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Ele foi forçado a parar aos 22 anos. Agora, vai ajudar Guardiola no City

O meia Sinan Bytyqi em ação pelo time juvenil do Manchester City, em 2013 - Julian Finney/Getty Images
O meia Sinan Bytyqi em ação pelo time juvenil do Manchester City, em 2013 Imagem: Julian Finney/Getty Images

Thiago Rocha

Do UOL, em São Paulo

29/11/2017 04h00

Cardiomiopatia hipertrófica. O nome assusta, ainda mais quando dito por um médico. Que o diga Sinan Bytyqi, promessa das categorias de base do Manchester City, forçado a se aposentar do futebol aos 22 anos após um exame de rotina detectar a doença cardíaca, que afeta o bombeamento de sangue para o coração.

O diagnóstico foi dado há cerca de um ano, quando Bytyqi defendia o Go Ahead Eagles, da Holanda, por empréstimo, e vinha se destacando. Meses antes, o clube inglês havia ampliado o contrato do meia até 2019, com direito a elogios do técnico Pep Guardiola. Ainda com 21 anos, ele foi chamado para uma reunião e ouviu a sentença: teria de encerrar a carreira.

"Fui a uma sala e lá estavam o treinador, a comissão técnica, o fisiologista... Perguntei: 'O que está acontecendo?' Foi surreal. O técnico mostrou um papel e disse que algo foi detectado em meu monitoramento cardíaco anual feito em Manchester, e tive de retornar à Inglaterra. Ele também disse que é o tipo de condição que o impede de praticar esporte profissional", contou Bytyqi ao jornal britânico "Daily Mail", um ano após sua história ser mantida em sigilo pelo City.

"Eles me disseram que, se eu continuasse jogando, teria 4% de chances de o meu coração parar. Se eu me aposentasse, a chance cairia para 1%", prosseguiu o agora ex-jogador. "Como eu poderia jogar sabendo que alguém ficaria com um desfibrilador na mão à beira do campo esperando acontecer algo comigo? Não seria legal."

Enquanto assimilava o golpe, Bytyqi recebeu a garantia de que não teria o contrato rescindido e recebeu a promessa de Txiki Begiristain, diretor de futebol do clube, de que seria auxiliado em busca de um novo caminho profissional. "Ele me disse que, se eu quisesse abrir uma loja no estádio (Ettihad), me ajudaria."

O futebol lhe ofereceu um recomeço, mas fora de campo. Sinan Bytyqi entrou em contato com Fergal Harkin, chefe do departamento de análise de desempenho do City, que o convidou para fazer parte da equipe. Em 2 de novembro, um ano após descobrir a doença, foi contratado como scout. Ele será responsável por filtrar dados e estatísticas de jogadores que estão emprestados a outros clubes. 

Antes um candidato a brilhar por um grande time europeu e com desempenho sendo observado de perto pelos scouts do City, Bytyqi mudou de lado. Agora, poderá ser decisivo no futuro de outros jovens talentos, ao apontar a Guardiola e sua comissão técnica quais estão se destacando e poderão ser aproveitados no elenco principal em um futuro próximo. "Eu acompanho os jogadores, faço relatórios e dou suporte a eles", resumiu a nova função.

Fuga da guerra 

Superar situações de risco faz parte da história de vida de Sinan Bytyqi. Nascido no Kosovo e de origem albanesa, ele tinha apenas seis meses de vida quando a família (pai, mãe, irmão e avós) tentou se mudar para a Áustria como refugiada, mas foi barrada por falta de documentação. "A polícia nos mandou de volta. Foram tempos ruins. Meus avós dizem que tiveram de se esconder na floresta, e quando voltaram [ao Kosovo] estava tudo destruído", relembrou.

A destruição à qual o ex-jogador se refere é a Guerra do Kosovo, em 1999, quando a província lutava por independência e foi bombardeada por 78 dias pelas forças chefiadas por Slobodan Milosevic, ex-presidente da extinta Iugoslávia, que não queria reconhecer a emancipação - ao fim do conflito, ele foi detido sob a acusação de cometer crimes contra a humanidade.

Com a situação regularizada, os Bytyqi se instalaram na Áustria. Sinan cresceu e passou a se destacar no futebol. Mesmo nas categorias de base de clubes pequenos, foi convocado para as seleções sub-17 e sub-19 do país. Em 2012, chamou a atenção do Manchester City, que o recrutou e lhe deu o primeiro contrato profissional, três anos depois. Embora lamente a aposentadoria precoce, ele se sente abençoado pela nova chance recebida.

"Não posso mudar o passado, mas posso mudar o futuro. Ou vou para casa chorar ou sigo em frente. Sou muito sortudo", decretou Bytyqi.

Alguém divida?