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OPINIÃO

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Quais são os fatores da virada em 2022 do Boston Celtics e de Jayson Tatum

Jayson Tatum, ala do Boston Celtics, sobe para o arremesso na vitória contra o Minnesota Timberwolves - Kathryn Riley/ Getty Images
Jayson Tatum, ala do Boston Celtics, sobe para o arremesso na vitória contra o Minnesota Timberwolves Imagem: Kathryn Riley/ Getty Images

Por Drika Evarini

30/03/2022 04h00

A pergunta que todos estão se fazendo atualmente na NBA é: o Boston Celtics continuará no mesmo ritmo na reta final da temporada regular e conseguirá manter o melhor basquete da liga nos playoffs? E, depois da recente lesão de Robert Williams III, a pergunta ganhou um tempero a mais: o Celtics é capaz de encontrar uma solução para a ausência de uma peça chave do seu atual sucesso?

Mas, antes disso, como foi que o Celtics saiu de um time frustrante e decepcionante que chegou a ficar fora da zona de play-in em 2021 para a sensação de 2022? Há que se admitir, o time levou a ferro e fogo o ditado "virada de ano, mudança de vida" e virou uma chave que o alçou de mero coadjuvante para o centro das atenções.

Para se ter uma ideia da guinada que aconteceu com o estourar dos fogos anunciando 2022, vamos voltar no tempo e relembrar as campanhas do ano passado. Em outubro, campanha de 2-4; novembro chegou e trouxe uma melhora, 9-6, que se inverteu em dezembro para um 6-9. Em 2021, o torcedor celta precisou lidar com vantagens perdidas e derrotas humilhantes, como a virada desastrosa do Chicago Bulls - que pode ter, inclusive, colaborado para a mudança de rumo da equipe.

Pois bem, 2022 chegou e foi quando tudo mudou. De janeiro até aqui, o Celtics não sabe o que é perder mais do que vencer. Em janeiro, 10-6, em fevereiro 9-2 e neste mês de março, sonoros 11-2. Duas derrotas em um mês. São 30 vitórias e apenas 10 derrotas em 2022, com 13 vitórias e três derrotas após a parada para o All Star Game. Entre os êxitos que começaram a indicar que não era bem uma ilusão da torcida e estava mais para dor de cabeça para os adversários se destacam "senhoras vitórias" sobre adversários diretos, candidatos e até favoritos ao título, como os 48 pontos em cima do Sixers, a vitória sobre o Miami Heat e as - no plural - boas partidas e vitórias para cima do Brooklyn Nets. Nem só de calendário fácil viveu o Celtics neste ano. Somada a essa campanha, o Celtics tem a melhor defesa de toda a NBA, limitando seus adversários a uma média de 104 pontos por jogo e deixando alguns deles atrás da marca dos 100 pontos por jogo.

A virada celta aconteceu no mesmo momento em que um personagem incorporou tudo que se espera dele e passou a fazer uma temporada digna de MVP; e, não à toa, é o quarto na briga pelo prêmio segundo a NBA.com. Jayson Tatum tem espantado os adversários, é bem verdade, mas também a própria torcida, quebrando recordes, entrando para a história com sequências de jogos irretocáveis. Desde a virada de ano, o franchise player de Boston lidera a liga em pontos, em +/-, tem o melhor saldo de pontos do Leste e da NBA, está com média de 27,1 PPG e 8,1 RPG (é o quarto no quesito rebotes) e, quando ele marca 30 pontos ou mais, a tendência de vitória celta aumenta consideravelmente: são 22-5 para o time de Boston quando o camisa 0 atinge essa marca.

Mas não é só Jayson Tatum que tem trazido um protagonismo a mais e assumido a responsabilidade no ataque celta. Jaylen Brown, sua dupla desde que ele chegou à NBA, também amadureceu. Nos últimos cinco jogos dele em quadra, as médias são de 28,4 PPG, 5 RPG, quase 60 FG% e 52 3P%. Quem não se lembra do tweet de Jaylen Brown "The energy is about to shift"? Desde lá são 21 vitórias e apenas três derrotas para o time celta, e parece que a energia realmente mudou. Isso é visível para qualquer ser humano que acompanhou Celtics em 2021 e acompanha em 2022: há outra aura, outro clima e, obviamente, outro resultado.

Mas, mais que a energia, o que mais tem feito com que o time de Ime Udoka assombre a todos com uma mudança tão drástica? Além das cobranças que certamente aconteceram nos vestiários, no Auerbach Center a cada trabalho e nos corredores do TD Garden, aquelas cobranças que foram vistas e ouvidas como a ponta de um iceberg em entrevistas, o time conseguiu, com Ime Udoka, desenvolver o melhor do que ele tinha para "ensinar" e queria colocar em quadra: uma defesa quase intransponível. O sucesso do Celtics passa muito pelo amadurecimento, consistência e responsabilidades finalmente assumidas com rigor da dupla Jay-Jay, mas o motor dessa mudança, dessa campanha e dessa guinada é a defesa. E uma defesa que mudou completamente a maneira como Boston vinha jogando, ouso dizer, há alguns anos.

A base defensiva forte que o time sempre teve em Marcus Smart se multiplicou, ganhou potência, tamanho e mais força em Timelord e a aplicação se espalhou para absolutamente todos os jogadores do time. Atualmente, Jayson Tatum, Jaylen Brown, Grant Williams, Derrick White, Payton Pritchard, todos que participam ativamente da rotação são defensores capazes de limitar seus adversários, e não são adversários quaisquer. O Celtics conseguiu minimizar os impactos de caras como Nikola Jokic, Ja Morant, Joel Embiid, Stephen Curry - o que, cá entre nós, não é uma tarefa das mais fáceis. Com agilidade e ferocidade, o Celtics consegue se movimentar na quadra de defesa com trocas inteligentes, assertivas e que confundem o adversário, liberando jogadores em troca da proteção de peças potenciais e do seu garrafão. Nenhuma outra defesa protege tão bem a sua quadra e, com isso, provocar erros adversários e recuperar a posse da bola se tornou uma tarefa menos exaustiva, girando o motor para o setor ofensivo que deixou de ser baseado em isolations e se transformou em um jogo fincado em jogadas pensadas, exploração do passe extra, movimentação de bola e espaços e potencialização das principais características de cada um em cada momento do jogo.

Jayson Tatum, um dos alas que mais tem facilidade para infiltrar e atacar o aro, tem o feito com mais frequência, além de ter afiado seu chute do perímetro. Jaylen Brown está ainda mais veloz e forte, rasgando defesas adversárias rumo à cesta, bem como Payton Pritchard e seu aproveitamento monstruoso da linha de 3P, Marcus Smart e o seu "cala boca" para quem bradava que ele não poderia ser o armador primário do time, Al Horford que - apesar da idade - mostra que seu melhor basquete sempre esteve em Boston, Grant Williams e o amadurecimento de sua defesa, tomada de decisões e escolha de arremessos e Timelord que domina completamente o garrafão nos opostos da quadra. Além deles, a adição de Daniel Theis e Derrick White fecharam um grupo que conta, ainda, com peças que invariavelmente entram e contribuem, como o jovem Aaron Nesmith. O Boston Celtics saiu de um time individualista para aquilo que é tradição na franquia celta: a coletividade de um jogo de movimento, com peças individuais em altas prateleiras e que são capazes de facilitar a vida dos companheiros.

A fase de Jayson Tatum, que faz com que ele entre de vez na conversa para MVP é impulsionada por um time entrosado, que se faz jogar com consistência e consciência. As vantagens que escorriam das mãos, hoje, se constroem com facilidade. Os momentos de abatimento e apagão sumiram e, quando há vantagens encolhendo, o time rapidamente retoma as rédeas. O Celtics tem o melhor basquete da NBA porque se propôs a retomar o seu jogo coletivo calcado nas potencialidades de suas peças, que executam com perfeição o plano de Ime Udoka.