proibição de sodomia durante o império de Gengis Khan com fim de ter mais combatentes mongóis para enfrentar o Império da China e a partir do século XV, no Ocidente, na colonização das novas terras, recém-descobertas. Ou seja, a condenação moral e as leis que regem a vida de civis foram deturpadas para atender interesses de classes dominantes que buscavam mais poder. Qualquer semelhança entre o século XV e 2022 não é mera coincidência.

Entre os 69 países onde é ilegal a homossexualidade, 32 ficam na África, 22 na Ásia, nove na região que engloba América Latina e Caribe e seis na Oceania. América do Norte e Europa não têm nenhum país nesta situação. Isso não significa, claro, que não haja restrições em alguns deles, como Polônia e Hungria ou até em alguns estados dos EUA.

Homossexualidade ilegal em destinos turísticos

Qatar

The Pearl Island, em Doha, é uma ilha construída artificialmente e um símbolo de luxo em Doha, a capital do Qatar - SkyScan - SkyScan
The Pearl Island, em Doha, é uma ilha construída artificialmente e um símbolo de luxo em Doha, a capital do Qatar
Imagem: SkyScan


Sede da Copa do Mundo 2022, o Qatar foi um dos países do Conselho de Cooperação do Golfo que proibiu estrangeiros LGBTQIA+ de trabalharem na região, em 2013. O país é regido por uma lei religiosa, sem separação entre religião e Estado. Hoje, ainda prevê sete anos de prisão para quem "copular com homem maior de dezesseis anos sem coação, coação ou astúcia"; dez anos para quem "tem sodomia como profissão ou meio de vida"; e três anos para "indução, instigação ou sedução de um homem para cometer sodomia", por exemplo.

Egito

Vista poluída para as pirâmides, no Cairo (Egito) - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Vista poluída para as pirâmides, no Cairo (Egito)
Imagem: Getty Images/iStockphoto


Não há uma lei que especificamente criminalize a atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo no Egito, mas há uma lei de combate à prostituição que é seletivamente usada para atingir indivíduos LGBTQIA+. A acusação mais comum é de incitar ou induzir a devassidão. A pena máxima é de três anos de prisão, mas há casos de mais de seis anos e uma proposta de lei tramita para aumentar para sete anos.

Em 2020, o conselho islâmico do governo emitiu pareceres legais condenando a homossexualidade e destacando a necessidade de terapias de conversão. E quem não se lembra dos casos de autoridades policiais usando armadilhas on-line (alô, Grindr!) para atrair homens gays e os submeteram a exames anais forçados enquanto estavam sob custódia, mesmo turistas.

Maldivas

Lily Beach Resort & Spa, na ilha Huvahandhoo, nas Maldivas - Reprodução/Tripadvisor - Reprodução/Tripadvisor
Lily Beach Resort & Spa, na ilha Huvahandhoo, nas Maldivas
Imagem: Reprodução/Tripadvisor


Tem lei de 2014 (somente duas Copas atrás), criminalizando "relações sexuais ilegais", como chamam as relações homossexuais. A definição de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, na lei, é descritiva ao ponto de explicitar que é "um órgão sexual de um homem ou qualquer outro objeto inserido no ânus de outro homem" ou o "órgão sexual de uma mulher ou qualquer objeto na vagina ou ânus de outra mulher", ambos para "gratificação sexual". Sim, é um texto de lei falando de ânus, vagina e pênis!

Marrocos

Essaouira, no Marrocos - Getty Images/iStockphoto - Getty Images/iStockphoto
Essaouira, no Marrocos
Imagem: Getty Images/iStockphoto


Prevê pena de prisão de seis meses a três anos e/ou multa para "atos lascivos ou antinaturais", ou o que o país entende como tal. Nos últimos anos, há relatos de prisões, processos e condenações de pessoas que foram consideradas suspeitas de participar de atividades sexuais com pessoas do mesmo sexo, sendo diversas delas contra turistas que visitavam o país.

Autoridades marroquinas também intimidam ativistas LGBTQIA+ entrando em contato com suas famílias fazendo perguntas para "expor" essas pessoas. Registros oficiais do país mostram pelo menos 170 indivíduos que foram acusados do crime de "homossexualidade" só em 2018.

A lista, infelizmente ainda imensa, dá detalhes das restrições em diversos outros países e pode ser encontrada em relatório da ILGA (veja página 113).

Veja a lista de países onde é crime ser LGBTQIA+:

África (32 países)

  • Argélia
  • Burundi
  • Camarões
  • Chade
  • Comores
  • Egito
  • Eritreia
  • Etiópia
  • Gâmbia
  • Gana
  • Guiné
  • Ilhas Maurício
  • Libéria
  • Líbia
  • Malawi
  • Marrocos
  • Mauritânia
  • Namíbia
  • Nigéria
  • Quênia
  • Senegal
  • Serra Leoa
  • Somália
  • Suazilândia
  • Sudão
  • Sudão do Sul
  • Tanzânia
  • Togo
  • Tunísia
  • Uganda
  • Zâmbia
  • Zimbábue

Ásia (22 países + 2 países onde é ilegal "só" em algumas regiões)

  • Afeganistão
  • Arábia Saudita
  • Bangladesh
  • Brunei
  • Butão
  • Emirados Árabes Unidos
  • Iêmen
  • Irã
  • Iraque
  • Kuwait
  • Líbano
  • Malásia
  • Maldivas
  • Mianmar
  • Omã
  • Paquistão
  • Qatar
  • Singapura
  • Síria
  • Sri Lanka
  • Turcomenistão
  • Uzbequistão

*Na Indonésia, a homossexualidade é ilegal "somente" em certas províncias e na Palestina, "somente" em Gaza.

América Latina e Caribe (9 países)

  • Antígua e Barbuda
  • Barbados
  • Dominica
  • Granada
  • Guiana
  • Jamaica
  • Santa Lúcia
  • São Cristóvão e Névis

São Vicente e Granadinas

Oceania (6 países + 1 jurisdição não independente)

  • Ilhas Cook (jurisdição não independente da Nova Zelândia)
  • Ilhas Salomão
  • Papua-Nova Guiné
  • Quiribati
  • Samoa
  • Tonga
  • Tuvalu