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Clodoaldo Silva

Pessoas com deficiência estão longe de ter representatividade na política

Talita Cadeirante, eleita vereadora em Taubaté (SP) - Ramon Pansonato
Talita Cadeirante, eleita vereadora em Taubaté (SP) Imagem: Ramon Pansonato

19/11/2020 16h56

Ainda não temos dados oficiais sobre o número de candidatos com deficiência que se elegeram no Brasil e não sei se teremos. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, esses números poderão ser publicados em breve. Como é a primeira vez que os candidatos fazem a auto declaração se possuem ou não algum tipo de deficiência, acredito também que teremos mais facilidade de ter uma estatística. Mesmo sabendo que essa declaração, assim como a de raça dos indivíduos, não é obrigatória.

Na semana passada, eu trouxe estatísticas sobre o número de candidatos com deficiência que concorreram ao pleito. Apenas um 1,2% das candidaturas em todas as cidades brasileiras. Tenho certeza que o número de eleitos também foi muito baixo.

Para nós, que somos pessoas com deficiência, a falta de representatividade na política reflete no nosso dia a dia. Se não temos alguém que nos defenda em âmbito legislativo como teremos nossos direitos resguardados. E digo mais: não basta ter a lei. O mais importante é colocar em prática o que dizem nossas leis e garantir, de uma vez por todas, a igualdade.

A luta pela representatividade na política tem que ser algo contínuo. Não existe representatividade se nós não estivermos lá. Para nós, os candidatos que abraçam as nossas bandeiras de lutas são muito bem-vindos, no entanto, a representatividade só é feita quando nós mesmos tomamos conta do espaço.

Nessa eleição, algumas candidaturas me chamaram a atenção (veja abaixo). Aproveito o momento para registrar a tendência nestas eleições de usar o tipo da deficiência no nome de urna do candidato. Temos, por exemplo, as candidaturas de Rodrigo Cadeirante, eleito vereador mais votado de Montes Claros (MG), e Talita Cadeirante (foto acima), a segunda mais votada de Taubaté (SP). Notei também que outros estavam candidatos usaram a deficiência visual como forma de identificação, como Paulo Cego e Facão Cego.

Ainda sobre representatividade, quero deixar aqui minhas inquietações: a maioria dos candidatos que tem algum tipo de deficiência é cadeirante ou cego. Ainda precisamos de investir para que outros segmentos de pessoas com deficiência participem das eleições. Se não somos vistos, não somos lembrados.

Os desafios para que a gente seja bem representado na política também são árduos. Ainda temos poucos candidatos concorrendo. Tenho certeza de que os resultados gerais das eleições nos mostrarão um retrato nada favorável em relação ao número de pessoas com alguma deficiência eleitas. Além de sermos poucos, temos poucas mulheres com deficiência na política, poucos jovens e, principalmente, ausência de diferentes tipos de deficiência. O caminho ainda é longo, mas necessário!

Em prol dos direitos das Pessoas com Deficiência

Rio Grande do Norte - Por equidade e inclusão

Começando pela minha terra. Tércio Tinoco entra para a história como o primeiro cadeirante eleito em Natal, com 3.101 votos. Fiquei muito feliz com essa conquista porque conheço o trabalho do Tércio em prol da inclusão das pessoas com deficiência. Ele é um paratleta de tênis de mesa e atual presidente da Sociedade Amigos do Deficiente Físico do RN (Sadef-RN), organização que vesti a camisa durante muito tempo. A luta dele é legítima. Não usou dinheiro público na campanha, não teve padrinhos políticos e nem é de família tradicional na política. Foi eleito por ser um grande representante da categoria no RN (Estado que possui cerca de 28% da população com algum tipo de deficiência). Tércio está envolvido com projetos direcionados para as pessoas com deficiência como "Natal Praia Inclusiva" e atua como liderança para derrubar projetos que retiram direitos das pessoas com deficiência, como foi o caso da derrubada do veto da isenção do IPVA para PCD em 2019.

O mais votado de Joinville, SC

Alisson Julio, eleito vereador em Joinville - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Alisson Julio, eleito vereador em Joinville
Imagem: Arquivo pessoal

Alisson Julio, 32 anos, do Novo, será o primeiro cadeirante a assumir o cargo de vereador em Joinville. Ele foi eleito com quase 10 mil votos e fez história no maior colégio eleitoral de Santa Catarina. Analista de sistemas, MBA em Gestão Empresarial e palestrante, foi incentivado a entrar na política pelo público que o assistia em palestras. Em 2016, ele se candidatou, no entanto, sua campanha foi tímida, pois tinha que se dedicar ao seu trabalho formal também. Durante a campanha, percebeu que conseguiria ser eleito. Suas propostas giram em torno de atualização política, serviços para todos e todas, e transparência e redução de gastos. Nas redes sociais, ele agradeceu com muita emoção aos voluntários que o ajudaram na campanha.

Uma cadeira do povo na Câmara - Montes Claros, MG

O vereador mais votado de Montes Claros, em Minas Gerais, foi Rodrigo Cadeirante, da Rede, com 3.550 votos. Essa será seu terceiro mandato consecutivo. Ele também declarou que recusou verba do fundo eleitoral, partidário e de qualquer tipo de doação financeira. É mais um que ganhou pelo próprio esforço e recebeu votos de amigos, pessoas com deficiência e familiares. "Não prometi nada durante a minha campanha, mas agora prometo retribuir cada um dos 3.550 votos que recebi. A responsabilidade aumentou", afirmou em vídeo publicado no seu Facebook.

Se um de nós está lá, todos estamos - Taubaté
A cidade de Taubaté, no interior paulista, elegeu a Talita Cadeirante, do PSDB. Aos 23 anos, ela recebeu 2,9 mil votos. A jovem recebeu a segunda maior votação da cidade e é a mais nova entre os vereadores eleitos. Professora e moradora da periferia, Talita declarou, durante as eleições, que a falta de voz para a mobilidade e acessibilidade das pessoas com deficiência a motivou a tentar uma vaga na Câmara de Vereadores. Um dos lemas da campanha de Talita foi "nada sobre nós, sem nós" - que é amplamente utilizado a partir da década de 90 se referindo à inclusão. Em sua rede social ela escreveu: "Nesse domingo fizemos história! Quero agradecer a confiança de cada um de vocês que acompanharam e divulgaram o meu trabalho, acreditaram em mim e me escolheram para sua representante! Se um de nós está lá, todos estamos! O pódio é nosso!", afirma Talita.

A inclusão é um direito não um favor - Rio de Janeiro, RJ
A vereadora Luciana Novaes, tetraplégica e dependente de ventilação mecânica, foi reeleita com 15.311 votos. Ela está entre as dez mulheres que foram eleitas a vereadoras no Rio de Janeiro. Luciana Novaes iniciou na política em 2012, quando finalizou seu curso de serviço social.

Belo Horizonte

Walter Tosta, do PR, está entre os dez vereadores mais votados de Belo Horizonte. Ele teve 8.072 votos e ficou na nona posição. Ele, que já foi deputado federal entre 2011 e 2015, não conseguiu se reeleger nas eleições de 2018.

Outros candidatos eleitos

Ivan Cadeirante (cadeirante) - Medianeira/ PR
Adilson Vicente (cego) - Jandaiá do Sul/ PR
Edevaldo Mattoso Barbosa - Ponta Porã / MS
Nilson Martins (cadeirante) - Santana de Paranaíba / SP
Ana Kelly ou a Kelinha de Naldo (deficiente auditiva) - Araçagi / PB
Professor Rafael Celestrin (cego)- Pato Branco/PR
Adriano Targino (deficiência física por causa da Poliomielite ) - Arapiraca/AL
Leandro Lauriano, Lão (deficiente visual) - Bebedouro/SP.

Abraços aquáticos e excelente fim de quinta-feira para todos!