Filipe Luís passa Fla a limpo: treta com Gabigol, soberano em 2019 e legado

Se o corpo dá sinais do esgotamento de quem vai se aposentar, a mente de Filipe Luís não para. O jogo de despedida da torcida do Flamengo no Maracanã, contra o Cuiabá, foi seguido de uma entrevista coletiva longa e profunda. O lateral-esquerdo que quer ser técnico passou a limpo o período de quatro anos e meio no Flamengo, revelando situações até então desconhecidas.

O que ele disse?

A relação com Gabigol teve amor e brigas, em uma parceria que ele vê para o resto da vida.

Em 2019, ele se sentia soberano. "Ninguém vai passar por mim. E se fizer gol, vamos virar".

Substituto imediato de Jorge Jesus? "Nem se fosse Guardiola daria certo".

A desilusão com Sampaoli: "Pensei: 'Vamos ser campeões com 110 pontos'".

"A minha maior virtude é potencializar os jogadores que estão do meu lado".

"Qual o legado? Deixar o sarrafo alto".

Os detalhes dados por Filipe Luís

Relação com elenco e Gabigol

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"O Flamengo foi o clube pelo qual passei em que fiz mais amigos verdadeiros. O Gabi ficou do meu lado por quatro anos e meio. Briguei com ele. Amei ele. A gente se beijou, discutiu, se xingou, ficou três meses sem se falar. É o cara com quem mais convivi. Meus melhores amigos eram Diego Alves e Diego Ribas. Mas o cara que mais ficou do meu lado foi um cara de 23 anos, na época. Eu vivi coisas com ele que não vivi com meus amigos de infância. Foi muito intenso. Quando você é campeão com uma pessoa, você participa de um elenco campeão, ninguém mais apaga. Vou encontrar eles daqui a 20 anos, vamos estar lá e com a mesma conexão".

Jogo preferido? O do 'Cincum'

"A final da Libertadores de 2019 marcou muita gente. O que eu vivi, com concentração total, foco, torcida, foram a semifinal contra o Grêmio, o 5 a 0, e o jogo de ida contra o Inter, que foi 2 a 0. Foi o jogo mais especial para mim, o do 5 a 0.

Eu olhava os companheiros e sentia: 'Nós vamos amassar'. Eu sentia isso. A gente sabia que ia ganhar. Esse estado de espírito, de ânimo, acontecem poucas vezes na carreira.

Soberano

"Nessa época de 2019, eu tinha pensamento que era soberano. 'Ninguém vai passar por mim'. Poderia até fazer gol, mas a gente vai virar o jogo, vamos ganhar, não vai ter caos, não vai ter xingamento. Eu estava lá no CT fazendo a barba e pensava: 'Será que hoje vai ser 3 ou vai ser 4'. Se fosse para voltar no tempo, gostaria de viver esse momento de se sentir soberano.

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Depois de Jesus? Nem Guardiola daria certo

"Aqui no Flamengo trocamos muito. Muito por circunstância. E alguns porque era insustentável. Não dava mais. É muito difícil aguentar a pressão midiática, porque o treinador se abala. Jorge Jesus era para ficar aqui o tempo que quisesse. Estava tudo adaptado para o que era ele. Ele resolveu sair. O próximo que viria se chamava Domènec. Poderia se chamar Guardiola que não daria certo. Eu pensava que, sim. Mas depois, vendo... Você compara tudo. "Ah, Jorge Jesus nessa hora ia não iria ao banheiro". Você compara tudo. Depois, o Rogério deu super certo. Fomos campeões, o time evoluiu. Veio pandemia. Tivemos aprendizado que com cada um deles".

O que Filipe Luís jogador faz de melhor?

Vou deixar o chapéu da humildade um pouco de lado. A minha maior virtude é potencializar os jogadores que estão do meu lado. Não é passe, domínio, nada. Eu melhoro os jogadores do meu lado.

Se eu tiver que fazer o que fiz no Atlético de Madrid, quando eu jogava com o Arda Turan, quando ele chegou, ele jogava de ponta e eu de lateral. Eu precisava me conectar com ele. O que fazer? O que ele gostava muito? Religião. Muçulmano. Fui para a mesquita com ele, vamo lá. Me fala aí o que é isso. Fui para a Turquia. Fiz uma amizade linda com ele. Se eu não me dou bem com o cara que está do meu lado, eu nunca vou jogar bem com ele. E eu faço isso. O cara que joga do meu lado eu me preocupo com ele, quero saber da vida dele, o que ele pensa dentro do campo. Eu falei pro Spindel lá, "eu sou caro, mas eu sou bom. Só que eu preciso de gente do meu lado para potencializar".

As conexões no Flamengo

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"Aqui no Flamengo, do meu lado tinha Arrascaeta. Não me custou nada. Uma viagem de avião para a Bahia, jogo emblemático, fui na ida e na volta com ele. Conversei, tomei chimarrão. Cuellar? "Não vou ter dificuldade". Pablo Marí? "Vou ter dificuldade". E não tive. Porque ele queria aprender em todo o momento, escutava".

E se o Dorival tivesse ficado...

"Eu amo o Dorival. É um avô para mim. Falo com ele toda semana. Ele me colocou para jogar no Figueirense com 17 anos. "Felipe, como meia você vai ser só mais um. Na lateral, você vai chegar à seleção brasileira". Eu quero que ele fique sempre, poruqe é meu amigo. Não sou eu que tomo decisões no clube. O clube pode ter errado, mas acertou outras vezes. Eu também erro no campo. A gente faz pênalti, gol contra, perde bola que dá gol. Por que eles não podem errar? Todo mundo erra. Real Madrid, Barcelona... Faz parte do processo".

Desilusão com Sampaoli

Quando contrataram o Sampaoli, eu pensei: "Vamos ser campeões com 110 pontos".

"Pensei que fôssemos ganhar tudo e ninguém iria roubar a bola da gente. E não aconteceu. Fizemos bons jogos, mas o time não andou. O treinador tem vários aspectos no meio. Parte mental, didática, tática. Se o Dorival ficasse teria dado certo? Não sei".

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Perda do Mundial

"Tivemos, da apresentação em 26 de dezembro até o Mundial, um mês. Eu nunca fiz um mês de pré-temporada na Europa. Nunca. A maior foi de duas semanas. Depois, tem que jogar. O Vitor Pereira só pôde se apresentar em janeiro. A culpa é nossa. Toda. Do que aconteceu. Não pode ser física a culpa. Mas temos que entender, um treinador novo, que estava no Corinthians, pegou quatro finais. Deu azar na primeira, o grupo já sente".

O que fica

"Qual o legado? Deixar o sarrafo alto. Eu gosto disso. Gosto da exigência. Eu cobro muito. No CT, eu cobro grama. Reclamo. O Flamengo é o melhor, precisa ter o melhor. Melhor gramado, melhor viagem, logística, cama, almofada, comida. Chato para caramba? Chato. O legado que fica é: tenta superar a geração de 2019. Porque aí quem ganha é o Flamengo. Tem que ter essa ambição. Eu não quero que passe 38 anos para ganhar outra Libertadores, eu quero que seja em 2024".

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