Milly Lacombe

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OpiniãoEsporte

Tite, Abel e a cruel gangorra da idolatria

Tite escalou um time alternativo para enfrentar o fraco Bolivar e a altitude de La Paz, não necessariamente nessa ordem de rivalidade. Abel decidiu ir com o elenco que considerou mais experiente para duelar com o bem montado Independiente del Valle também na altitude, ainda que em uma elevação menos cruel do que a boliviana na qual o Flamengo estava.

Tite e suas ideias foram derrotados, e Abel venceu um jogo que, dramaticamente, poderia ser uma opereta.

Na coletiva, Tite usou seu vocabulário corriqueiro para falar de ciência e cautela. Já Abel, confessou que teve muitas dúvidas para escolher o elenco inicial e, depois de se reunir com a comissão, optou pelo mais experiente.

De cara, o Palmeiras apanhou. Os elementos daquele primeiro tempo contra o Botafogo pelo segundo turno do Brasileirão de 2023 estavam lá: parecia que o Palmeiras levaria um sacode. O Independiente abriu 2 x 0 e ameaçou fazer o terceiro.

Como fez no nível do mar do Rio de Janeiro, Abel foi para o intervalo e não mexeu no time que estava nas cordas. A diferença entre Quito e o que aconteceu no Rio foi o gol de Endrick no final do primeiro tempo; no Rio o Palmeiras foi para o vestiário perdendo de três a zero. Assim como no Nilton Santos, Abel bancou seu elenco mesmo diante de um primeiro tempo horroroso. A experiência em jogos no Equador fizeram o treinador achar que o time seguraria as pancadas e seria capaz de reagir.

E ele estava certo. O Palmeiras voltou com uma marcação ajustada sobre o excelente garoto de 17 anos Kendry Paez e entrou definitivamente no jogo. Quando Veiga, que teve bom desempenho tático mas não técnico, deu lugar à cria da base Luis Guilherme e Lazaro entrou em campo, tudo mudou de vez.

Era como se o Palmeiras tivesse três modos de jogar: o modo-teste, com Rony e Endrick no ataque, Endrick voltando bastante e Veiga marcando mais do que armando, o modo "não vamos perder esse jogo", com a marcação ajustada do lado esquerdo, um meio de campo cheio e prudente e o empate garantido, e o modo "vamos ganhar esse troço", com um zagueiro a menos, muitos atacantes e mais e o time solto para atacar. Contra o Flamengo pelo Brasileiro o Palmeiras ficou no modo "não vamos perder esse troço" mesmo tendo, no finalzinho, tentado mudar o padrão.

No Equador, deu em vitória. Uma vitória construída no drama e na superação. Uma vitória que, para quem viu apenas o primeiro tempo e foi dormir, era impossível.

Agora segurem esse time, unido pelo poderoso tecido da resiliência e da memória de conquistas improvável.

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Já Tite e seu elenco de cristal terão que correr atrás de novas estratégias.

Uma vitória larga sobre o Botafogo no domingo é o que deixará o trabalho de Tite outra vez dentro de uma zona de conforto e justificará suas escolhas até aqui. Nesse caso, Tite voltará a ser exaltado como líder e os jogos anteriores serão esquecidos.

Qualquer coisa que não seja jogar o fino e vencer o Botafogo manterá o nível de questionamento sobre poupar jogadores em jogos importantes, sobre não esclarecer se há e quais são as prioridades, sobre por que não tensionar esse elenco tão criativo e talentoso a limites necessários e poupar depois.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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