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Sócrates 70 anos: ele faz aniversário todo dia para mim

Na segunda-feira, 19 de fevereiro, o Dr. Sócrates Brasileiro Sampaio Souza Vieira de Oliveira, mais conhecido como Magrão, completaria 70 anos.

Ele foi um jogador genial que fez parte da seleção brasileira que, mesmo sem vencer a Copa de 1982 na Espanha, encantou o planeta, tornando-se referência para diversas gerações de garotos que se tornaram jogadores e treinadores, como por exemplo Pep Guardiola.

Eu vi Magrão jogar de perto desde a sua chegada ao Corinthians em 1978, pois já jogava na base e gostava de assistir aos treinos dos profissionais depois que terminávamos nossos treinos dos juvenis pela manhã.

Ficava perto da grade da Fazendinha no Parque São Jorge para ver meus ídolos de perto.

Naqueles anos de 1978/79 e 80, nunca passou pela minha cabeça um dia jogar ao seu lado, por ser muito jovem e a diferença de idade ser de 9 anos.

Quando o Sr. Orlando Fantoni, um saudoso treinador que passou pelo Corinthians, pediu para que eu subisse para treinar entre os profissionais, foi incrível porque poderia ficar mais perto e conviver com eles e, obviamente, ver mais de perto um jogador como Magrão treinar, mas principalmente falar.

Sua visão de mundo era espetacular, assim como não se enquadrava com o que os jogadores de futebol pensavam naquele momento difícil que o Brasil atravessava.

Jogador com rara inteligência social, política e futebolística, e carinhoso ao tratar as relações.

Meu primeiro contato real com ele durou mais ou menos uns 2 minutos.

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Foi em 1981, quando eu estava na Caldense na linda cidade de Poços de Caldas e a seleção brasileira foi fazer um período de treinamentos na cidade. No final desse período teve um jogo-treino entre seleção brasileira e Caldense.

Entramos em campo para jogar e a seleção entrou pouco tempo depois. Eu estava encantado em treinar contra aquele grupo de jogadores espetaculares.

Eu era mais familiarizado com os mineiros do Atlético MG do que com o próprio Magrão, mas quando eles entraram em campo, ele foi direto na minha direção e perguntou assim: "E aí garoto, tudo bem?"

Eu não acreditei naquele momento que ele se lembrava de mim dos treinos do Corinthians e respondi: "Oi, Magrão, estou bem sim. Nosso time está bem no campeonato."

E veio a resposta dele: "Que bom garoto, foi legal te ver."

Não respondi nada porque foi muito impactante esse rápido encontro para mim.

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Ele era dessa forma mesmo, sendo muito atencioso com as pessoas e com uma sutileza delicada ao entender que um simples diálogo comigo seria uma motivação incrível naquele momento.

Quando voltei em 1982, ele estava machucado e não treinava conosco porque ficava fazendo tratamento. Portanto, não tive um contato logo de início com ele.

Esse encontro no campo e fora dele só foi acontecer no dia 11 de fevereiro de 1982, na belíssima cidade de Fortaleza, quando jogamos pela terceira rodada da Taça de Prata do Campeonato Brasileiro.

Eu já havia estreado contra o Guará de Brasília de forma maravilhosa, fazendo quatro gols. Depois, em Salvador, fiz mais um gol. Mas até aí eu ainda não tinha jogado com ele. Para mim, sem o Magrão em campo, não era jogar no verdadeiro Corinthians.

Claro que estive em campo com caras que eu admirava desde garoto, como o Super Zé e o Wladimir. Mas eu queria ter o gosto de jogar ao lado desse cara ímpar que era o Dr. para muita gente.

Esse jogo foi após o carnaval e jogamos demais, parecendo que já nos conhecíamos há anos, com muito entrosamento, tabelas, sincronismo nas movimentações para uma primeira partida.

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Após o jogo e o jantar, eu estava sentado no sofá do saguão do hotel sem saber o que fazer, mas querendo sair para conhecer Fortaleza, quando entrou Raimundo Fagner e me perguntou:

"Garoto, você sabe onde está o Magrão?"

Aí já fiquei balançado!

Respondi dizendo que o Magrão estava lá atrás, no restaurante.

Fagner entrou, encontrou com ele e estavam saindo do hotel quando o Magrão me olhou e disse pela primeira vez:

"Big House, o que você irá fazer?"

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Eu respondi:

"Nada, Magrão, não conheci ninguém na cidade."

Aí ele falou:

"Então vem com a gente."

E fomos para a noite de Fortaleza: eu, Magrão e Fagner. O Zé Maria estava por perto e decidiu acompanhar como um paizão meu, afinal de contas, eu tinha só 18 anos.

Foi nessa noite que comecei a entender e conhecer um cara especial em todos os sentidos.

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Naquela mesa de um barzinho em Fortaleza, ouvindo umas canjas do Fagner no pequeno palco, que eu e o Magrão nos identificamos como pessoas, porque como jogadores isso já havia acontecido horas antes.

Daí em diante, fizemos diversas coisas juntos em campo e fora dele.

O Magrão faz aniversário todos os dias para mim, porque eu não conto o dia em que ele nasceu, mas sim o dia em que nos conhecemos.

Não conto por anos e sim por dias, desde o primeiro que foi jogando no estádio do Castelão e depois bebendo cervejas num barzinho de Fortaleza.

Porque para mim existe um cara antes de conhecer o Magrão e outro depois de conhecê-lo.

Tenho saudades sim, mas uma saudade sem dor e muito gostosa.

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Sinto vontade de conversar com ele hoje que estou bem de verdade e se estivesse por aqui, não tenho dúvidas que também estaria bem.

Como me falou diversas vezes:

"Big, eu olho para você e me vejo com 18 anos."

E eu lhe respondia:

"Poxa, Magrão, quando tiver 27 anos quero ser como você."

Parabéns, meu amigo, mestre, parceiro, companheiro de futebol e de luta.

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Você sempre será o meu camisa 8, assim como tenho certeza de que sempre serei o seu camisa 9.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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