Enzo Alves é um privilegiado. Não é qualquer garoto de 13 anos que já começa a trajetória na base do Real Madrid, com 1 milhão de seguidores no Instagram e contrato com Adidas. Para o filho de Marcelo, astro do Fluminense e que por muito tempo defendeu a seleção e o clube merengue, o futebol deixou de ser brincadeira, virou sonho possível e trouxe consigo um dilema: defender a seleção brasileira ou espanhola?
Nascido em Madri, o atacante já tem uma convocação para a Sub-15 da Espanha antes mesmo de atingir a idade da categoria. Participou de um torneio neste ano, foi campeão e curtiu muito a experiência. Isso, inclusive, já acendeu um sinal na CBF. Em entrevista exclusiva ao UOL, Enzo contou o que pensa sobre o futuro:
Eu comecei agora com a seleção espanhola porque eles me chamaram. Mas na seleção brasileira estou desde pequenininho, vendo o meu pai. Mas eu nunca joguei. Com a seleção espanhola eu já tive a experiência de jogar e foi uma experiência única. Amei, vou querer repetir. Mas a seleção brasileira eu também quero muito. São duas das maiores seleções do mundo. Eu tive sorte de ser espanhol e brasileiro. Eu ainda não sei, tenho muito tempo e não estou preocupado com isso. Depois, lá na frente, eu vou descobrir o que eu quero fazer
Enzo
A percepção sobre Marcelo e Real Madrid
O timbre da voz entrega o parentesco com Marcelo. A cabeleira cacheada, cultivada desde pequeno, até seria um ingrediente a mais, mas Enzo raspou depois de terminar o campeonato mais recente na Espanha.
Enzo chegou ao Real Madrid como jogador federado aos 8 anos. Segundo a mãe, Clarice, sempre gostou de cabecear. Os primeiros chutes mais sérios foram no clube Santa Ana, porque os pais não queriam pressão sobre ele e desejavam que futebol fosse só uma brincadeira àquela altura.
Mas o Real quis o menino, que na temporada passada defendeu o Infantil A e assinou o primeiro contrato com o clube em dezembro de 2022. O tio, Caio Alves, é o empresário. Enzo já faz parte do portfólio da Doze, empresa aberta por Marcelo e o cunhado.
O filho do lateral do Fluminense é centroavante. Gosta da função e fez 32 gols em 14 jogos na temporada passada, segundo sites de estatísticas. Na parte técnica, conta com o DNA e os treinos com o pai, desde pequeno, na sala ou no jardim da casa na capital espanhola.
"Pra mim, o melhor que tem é receber um cruzamento do meu pai. Porque ele pega a bola, cruza, e é só ficar parado que a bola chega, sabe? É muito bom", diz ele, no papo que teve como fundo o cenário da Praia de Botafogo, no Rio, onde Marcelo jogava pelada.
Há pouco mais de um ano, Enzo percebeu quão relevante é o Real Madrid e o peso que Marcelo tem na história do clube e no futebol. Antes, o menino tratava o vestiário de um dos maiores clubes como uma reunião de amigos do pai cinco vezes campeão da Liga dos Campeões. Já teve até vídeo viral com desafio de cabeça. O efeito que a percepção atual traz, considerando o início da caminhada no Real, é a motivação.
As pessoas têm uma expectativa um pouquinho alta, né? Por ser filho de um jogador que é muito grande. É que nem com o filho do Cristiano. Comigo também. Mas eu gosto disso. É legal ter uma pressão, sabe? É maneiro. Eu acho que motiva muito
O que os pais acham disso tudo?
Marcelo e Clarice Alves, mulher do jogador, chegaram a Madri muito jovens. O lateral tinha 18 anos quando foi apresentado, em novembro de 2006. Quase três anos depois, Enzo nasceu.
O eixo da família só mudou no meio do ano passado, quando Marcelo assinou com o Olympiacos, da Grécia. Neste ano, aconteceu o retorno ao Rio de Janeiro. Mas Enzo continua morando na Espanha, onde estuda, joga e se sente mais à vontade.
Eu morei a minha vida inteira lá em Madri. Eu falo espanhol perfeitamente, eu entendo espanhol perfeitamente. Português eu falo bem, mas ainda tem umas palavras que eu não pronuncio bem. E eu não nasci aqui, né? Eu não morei tanto aqui, mas venho de férias sempre. Mas de se identificar, é com os dois, mas um pouquinho mais espanhol porque eu morei sempre lá, mas sendo brasileiro também
A família sempre viveu o contexto da seleção brasileira, com Enzo entrando no gramado após os treinos e brincando com o pai. Marcelo foi às Copas de 2014 e 2018, mas os pais não pressionam o filho por uma definição entre Brasil e Espanha.
"A gente deixa o Enzo completamente livre para fazer as escolhas dele. A história dele é diferente da nossa e acho que a gente sempre tenta respeitar isso. Marcelo e eu somos cariocas, né? Crescemos aqui. A nossa história é com a seleção brasileira, desde sempre. E o Enzo também. Porque ele cresceu também vendo o pai jogar pela seleção brasileira. E esse ano teve essa grande surpresa de ser chamado. Nós não esperávamos que ele fosse chamado tão novo e ainda para disputar numa categoria acima. Ele amou a experiência. Foi super bem recebido, acolhido. Então, isso foi muito especial pra ele. Mas, enfim, ele é muito novo. Ele pode experimentar ainda muitas coisas e vai saber decidir mais para frente", disse Clarice Alves, que é atriz e já fez trabalhos na Globo.
Outras respostas de Enzo
Você já considera que vai mesmo seguir esse caminho como jogador?
"Eu estou querendo muito. É o meu sonho, é o que eu mais quero. Porque, claro, ao ver meu pai jogar tanto, ser um profissional, e ganhar tanta coisa, eu queria um pouquinho ser igual. Queria jogar também, seguir. Quando eu comecei, todo mundo achava que eu não ia ser jogador. Porque eu só ficava dando estrelinha, me jogando. Mas eu gostava de jogar. Eu sempre vi meu pai jogar, eu sempre ia no campo com ele, via os jogadores, ia ver jogo. E foi assim que eu construí".
Como é que você virou atacante?
Eu comecei na defesa, na verdade. Comecei lá atrás. Depois, me botaram lá na frente, comecei a fazer um, dois gols, né? Aí eu comecei a gostar. Então, dali, quando eu cheguei no Real Madrid, perguntaram: "E aí, você joga de quê?" Eu pensei e falei: "Ah, eu quero jogar de atacante".
Em quem você se inspirou para mudar de posição e ser atacante?
"Eu, antes, não via quase nada de futebol. Mas uma pessoa que eu sempre olhei muito foi o Karim Benzema. Eu sempre gostei muito dele, desde pequenininho".
O que acontece que você consegue fazer tantos gols?
"É natural, sabe? Não sei explicar. Tem muitos que são atacantes e ficam na direita, esquerda. Mas, eu sou atacante, atacante. Então, eu sempre treino muito, finalização, de cabeça, tudo. É o que eu mais gosto".
Como foram as brincadeiras com Marcelo quando você era menor?
"Ele sempre jogava bola comigo, toda hora. Chegava dos jogos, cansado, morto, e eu: 'Pai, vamos jogar'. Ele jogava. Então, eu acho que era disso, sempre. Normalmente, não era no campinho, não. Era na sala. Quando a minha mãe não estava. Porque tinha um lustre, eu lembro, onde a gente comia, né? Em cima da mesa. Aí, claro, o gol era a porta. O gol maior era meu. Então, toda hora que meu pai chutava, eu não pegava a bola, aí, batia no lustre, quebrava, caía. Aí, depois, a gente trocava, eu chutava com toda a minha força, aí, quebrava de novo".
O que mudou pra você notar a relevância do seu pai e o lugar em que você está?
"Quando eu percebi, falei: 'Meu pai é grande no futebol'. Ele é conhecido. No TikTok e no Instagram aparece um monte de coisa sobre futebol antigo. E mostra, né? Tipo, a comparação de títulos, cinco Champions e tudo isso. Então, eu já percebi que meu pai é grande".
Alguém da seleção da Federação Espanhola tinha conversado contigo antes da convocação?
"Não, ninguém tinha falado nada. Foi uma surpresa. Eu vou admitir que eu não tinha a menor ideia de que ia existir isso ainda. Eu sabia que tinha sub-15, mas não achava tão grande assim, sabe? Eu não via muito. Agora eu tô vendo mais. Eu tô prestando mais atenção que tem Sub-16, Sub-17. Meus amigos também, né, de dois anos a mais, do Real Madrid, já foram. Então, agora eu tô começando a falar mais com eles sobre isso".
Como é que foi o jogo em si? Se sentiu bem com os caras mais velhos?
"Eu fui convocado quando eu estava machucado. Então, foi um pouco diferente do resto. Porque, quando eu cheguei, eu estava tratando e eu não jogava, não treinava com o time. Eu fazia um treino separado, com preparador físico. Fiquei meio envergonhado. Mas aí eu consegui jogar o último jogo. O primeiro jogo foi contra o Japão, o segundo contra os Estados Unidos e o terceiro, Inglaterra. Eu consegui jogar contra a Inglaterra. E, meu Deus, que caras grandes. Mas eu me senti bem".
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