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Conheça o time mineiro que nunca venceu em casa, mas mira futuro de glórias

Betis Passos Para o Futuro Futebol Clube - o time que nunca venceu como mandante - Divulgação/Betis
Betis Passos Para o Futuro Futebol Clube - o time que nunca venceu como mandante Imagem: Divulgação/Betis

Victor Martins

Colaboração para o UOL, em Ouro Branco (MG)

16/09/2022 04h00

Logo na entrada de Ouro Branco, cidade localizada a cerca de 100 quilômetros de Belo Horizonte, está o Estádio José Mapa Filho. Próximo ao centro antigo, o Mapão, como é chamado pelos moradores da região, foi construído para receber jogos de futebol amador, mas desde o início da década passada é também a casa do Betis Para o Futuro Futebol Clube. Mas o estádio municipal jamais foi palco de uma vitória da equipe profissional, nas seis temporadas do Betis na Segunda Divisão do Campeonato Mineiro, que equivale à terceira divisão estadual.

Ao todo são 27 partidas em seis anos como mandante. Nem todas foram disputadas em Ouro Branco, alguns jogos aconteceram em Sete Lagoas e Muriaé, por falta de laudos do Estádio José Mapa Filho, com 24 derrotas e apenas três empates. Em 2022, numa competição que é mais curta, com apenas sete jogos na fase inicial, o Betis já jogou duas vezes em casa e segue sem vencer — foi uma derrota e um empate. O último jogo no torneio e também em casa será disputado neste sábado, às 15h, diante do Passos. Já eliminado, a equipe local tentará quebrar o tabu como mandante diante de um adversário que ainda sonha com uma vaga nas oitavas de final.

O UOL Esporte esteve em Ouro Branco em busca de explicações para a falta de triunfos dentro de casa. Dirigentes, funcionários, jogadores e até moradores de Ouro Branco conversaram com a reportagem, mas ninguém tem uma resposta precisa. "Não tenho uma resposta para você, é uma incógnita", respondeu o presidente Raul Moreno, que até então não tinha conhecimento do retrospecto tão ruim como mandante.

Betis tem cinco pontos conquistados em seis jogos disputados na Segundona do Mineiro - Divulgação/Betis - Divulgação/Betis
Betis tem cinco pontos conquistados em seis jogos disputados na Segundona do Mineiro
Imagem: Divulgação/Betis

"Na verdade eu nem sabia disso. Quando o Baresi (vice-presidente do clube) me falou sobre isso, que fui puxar pela memória e realmente foi assim, sem nenhuma vitória dentro de casa", admitiu o dirigente.

Do elenco do Betis que disputa a Segundona mineira, quatro jogadores conversaram com o UOL Esporte. Os zagueiros Vanderson e João Victor, o meia Ronan e o atacante Jhonatan. Todos garotos abaixo dos 20 anos, todos de outros estados, como Tocantins, Rio Grande do Sul e Paraná, e todos formados na base do clube. Mas nenhum foi capaz de dar uma resposta exata para a ausência de triunfos nos jogos disputados em Ouro Branco.

Vários são os motivos apontados e que podem explicar o rendimento ruim dentro de casa, como o péssimo estado do gramado. As condições do campo no José Mapa Filho não são boas, especialmente nesta época, sem chuvas. Algo que a prefeitura de Ouro Branco promete corrigir para 2023. A reforma do gramado está aprovada para a próxima temporada e não está descartada a utilização de um piso sintético. Além do Bétis, o Contagem também manda suas partidas no Mapão.

Outro fator que interfere no desempenho como mandante é a falta de interesse do público local. Numa cidade que é reduto de torcedores do Cruzeiro e do Atlético-MG, os jogos do Betis não são grandes atrativos. Apesar do ingresso barato — a entrada para o jogo deste sábado é de apenas R$ 10 e também dá direito ao jogo do time sub-20 —, a procura é muito baixa. No compromisso mais recente em casa, o empate sem gols com o Santarritense, no dia 27 de agosto, foram vendidos apenas 111 bilhetes dos 350 colocados à venda.

Gramado ruim do Estádio José Mapa Filho, em Ouro Branco, prejudica o Betis - Victor Martins/UOL Esporte - Victor Martins/UOL Esporte
Gramado ruim do Estádio José Mapa Filho, em Ouro Branco, prejudica o Betis
Imagem: Victor Martins/UOL Esporte

Erros de arbitragem, falta de estrutura e até a baixa média de idade do clube foram citados como motivos para o Betis não vencer e casa. Apesar de a Segundona ser uma competição sub-23, com o limite de cinco atletas acima da idade, a equipe de Ouro Branco utiliza muitos jogadores do time sub-20, que disputa o estadual da categoria.

Outro aspecto que tem impacto direto nos resultados é o financeiro. O Betis não tem muito dinheiro para fazer futebol, conta com o auxílio da prefeitura de Ouro Branco e de comerciantes locais para manter as atividades. "A manutenção do clube alta, pois fazer futebol profissional é caro. Eu posso falar que só de alimentação são R$ 340 mil por 11 meses, além de R$ 82 mil com moradia. Isso é apenas a ponta do iceberg. A prefeitura é hoje nossa maior patrocinadora, mas ela não nos dá dinheiro. Ela me dá suporte, como o estádio para fazer os jogos, me dá ambulância para as partidas, tem também dois médicos para todas as categorias", explicou o presidente Raul Moreno.

Sonhando grande

Betis busca a primeira vitória como mandante na história do clube - Divulgação/Betis - Divulgação/Betis
Betis busca a primeira vitória como mandante na história do clube
Imagem: Divulgação/Betis

O retrospecto do Betis não é nada positivo na Segunda Divisão do Campeonato Mineiro, tanto que nas cinco edições anteriores o time de Ouro Branco terminou na última colocação três vezes. Até a campanha desta temporada, que já é a melhor do clube, o 14º lugar de 2019, numa competição disputada por 16 clubes, era a colocação mais alta. Mas isso não impede que todos no Betis sonhem com dias melhores.

Desde os jovens jogadores, que enxergam o clube como um trampolim, aos funcionários, torcedores e a diretoria. "Dentro de três anos eu quero estar na Primeira Divisão. Neste ano estivemos perto de buscar a classificação, mas em diversos momentos fomos prejudicados pela arbitragem", disso o presidente Raul Moreno, ao UOL Esporte.

Tarefa que não é nada fácil, afinal serão necessários dois acessos nos próximos três anos. Mas sonhar não custa caro. Com equipes também nas disputas dos Campeonatos Mineiros da base, como o sub-20, sub-17 e sub-15, o Betis projeta a venda de jogadores para impulsionar o clube. De acordo com o Raul Moreno, a equipe de Ouro Branco ainda não fez dinheiro com a negociação de atletas, apesar de já ter colocado jogadores nas categorias de base de clubes como Atlético-MG, Cruzeiro, Flamengo e até mesmo na equipe B do PSG, caso do atacante Douglas Gund, que ficou uma temporada na equipe francesa. O volante Rayr, da base, tem propostas do Grêmio e do Red Bull Bragantino.

João Victor (zagueiro), Ronan (meia) e Vanderson (zagueiro) são algumas das promessas do Betis, de Ouro Branco-MG - Victor Martins/UOL Esporte - Victor Martins/UOL Esporte
João Victor (zagueiro), Ronan (meia) e Vanderson (zagueiro) são algumas das promessas do Betis, de Ouro Branco-MG
Imagem: Victor Martins/UOL Esporte

Somando todas as categorias o Bétis tem 110 jogadores. Apesar de ter alojamento para todos os garotos, falta uma estrutura adequada para treinar. O estádio municipal é utilizado apenas para jogos e eventual nas vésperas das partidas. Como os treinos são realizados em diversos campos da região, o Betis também mira a construção de um CT. O local dos sonhos já está escolhido, um antigo clube de lazer de uma siderúrgica local, mas falta o principal: dinheiro.

Enquanto isso, os jogadores que têm contrato com o Betis também sonham com dias melhores. Não só com próprio clube, mas também em busca de voos mais altos na carreira. O atacante Vitor Leque, que pertence ao Cruzeiro, mas está emprestado ao Juventude, foi jogador do Betis e é uma das inspirações dos atletas que defendem o clube de Ouro Branco.

A origem: projeto social e inspiração na Espanha

O ex-jogador Raul Moreno é o presidente do Betis, clube de Ouro Branco-MG - Victor Martins/UOL Esporte - Victor Martins/UOL Esporte
O ex-jogador Raul Moreno é o presidente do Betis
Imagem: Victor Martins/UOL Esporte

Quando se fala em Betis logo se pensa no tradicional clube da Espanha, atual campeão da Copa do Rei, não do modesto clube do interior de Minas Gerais. O nome igual e as cores — verde, branca e preta — não são coincidência. Fundado em 1999 como projeto social, em Caxias do Sul, o Betis recebeu o nome por causa do xará famoso, que na época contava com o atacante Denilson. Presidente do clube, Raul Moreno foi jogador de futebol nos anos 1990 e montou o projeto social para ajudar crianças.

"O objetivo era ajudar as crianças de baixa renda, que não tinham oportunidades", disse o dirigente, que como jogador teve passagem mais marcante pelo Caxias. No clube gaúcho ele jogou com o centroavante Washington, o Coração Valente, e pegou o início da carreira de Tite como treinador.

Como surgiu como um projeto social, que chegou a ter 250 crianças simultaneamente e atendeu mais de 1,4 mil garotos, o nome dado foi Betis Passos Para o Futuro Futebol Clube. "A gente fazia o futebol, mas também tinha professores e profissionais de educação, para fazer trabalhos duas vezes por semana", explicou Moreno.

A mudança do Rio Grande do Sul para o interior de Minas Gerais aconteceu em 2013, quando Moreno recebeu uma proposta para trabalhar no Estrada Real Futebol Clube, também de Ouro Branco, mas já extinto. Como o primeiro projeto em Minas Gerais não deu certo, Moreno decidiu resgatar o Betis. No primeiro momento, em 2016, foram criados os times de base, e o time profissional foi criado somente em 2017. Foram mais de R$ 320 mil gastos apenas para regularizar o clube na Federação Mineira de Futebol.

"A decisão foi rápida, sem apoio nenhum, uma loucura da minha parte", completou Moreno, que num futuro próximo espera receber América-MG, Atlético-MG e Cruzeiro no Estádio José Mapa Filho. E, quem sabe, para vencer.