Dérbi muda a vida de um jogador, como mudou a minha em 1982
![Casagrande em ação pelo Corinthians, em 1982 Casagrande em ação pelo Corinthians, em 1982](https://conteudo.imguol.com.br/c/esporte/c5/2022/08/31/walter-casagrande-jr-em-sua-estreia-pelo-corinthians-em-1982-no-estadio-do-pacaembu-1661972996829_v2_450x450.jpg)
Neste domingo (18) teremos o primeiro Dérbi do ano, que, sem dúvida, é um dos jogos mais esperados do Campeonato Paulista.
Aqui no Brasil, alguns clássicos estão entre os mais importantes e com mais rivalidade do futebol mundial: Grenal, BA-Vi, Fla-Flu, Atlético x Cruzeiro, Atletiba, Remo x Paysandu, entre outros. Palmeiras x Corinthians também é um embate de grande destaque.
É um jogo tão importante que já foi retratado em livros e filmes, como "Boleiros", do cineasta Ugo Giorgetti.
O filme tem a frase clássica do personagem interpretado por Lima Duarte, que é treinador do Palmeiras, para Marisa Orth, que faz o papel de uma "Maria Chuteira". A cena ocorre dentro do hotel onde o time está concentrado à véspera de um Dérbi.
Classificação e jogos
Ele percebe que ela está rondando e vai ao seu encontro, dizendo: "Você não sabe o que é um Corinthians x Palmeiras."
Outro filme interessante é "O Casamento de Romeu e Julieta", de Bruno Barreto, que tem cenas engraçadas com o saudoso Luis Gustavo — um torcedor fanático do São Paulo, mas que faz o papel de um grande palmeirense nesta obra. Ele interpreta o pai de Julieta (Luana Piovani), que se apaixona por Romeu (Marco Ricca), um corintiano da Gaviões e que finge ser palmeirense por amor a Julieta.
Acredito que todos os torcedores dos dois times têm alguma história para contar sobre esse jogo. Imaginem quem já participou diretamente desse confronto como jogadores, treinadores e árbitros.
Bom, vou contar a história do meu primeiro Dérbi vestindo a camisa do Corinthians profissionalmente.
Foi num domingo, 1º de agosto de 1982, pelo primeiro turno do Paulistão.
Vínhamos de uma vitória no meio da semana por 2 x 0 sobre o Juventus, com um gol meu e outro do Zenon.
Mas o nosso time ainda não tinha embalado e nem conquistado totalmente o amor da Fiel torcida. Afinal de contas, tínhamos uma nova proposta de relação entre um jogador de futebol e a sociedade.
Nós chegamos para este clássico conscientes de que seria um divisor de águas. Tanto a vitória como a derrota foi o dia D da Democracia Corintiana.
No meu caso, especificamente, era bem mais delicado. Eu era um centroavante formado no clube desde os meus 10 anos. A direção e a torcida corintiana tinham pouca paciência com os atacantes oriundos da base. Antes de mim, o último centroavante que havia subido dos juvenis tinha sido o Mirandinha, em 1971 — ele só ganhou prestígio e respeito quando foi jogar no São Paulo.
Eu tinha 18 anos, já havia disputado duas Copas São Paulo (fui eleito a revelação da Copinha de 1980) e vinha de um empréstimo para a Caldense, pois disputei o Mineiro de 1981 e fui muito bem — fui um dos artilheiros do campeonato.
Mas o Dérbi define muito o futuro de um jogador vindo da base ou não. Já tinha visto vários atletas se queimarem por terem falhado numa derrota para o Palmeiras.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberSó que chegamos ao Morumbi muito confiantes, uma vez que estávamos vendo a evolução técnica, tática e de entrosamento do nosso time nos treinos e também nos jogos.
A partida começou equilibrada, mas aos poucos fomos dominando o jogo. Num lance coletivo maravilhoso entre Wladimir e Biro-Biro, que tocou para mim, aberto na esquerda, e eu devolvi para ele. O Biro-Biro passou para Zenon, que deixou Biro dentro da área na cara do goleiro Gilmar para fazer 1 x 0 para o Timão.
Depois disso, dominamos totalmente a partida, com tabelas e toques rápidos envolventes. Tanto que no final do primeiro tempo, Gilmar perdeu a paciência e deu um pontapé no nosso lateral, o Alfinete, e foi expulso.
Regressamos ao gramado um pouco relaxados, e o Palmeiras empatou com o Jorginho (Marília). O gol deles serviu para nos acordar.
Voltamos a fazer uma grande partida e, numa outra jogada pela esquerda, o Wladimir tocou para o Magrão dentro da área, quase na linha de fundo. Quando o volante Rocha deu um carrinho e o Magrão deu um corte seco, mas o Rocha levou a bola com a mão, resultando em pênalti!
O Magrão foi lá e bateu firme, fazendo 2 x 1. A partir daí, não sofremos mais nenhum perigo e fizemos o Palmeiras correr atrás da bola, enquanto atacávamos o tempo todo.
Até chegarmos aos 37 minutos do segundo tempo, quando, numa jogada espetacular entre o volante Paulinho e o Alfinete, que deu um passe forte para mim dentro da área. Só tive o trabalho de escorar para as redes: 3 x 1.
Aos 38, numa jogada parecida, só que com o Magrão e o Alfinete, que dessa vez cruzou forte. O Ataliba antecipou o Luiz Pereira e bateu no gol. O goleiro João Marcos rebateu e eu estava ali novamente para fazer 4 x 1.
Eu não estava acreditando vendo tudo acontecer, mas não parou por aí. A coisa ficou ainda mais sinistra.
Aos 41 minutos, o Zenon tocou para o Magrão no meio campo e partiu como elemento surpresa, recebendo um passe genial de volta. O Zenon dominou e chutou rasteiro, forte e na diagonal. O goleiro ficou batido e a bola explodiu na trave esquerda, voltou e novamente eu estava ali, só escorando para ampliar a goleada em 5 x 1, e anotando o meu terceiro gol no Dérbi.
Foi inacreditável, inesquecível, maravilhoso.
Nunca pensei que faria três gols num Corinthians x Palmeiras, com o Morumbi lotado, em partida válida entre os profissionais.
Em 1980, jogando na preliminar do Dérbi, também havia feito três gols na vitória por 4 x 1 contra o Palmeiras.
Depois disso, o nosso time deslanchou de tal forma que ganharmos o primeiro turno com muita facilidade. Eu me firmei como titular absoluto e disparei a marcar no Paulista de 1982, acabando com 28 gols e sendo o artilheiro do campeonato.
Por isso digo que Corinthians x Palmeiras pode definir o futuro de um jogador, dependendo do rendimento e dos acontecimentos deste clássico.
Neste Dérbi de hoje, o Palmeiras é o grande favorito devido aos inúmeros títulos que conquistou nas últimas temporadas e por ter o mesmo treinador e a mesma base do time há quatro anos.
Além disso, a maioria dos jogadores do Palmeiras já disputou este clássico diversas vezes.
Diferentemente do Corinthians, pois boa parte do atual elenco jogará o Dérbi pela primeira vez. Também será a estreia do técnico António Oliveira neste clássico.
Esta rivalidade é histórica, com diversos jogos marcantes, como o título do IV Centenário, em 1954, quando o Corinthians se sagrou campeão após o empate por 1 x 1 com o Palmeiras.
Mas também teve a vitória do Palmeiras por 1 x 0, em 1974, com gol do saudoso Ronaldo Drumond, evitando a quebra do tabu que naquele momento era de 20 anos sem títulos do Corinthians.
Enfim, estes times já se cruzaram diversas vezes e em momentos cruciais da história de cada um, o que só serviu para que esta maravilhosa rivalidade aumentasse cada vez mais.
É uma pena que será em Barueri e só com uma torcida.
Corinthians x Palmeiras é um clássico para se jogar num campo neutro na cidade e com público dividido.
Ainda tenho esperança que os espetáculos das cores, com bandeiras e faixas, realizados pelas torcidas voltem a acontecer.
Deixe seu comentário