Quem é o americano chamado de terrorista que escolheu defender o Iraque
Justin Meram já era jogador de futebol profissional nos Estados Unidos quando recebeu uma mensagem esquisita no Facebook. O autor era desconhecido e perguntava: “você é iraquiano?”. Meram, atacante do Columbus Crew, não sabia, mas começava ali sua trajetória para defender o país do Oriente Médio. A ascendência iraquiana que lhe rendia ofensas em campo também estava abrindo portas.
Filho de pais iraquianos, ele nasceu em Shelby, no Michigan, e cresceu em território norte-americano. Nunca tinha sequer visitado o Iraque. O pai deixou o país nos anos 1960; a mãe, na década seguinte. Meram só conhecia o local pelas histórias familiares e pelas notícias que acompanhava. Por outro lado, também conhecia o preconceito por parte de torcedores que o julgavam por sua ligação com o país.
“Não posso ignorar que, jogando na MLS [Major League Soccer], ouvi torcedores de outros times me chamarem de ‘terrorista fedorento’ e gritarem outras ofensas raciais durante as partidas”, contou ele em texto publicado no “The Players’ Tribune”.
Mas a mensagem que chegou em 2013 por meio do Facebook não era uma ofensa. Embora suspeito, era um convite. Um torcedor iraquiano estava pesquisando jogadores nascidos no país ou com ascendência no Iraque para sugerir à seleção nacional. Meram respondeu “sim” à pergunta se era iraquiano.
“Eu não tinha ideia do que aconteceria depois daquela resposta. Podia ter sido uma ameaça ou alguém tentando me provocar, mas para minha surpresa terminou em algo muito melhor que qualquer coisa. E tudo logo ficou muito claro”, recordou.
O atacante acionou seus pais, advogado e amigos e todos aprovaram a ideia. Ele, então, começou a maratona para conseguir seu passaporte iraquiano. A dificuldade em encontrar os documentos corretos de seu pai, havia muito longe do país de origem, quase o fizeram desistir. Foram dois anos de processos burocráticos até que toda a papelada ficou em ordem.
Então, um técnico o alertou e perguntou: você tem certeza que quer isso? Meram diz que havia uma possibilidade de a seleção norte-americana o chamar para um período de treinos. Ou seja, se ele aceitasse estrear pelo Iraque, o sonho de defender o país onde nasceu estaria acabado.
“Eu tinha uma decisão para tomar. E nesse processo minha mente estava nas histórias felizes que minha mãe contava de sua infância no Iraque. Ela falava das palmeiras altas, da água cristalina e das areias douradas de lá. Ela e meu pai também tinham lembranças difíceis, é claro. Eu queria que ambos sentissem que o Iraque estava indo para dias melhores, então eu tinha que escolher o Iraque”, resumiu.
Meram finalmente estreou pelo Iraque, mas ele demorou a jogar no país. Por motivos de segurança, a seleção mandava suas partidas em outros países. Quando soube que um duelo contra o Quênia havia sido marcado para acontecer no Iraque, ele correu para contar a novidade aos pais, esperando uma reação de extrema alegria e orgulho.
“Minha mãe disse: ‘você não pode ir, será muito perigoso’”, lembra ele. “Eu expliquei que iria jogar lá por nós, mas também por todos os torcedores que me acompanhavam e me apoiavam pelas redes sociais. Torcedores levavam bandeiras do Iraque aos meus jogos. Eu queria levar alguma alegria para eles. Eu tinha que ir”.
Meram foi para o Iraque, visitou o país pela primeira vez e foi titular nesse jogo. Sua seleção venceu por 2 a 1, mas o momento mais marcante foi aos 36min do segundo tempo, quando ele foi substituído.
“Ainda sinto calafrios quando me lembro disso, é algo em que pensarei até o dia da minha morte. Naquele momento, o povo iraquiano deu algo indescritível para mim. Eu me senti mais completo e um orgulho único na minha vida”.
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