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Professor dá ponto para aluno vestido de Palmeiras e até corintiano festeja

Estudantes de engenharia civil aceitaram desafio e conseguiram aprovação - Reprodução
Estudantes de engenharia civil aceitaram desafio e conseguiram aprovação Imagem: Reprodução

Adriano Wilkson

Do UOL, em São Paulo

23/08/2018 04h00

Para incentivar seus estudantes a vencerem a difícil disciplina de ?Equações Diferenciais Ordinárias?, um professor universitário piauiense adotou um método pedagógico inusitado.

A turma do terceiro período de engenharia civil da Universidade Federal do Piauí tinha ido muito mal na primeira avaliação do semestre. O estudante Matheus Garcia, sabendo que o professor era palmeirense fanático, perguntou se ganharia um ponto caso fosse à aula com a camiseta do Palmeiras.

O professor Jefferson Brito não pensou duas vezes. Prometeu que, se toda a turma aparecesse vestida de Palmeiras, todos ganhariam um ponto na média. Era uma brincadeira, mas o pessoal levou a sério. Com exceção do professor, não havia nenhum palmeirense entre as trinta pessoas da sala. ?Me empenhei pra fazer com que todo mundo fosse com a camisa do Palmeiras. Teve uma resistência no começo, mas a galera abraçou a ideia?, disse o estudante Matheus Garcia, que é flamenguista.

Uma foto da sala lotada de ?palmeirenses de ocasião? foi publicada nesta semana no Twitter por Matheus e acabou viralizando. A história aconteceu em 2014.

Mesmo três corintianos engoliram seu orgulho clubístico e vestiram as cores do arquirrival. ?Eu já era bicampeão mundial, e vesti a camisa do Palmeiras para ver como era não ter um Mundial?, brinca o estudante Leonardo Lopes.

Matheus - Reprodução - Reprodução
Matheus é flamenguista, mas vestiu camisa do Palmeiras para passar
Imagem: Reprodução

Como os estudantes fizeram sua parte, o professor Jefferson fez a dele: todos ganharam um ponto na média e muitos usaram esse ponto para conseguir a aprovação na disciplina, considerada uma das mais difíceis do curso de engenharia.

?Na primeira prova eu tirei zero?, conta Matheus, que hoje faz mestrado nos Estados Unidos.

?Ele ficou decepcionado com a turma, muitos abandonaram a disciplina. Mas ele fez de tudo, deu os recursos pra gente se superar, e na segunda prova eu tireI 8. Muita gente reviveu e teve a esperança de passar. Essa brincadeira da camisa foi só um jeito descontraído de ajudar e incentivar a turma.?

Mesmo após a última prova, Matheus ainda precisava de alguns décimos para aprovação, que conseguiu graças ao ponto extra pela camiseta.

?Para me agradar é só vir com a camisa do Palmeiras?

Procurado pela reportagem, o professor Jefferson Brito, de 28 anos, se disse satisfeito com a repercussão de seu gesto. ?Sempre no primeiro dia de aula já falo logo que pra me agradar é só vir com camisa do Palmeiras?, conta ele, bem-humorado.

?É uma forma de quebrar o gelo. O professor tem algumas barreiras quando não dá abertura pros alunos. Eles ficam com medo e alguns acabam negligenciando a disciplina. Ainda mais na matemática, em que os professores têm essa fama de ser ?ditador?. Quando eles veem esse meu lado brincalhão, até falando do meu time, ficam mais à vontade, percebem que eu sou flexível e que eles podem persistir. Se faltar pouco para passarem, eu ajudo.?

Professor - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Jefferson é palmeirense e professor universitário de matemática
Imagem: Arquivo pessoal

O piauiense virou palmeirense vendo jogos pela TV. Ele se graduou em matemática e terminou um mestrado na disciplina. Também começou um doutorado ainda não concluído. Depois de sair da UFPI, ele passou a dar aula na Universidade Estadual do Piauí. Não foi a única vez em que ele usou o Palmeiras para incentivar seus alunos.

Um estudante de Jefferson precisava de 9,5, mas tirou menos que isso na prova. Foi aprovado porque apareceu na aula com o uniforme palmeirense completo: ?Ele saiu de casa com roupa normal e antes da minha aula trocou. Vestiu camiseta, calção, meião e chuteira, tudo do Palmeiras?, conta o professor.

?Eu disse: ?Rapaz, pelo seu esforço, você merece ser aprovado.?

Para Matheus Garcia e outros alunos ouvidos pela reportagem, o gesto do professor os ajudou a estudar mais e ter esperanças de aprovação. Até porque uma reprovação poderia prejudicar a aspiração de alguns de conseguir bolsas acadêmicas. ?Foi um dos maiores momentos da minha graduação?, escreveu Matheus no post que viralizou.

O professor diz que se sente lisonjeado: ?Até hoje essa história é lembrada, e eu sou conhecido no departamento como o professor da camisa do Palmeiras.?

?A construção do conhecimento não se faz só na hora da prova?, afirma ele. ?São vários fatores que avaliamos no aluno. Temos várias ferramentas pra isso. Às vezes o aluno precisa de meio ponto e podemos acrescentar analisando outros aspectos que não apenas o desempenho na prova.?

Alessandra - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Alessandra é corintiana, mas viu uma luz no fim do túnel com ponto extra
Imagem: Arquivo pessoal

Segundo ele, todas as instituições onde ele trabalhou conhecem e aceitam seu método.

Alessandra Guimarães, que hoje está no último ano do curso, também elogia o gesto de seu antigo professor. ?Eu estava praticamente enforcada na disciplina?, lembra ela. ?Sou maranhense e corintiana, mas quando teve aquela proposta de ganhar um ponto na média, foi uma luz no fim do túnel. Comentei com meu irmão, que tinha uma amiga cujo esposo era palmeirense fanático. Ele emprestou um pacote com várias camisas.?

Quando o caso veio a público, alguns internautas criticaram a atitude de Jefferson, apontando que ela seria um sinal da falência da educação pública no país. Alessandra rebate. ?Isso mostra que o professor tem o lado humano. Ele já foi aluno, viu quanto era difícil a disciplina. Não vejo como uma corrupção, como algo errado. Só mostra o quão próximo ele era da turma.?