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O Rock in Rio perdeu a essência do rock? Sim, mas tudo bem!

De 13/09, uma sexta-feira, até 22/09, que é um domingo, acontecerá o festival que já faz parte da nossa história: o incrível Rock in Rio.

Existe um grande debate através de uma pergunta: o festival perdeu a sua essência?

Bom, para os grandes fãs do rock, heavy metal, hard core, blues, rock-blues, jazz, reggae, new wave, sim, o festival perdeu a sua essência. Mas quem olha para o Rock in Rio simplesmente como uma marca argumenta que ele não perdeu a essência, porque nunca foi só rock.

Vou entrar nessa discussão porque fui ao primeiro Rock in Rio, em 1985, e tenho como fazer comparações. Mas, mesmo sendo totalmente do rock and roll, vou ser bem imparcial porque escuto tudo sobre os dois lados.

O pessoal do rock diz que este de 2024 será o fim do rock and roll neste festival. Dizem também que, com o passar dos anos,tiveram cada vez menos bandas de rock participando. Nesse ponto, dou total razão.

O lado dos organizadores do evento é que este festival nunca foi só rock. Nesse ponto, eu discordo completamente, porque essa essência significa o núcleo do evento, de onde surgiu a ideia e o que motivou a existência desse festival.

A vinheta e o slogan do festival são totalmente rock and roll, com guitarra atravessada no meio do planeta, com a vinheta sendo um solo de guitarra, então como o festival não foi baseado no rock.

Tudo começou com o primeiro grande show de rock em estádios, que foi no Morumbi, nos dias 20 e 21 de março de 1981, para 200 mil pessoas. Esse show mostrou que o brasileiro estava sedento, fissurado, para assistir shows das grandes bandas de rock. Aquelas que a gente assistia nos raros programas de música na TV brasileira. Eu não perdia um TV2 Pop Show, que depois virou Som Pop, na TV Cultura, que passava os clipes dessas bandas duas décadas antes de se pensar na MTV Brasil.

Eu e meus amigos saíamos para girar por São Paulo na nossa adolescência e falávamos assim: "Já pensou a volta dos Beatles no Morumbi? E os Rolling Stones?" Era só um sonho que os adolescentes dos anos 70 tinham, e aguçava mais assistindo a esses programas.

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O Queen mostrou que o nosso mercado era vasto para receber bandas de rock. Aí surgiu o Roberto Medina com uma ideia genial, que era montar a cidade do Rock e organizar um festival. A semente da ideia foi o show do Queen, portanto, veio do rock a essência desse maravilhoso festival.

Dar como exemplo Al Jarreau, George Benson, James Taylor não são rock, é desconhecer totalmente a raiz dos estilos. Tudo veio do blues e do jazz, que, nos anos 50, esse som foi acelerado por Chuck Berry, Elvis, Jerry Lee Lewis, Little Richard, e surgiu o rock and roll.

Assim como dizer que a Folk Music não tem nada a ver com rock também é um grande absurdo. Johnny Cash, por exemplo, tocava country-rock-pop, assim como Willie Nelson, James Taylor, Joni Mitchell, Carole King, Carly Simon, Simon & Garfunkel e tantos outros.

O Rock in Rio de 1985 foi muito rock and roll, que só Ivan Lins e a Elba Ramalho era uma MPB clássica, com o Ivan com os dois pés no jazz e no pop. Ney Matogrosso foi o líder de uma das maiores bandas de rock da história, Secos & Molhados. Alceu Valença tem toda a sua mistura de ritmos, e dentro deles está o rock and roll na sua essência.

Moraes Moreira é um dos membros fundadores dos Novos Baianos, que tocavam de tudo, misturando tudo, inclusive rock progressivo e psicodélico. Gil é totalmente rock e reggae a vida toda, inclusive ele mostrou o reggae jamaicano do Bob Marley para nós. Pepeu Gomes & Baby do Brasil [Consuelo na época] juntos era rock and roll puro.

E junto com eles foram várias bandas de rock nacional, e os grandes astros do festival foram as bandas históricas como Scorpions, Whitesnake, Queen, Ozzy Osbourne, AC/DC, Iron Maiden, Yes, Rod Stewart, fora o surgimento de verdade para nós do movimento New Wave, com a The B'52s, The Go-Go's e a alemã Nina Hagen. Fora o Queen, todos estavam no Brasil pela primeira vez.

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Muitos artistas brasileiros foram hostilizados porque o público era uma maioria absoluta de metaleiros, e era a primeira vez que mais de 1 milhão e 300 mil pessoas estiveram juntas, divididas entre dez dias de festival.

Então, o Rock in Rio surgiu, sim, do rock and roll, mas os organizadores têm todo o direito de misturar estilos, a gente curtindo ou não, existe público para todos. Eu fui no dia 19/1/1985, que foi o dia do heavy metal - Pepeu & Baby, Whitesnake, Ozzy, Scorpions e, para fechar, a incrível banda australiana AC/DC.

Não tem como negar que o Rock in Rio 2024 é o menos rock de todos que a família Medina organizou, e tudo bem. Nesta edição, por exemplo, apenas a Deep Purple representará o heavy metal, o rock clássico. Será a edição menos eclética de um festival que virou seletivo, porque hoje em dia é quase totalmente para o mundo pop.

Mas não tentem justificar as poucas atrações roqueiras, dizendo que o festival nunca foi só rock, porque o Rock in Rio surgiu do rock, a essência do festival é o rock, o primeiro, de 1985, foi em sua totalidade pessoas do rock and roll.

Também entendo que o nome Rock in Rio virou uma marca, sem ter nada a ver com o rock do nome. Mas, como fará 39 anos da primeira edição, a organização poderia ter montado uma noite só com quem veio no primeiro, como James Taylor, Rod Stewart, até mesmo o Queen, que foi de onde tiveram a ideia do festival, com outro vocalista, porque já fizeram shows maravilhosos pelo mundo afora, inclusive alguns com Paul Rodgers, que foi da banda Free e depois Bad Company's.

Daí a dica!

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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