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Zagueiro quase virou engenheiro e superou medos da mãe para jogar no Inter

Zagueiro Klaus participa de treinamento do Internacional no CT do clube - Ricardo Duarte/Inter
Zagueiro Klaus participa de treinamento do Internacional no CT do clube Imagem: Ricardo Duarte/Inter

Marinho Saldanha

Do UOL, em Porto Alegre

24/03/2017 04h00

Tornar-se jogador de futebol não é fácil. E o zagueiro Klaus, do Inter, tem isso por experiência. Entre a escolinha de futebol em Dois Irmãos, na Serra Gaúcha, Inter, Grêmio e Novo Hamburgo na base, até o destaque no Juventude, foram obstáculos dentro e fora de campo. Morar em alojamentos, encarar frio, neve, pensar em desistir, começar uma faculdade e superar o medo da mãe, que via no futebol um futuro incerto. Tudo precisou ser deixado para trás. 

Foi no clube União, de Dois Irmãos, que os primeiros chutes aconteceram. Mesmo time que é presidido pelo pai, Ademir Klaus. Disputando campeonatos infantis, ele começou a se destacar, e em 2007 realizou o primeiro teste em uma grande equipe: o Grêmio. Foi aprovado. 
 
Chegou a Porto Alegre com apenas 13 anos e ficou por duas semanas percorrendo o trajeto de 60 quilômetros todos os dias. Passou na 'peneira', mas acabou deixando o clube porque precisava concluir os estudos. Era outra dificuldade: a pressão da mãe, Dona Mara. "Foram três dias chorando no mínimo (risos). Imagina, fiz o mais difícil que era passar no teste e não poderia ir... Ela (mãe) disse para eu terminar os estudos em casa", contou ao UOL Esporte. 
 
Professora, a mãe de Klaus não via no futebol um futuro certo para o filho. Queria que concluísse o ensino médio ao menos. Pretendia outra carreira para o então menino.
 
"Ela não queria muito no início. Não dava total apoio. Tinha traçado uma carreira para mim na cabeça dela. Meu pai, sim, me incentivava muito. Era um ambiente em que eu me sentia bem, o futebol. Dizia para minha mãe que não me via de camisa social trabalhando, me sentia bem de calção e chuteira, jogando bola. Fui levando assim. Abrindo mão de algumas coisas que meus colegas não abriam, porque queria jogar futebol. Fui me destacando e os rumos foram mudando", revelou. "Hoje ela está realizada. Ela diz: que bom que tu seguiste o que queria e foste atrás do teu sonho", contou Klaus. Os pais dele, ambos colorados, são figuras frequentes nos jogos do time. 
 
Quando completou 16 anos, tinha acabado o ensino médio. Atendeu o desejo da mãe, e estava livre para tentar. Foi quando começou a carreira, de fato. Novo Hamburgo por dois anos, Inter por um ano e três meses, Grêmio por dois anos e enfim o Juventude, onde chegou sem qualquer indicação, para testes. 
 
Depois de morar nos alojamentos de Inter e Grêmio, no Ju conviveu com outra adversidade. Logo no dia do teste, frio, neve, e novamente o alojamento de clube. Desistir? Não. Klaus passou, e nos três anos por lá ganhou espaço aos poucos. Virou profissional com Roger Machado e mostrou sua maior qualidade no ano passado, sob comando de Antonio Carlos. "Foi um ano incrível, participei da maioria dos jogos, Série C, Gauchão, Copa do Brasil, e hoje cheguei onde estou", sorriu. 
 
Como dizia Dona Mara, a mãe, Klaus também chegou a ver o futebol como incerto. Tanto que iniciou faculdade de Engenharia Civil. Fez dois semestres na PUC-RS (Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul), outros quatro na UCS (Universidade de Caxias do Sul). Agora, pelo sonho de crescer no futebol, trancou os estudos. Irá concluir depois da carreira nos gramados. "A vida não acaba com 34, 35 anos. Temos que continuar depois, ser outra coisa", comentou. 
 
Ídolos no futebol, Antonio Carlos, a chegada no Inter. Confira as demais respostas do zagueiro de 23 anos que tem contrato até o fim da temporada com o clube vermelho. 

Klaus, ex-Juventude, posa após assinar por empréstimo junto ao Internacional - Ricardo Duarte/Divulgação SC Internacional - Ricardo Duarte/Divulgação SC Internacional
Imagem: Ricardo Duarte/Divulgação SC Internacional

UOL: Depois de toda essa batalha para ser profissional do futebol, como é olhar para trás? 
Klaus: Primeiro que não é o fim, estamos do meio para baixo, no início. Olhando para trás, tudo que passei, assim como meus colegas e amigos, pessoas que estavam comigo no início, costumo dizer que valeu a pena. Tudo que deixei de fazer. Hoje eu vejo que estou realizado. Mesmo assim buscando mais, querendo mostrar que valeu a pena e colocar este ano também nas memórias. 
 
Você se espelha em quais jogadores?
Tem dois caras que eu olho, nem tanto pela parte técnica mas pelo espírito de liderança: Mascherano e Puyol. O Antonio Carlos nos cobra bastante. Diz que o zagueiro vê todo o jogo e temos que orientar os companheiros. Me inspiro no espírito deles, de tentar reunir todo mundo no mesmo objetivo. 
 
O Antonio Carlos foi um grande zagueiro também...
Eu não cheguei a ver ele jogando, mas observo a qualidade até quando ele treina conosco (Zago costuma participar dos recreativos). Por ter sido um grande zagueiro, passado por vários clubes, tenho que aprender muito com ele. Desde o ano passado (no Juventude) tenho tentado aprender bastante. É muito bom por um lado, ruim por outro. Porque ele cobra muito, muito do zagueiro. Mas para a carreira, tem que pensar que isso é para o bem. É como a mãe, o pai, quando cobram, é porque pensam no futuro, para o bem. 
 

Klaus disputa bola em partida do Internacional contra o Brasil de Pelotas - Ricardo Duarte/Inter - Ricardo Duarte/Inter
Imagem: Ricardo Duarte/Inter

O Inter tem uma concorrência muito forte na zaga. Cuesta, Ortiz, Ernando, Eduardo, Neris, Paulão, e apenas dois jogam. Como você trabalha isso?
Não é a primeira nem vai ser a última vez que isso ocorre. Mas temos que lembrar que somos um time. Se ganha, ganham todos. Mas há uma disputa sadia ali atrás. Eu estava jogando quando me lesionei. Saí do time por um tempo e estou voltando. Quero voltar à disputa, fazer bons treinos e ficar disponível novamente para ver quem vai jogar. 
 
A Série B pode significar mais chances para os jogadores surgirem no elenco? Por ser um campeonato, em tese, menos importante?
Pode dar mais chances, mas não é um campeonato menos importante. É mais importante, às vezes, ser campeão ou ao menos subir do que qualquer coisa na Série A. É um ano bastante complicado no Inter, temos muitos desafios, times que darão a vida contra nós, guerra em todos os jogos. Mas também gosto de desafios, tive isso no Juventude e temos que estar prontos. 
 
Quais são suas metas neste ano, você precisa renovar o contrato que vai até o fim do ano, apenas... Pode se dizer que você joga por isso?
Quero melhor, evoluir, estou em um nível melhor que o ano passado, mas quero ficar ainda melhor. Melhorar fisicamente, tecnicamente, para dar mais aqui. Vou trabalhar para permanecer, é claro. Quero duas coisas: renovar o contrato, mas principalmente subir com Inter de volta para a primeira divisão.