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André Rocha

Só falta o ponta pela direita no quebra-cabeça ofensivo de Tite na seleção

Seleção brasileira comemora segundo gol contra a Bolívia - Lucas Figueiredo/CBF
Seleção brasileira comemora segundo gol contra a Bolívia Imagem: Lucas Figueiredo/CBF

Colunista do UOL Esporte

10/10/2020 09h24

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Foram quase onze meses sem a seleção se reunir. O último jogo oficial foi pela Copa América, há quase um ano e meio. Tite teve bastante tempo para pensar sobre a montagem da seleção brasileira e buscar saídas para alguns problemas de difícil solução.

O maior deles é o de combinar características ofensivas. Primeiro porque o Brasil no ataque tem seus principais jogadores com a tendência de partir do lado esquerdo, cortar para dentro e finalizar ou servir os companheiros: Neymar, Philippe Coutinho, Gabriel Jesus, Richarlison e Everton Cebolinha.

Para complicar ainda mais, apesar de toda qualidade envolvida, o centroavante, embora móvel, não é de atacar espaços às costas da defesa adversária. No Liverpool, Roberto Firmino também é um "arco" que aciona as "flechas" Salah e Mané. Tite também sentia falta de laterais que contribuíssem dando amplitude e um meio-campista, seja no 4-3-3/4-1-4-1 ou no 4-2-3-1, que viesse de trás e se juntasse ao quarteto ofensivo ou tivesse intensidade para dar sustentação na transição defensiva auxiliando Casemiro.

Renan Lodi e Douglas Luiz foram as peças que Tite escolheu para encaixar o 4-2-3-1 sem bola e o 2-3-5 em fase ofensiva que ele vinha buscando há tempos. Para ser mais exato, desde o empate sem gols em Wembley com a Inglaterra cheia de reservas e linha de cinco na defesa, no final de 2017. Quando o "ataque posicional" passou a fazer parte do vocabulário do treinador.

O "quinto homem" que ele tanto mencionou em entrevistas foi Lodi. O lateral bem aberto pela esquerda, justamente para não subaproveitar um dos atacantes citados acima, só driblando para fora e buscando o fundo para cruzar. Nem afunilar toda hora cortando para dentro. Assim deixou o trabalho pelo centro e entre a defesa e o meio-campo do adversário com Neymar, Coutinho e Firmino.

Douglas Luiz trabalhou como um suporte a Casemiro e boa opção de desafogo para o quinteto ofensivo na circulação da bola. Completando o trio na intermediária com Danilo, um lateral construindo mais por dentro. Assim Tite compensa com inteligência uma carência no setor que não encontra uma reposição para Daniel Alves.

Para completar o quebra-cabeça falta o ponteiro pela direita. Para abrir o campo, buscar o fundo e também infiltrar em diagonal para finalizar. Tite conta com Gabriel Jesus, ausente da abertura das eliminatórias por lesão. Embora se adapte bem por ali e atue nesta zona do campo muitas vezes no Manchester City, ainda não parece a peça ideal por não ter o drible como ponto forte.

Everton Cebolinha até foi uma aposta válida, justamente pelo ímpeto da vitória pessoal, mas a falta de hábito de driblar para fora dificultou um pouco a vida do atacante. Tite pode insistir com Rodrygo, que parece o mais talhado para a função, porém ainda falta rodagem na carreira e com a camisa verde e amarela. Algo a ser trabalhado.

Ah, sim! O jogo. Os 5 a 0 sobre a fraquíssima Bolivia na Neo Química Arena em Itaquera foram construídos com tranquilidade, especialmente por conta do gol de Marquinhos logo aos 16 minutos. Para furar a retranca, descomplicar a partida e dar confiança para a goleada que poderia ter sido maior, não fossem boas chances desperdiçadas, especialmente por Firmino.

Ainda assim, o atacante foi o artilheiro da noite com dois gols. Coutinho, mais forte fisicamente depois da passagem pelo Bayern de Munique, fechou a goleada que ainda teve o gol contra de Carrasco, desviando cabeçada de Rodrygo. Valeu pela concentração da equipe, por nunca baixar a guarda e manter a marcação adiantada e pressionada. Não serve, porém, como avaliação mais criteriosa do desempenho.

Mas funcionou como um treinamento para o jogo contra o Peru, em Lima. Valeu observar os movimentos coletivos e o que Tite pretende fazer para que o talento se entenda em campo e ocupe melhor os espaços no ataque. O tempo livre, forçado pela pandemia, acabou sendo produtivo e rendeu ideias interessantes. Vejamos na prática em um duelo mais parelho.