Rio ignora lei, e estádios não têm áreas destinadas a autistas

O Rio de Janeiro tem uma lei municipal que obriga os estádios da cidade a terem áreas destinadas a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Porém, isso não tem acontecido na prática.

Lei aprovada e fim do prazo

Em 3 de julho de 2023, o prefeito Eduardo Paes (PSD) sancionou a Lei nº 7.973, que exige a criação de uma área reservada a pessoas com TEA nos espaços esportivos com capacidade superior a cinco mil pessoas.

No oitavo artigo, a lei dá um prazo de 180 dias para que os estádios e arenas esportivas realizem as adequações e adaptações físicas em seus espaços. No artigo seguinte, afirma que a lei entra em vigor a partir da sua publicação.

Agora em abril - mês da conscientização sobre o autismo -, já se passaram nove meses da sanção, cerca de 270 dias, e os principais estádios do Rio de Janeiro - Maracanã, Nilton Santos e São Januário - seguem sem um espaço adequado.

Sala sensorial do Allianz Parque
Sala sensorial do Allianz Parque Imagem: Divulgação/Allianz Parque

Ausência de notificação e punição

As gestões do Maracanã, Nilton Santos e São Januário afirmaram ao UOL que não receberam nenhuma notificação da Prefeitura do Rio ou de outro órgão para a realização das adaptações. Mas, todos informaram que já têm um projeto para a implementação desse espaço.

O estádio de Flamengo e Fluminense informou que o consórcio aguarda a conclusão do processo de licitação para a realização das obras; no Botafogo está sendo realizado um estudo para a criação da sala sensorial; e no Vasco iniciaram, neste primeiro semestre, testes nos camarotes, adaptando-os para receber pessoas com TEA.

Apesar disso, as administrações explicaram que contam com profissionais treinados para atender pessoas com deficiências ocultas nos jogos e com ações periódicas para promover a inclusão.

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Apesar da falta de notificação, a Prefeitura do Rio reforçou à reportagem que a lei está em vigor - no Portal da Transparência, consta como "Norma em vigor" - mas que cabe à Procuradoria-Geral do Município do Rio regulamentar a lei para o seu cumprimento nos espaços esportivos.

Procurada pela reportagem para explicar em qual fase esse processo se encontra, a Procuradoria não respondeu.

Contudo, a Prefeitura do Rio, também informou, em nota, que na última quarta-feira (3) foi promulgada a lei 8.276 que exige acessibilidade para pessoas com deficiência, autismo e mobilidade reduzida em todos os eventos públicos ou privados no município, e com isso irão reavaliar a Lei 7.973, pois ambas tratam de temas similares.

Os clubes e estádios não serão punidos pelo descumprimento da lei, já que não há previsão de pagamento de multa ou outra sanção.

Sala sensorial no Morumbi para pessoas com Transtorno do Espectro Autista
Sala sensorial no Morumbi para pessoas com Transtorno do Espectro Autista Imagem: Reprodução/Instagram/São Paulo
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Refúgio para pessoas com TEA

As salas sensoriais são importantes em ambientes movimentados, com muito barulho e pessoas circulando, pois servem como um refúgio para pessoas com TEA, que normalmente sofrem com a sensibilidade sensorial.

A grande quantidade de estímulos causa incômodo e as salas sensoriais se tornam um ambiente seguro e aconchegante, que permite à pessoa interagir e explorar os elementos do espaço, e assim ficar confortável e se acalmar.

Estádios da capital paulista têm salas sensoriais

O Corinthians foi o primeiro clube em São Paulo a implantar o "Espaço Sensorial". O espaço da Neo Química Arena tem capacidade para 120 pessoas: conta com isolamento acústico, televisão com programação infantil, desenhos, material para colorir e blocos de montar, além de fones abafadores de ruído para os torcedores que possuem sensibilidade auditiva.

No Morumbis, estádio do São Paulo, a sala tem capacidade para 15 pessoas e materiais de suporte, como abafadores de ouvido, almofadas táteis e óculos escuros.

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Área externa no espaço para pessoas com Transtorno do Espectro Autista no Allianz Parque
Área externa no espaço para pessoas com Transtorno do Espectro Autista no Allianz Parque Imagem: Divulgação/Allianz Parque

No Allianz Parque, casa do Palmeiras, o espaço atende 24 pessoas e conta com equipamentos para suporte em crise, hiperestímulo ou desregulação. O local fica separado do público geral e oferece ambientes com focos em diferentes tipos de situações, com itens como abafadores de som, óculos escuros, spinner, cadeiras com capas texturizadas, balanço e cubo mágico.

Nos estádios de São Paulo e Palmeiras, as salas sensoriais também são utilizadas durante a semana, em parceria com clínicas especializadas, para atendimento de pessoas com TEA.

A Vila Belmiro, em Santos, ainda não tem um espaço específico para atender pessoas com TEA, mas sua construção está sendo debatida.

Não é necessário pagar valor adicional ao ingresso para utilizar as salas, que estão disponíveis aos visitantes que precisarem de apoio durante um evento ou jogo.

Sala Sensorial do Morumbi
Sala Sensorial do Morumbi Imagem: Reprodução/Instagram/São Paulo
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Projeto de Lei Nacional

Em 5 de fevereiro, o deputado Júlio Cesar Ribeiro (Republicanos - DF) apresentou um projeto de lei na Câmara dos Deputados que exige que todos os estádios do país disponibilizem uma sala sensorial para pessoas com TEA e que todas sigam o mesmo padrão específico de design.

Pelo projeto, os clubes teriam 18 meses para realizar as mudanças - prazo que pode ser prorrogado, mediante justificativas da dificuldade de fazer as alterações. O não cumprimento da lei acarretaria em advertências, multas ou outras medidas cabíveis.

O Projeto de Lei precisa passar pelo Senado e depois ser analisado pelas comissões respectivas ao assunto tratado para ser votado. Se aprovado, o presidente tem 15 dias para vetar ou sancionar.

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