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Despachantes são necessários? Justiça põe futuro da profissão em xeque

Sem uma regulamentação efetiva em nível federal, despachantes seguem leis estaduais que têm sido derrubadas pelo STF - Shutterstock
Sem uma regulamentação efetiva em nível federal, despachantes seguem leis estaduais que têm sido derrubadas pelo STF Imagem: Shutterstock

Paula Gama

Colaboração para o UOL

16/09/2021 04h00Atualizada em 16/09/2021 09h25

Quem tem carro já deve ter recorrido em algum momento aos serviços de um despachante, profissional que encaminha e faz tramitar documentos, vistorias e outros procedimentos relacionados a veículos nos Detrans (Departamentos Estaduais de Trânsito).

Até hoje, a profissão não é regulamentada detalhadamente em nível federal e cada Estado tem definidas quais atividades específicas os respectivos despachantes podem exercer. Contudo, o STF (Supremo Tribunal Federal) tem deferido ADIs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) que anulam, em diversas unidades da Federação, os efeitos das leis estaduais que regem a função.

O argumento é de que essas leis invadem a competência da União para legislar sobre direitos e condições para exercício da profissão. A maior parte dessas ações foi ajuizada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.

Já foram deferidas ADIs no Distrito Federal, Tocantins e Bahia, propostas por Aras; e no Rio Grande do Sul e Alagoas, ajuizadas, respectivamente, pela Confederação Nacional de Comércio de Bens, Serviços e Turismo e pelo próprio governador de Alagoas, Renan Filho (MDB). O STF ainda vai julgar ações semelhantes para Ceará, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Norte e Santa Catarina.

Projeto de lei sobre despachantes tramita desde 2019

Vistoria - Shutterstock - Shutterstock
No Paraná, por exemplo, despachantes são autorizados a fazer vistoria e emplacamento de veículo
Imagem: Shutterstock

Augusto Aras argumenta que a regulamentação da profissão depende de prévia edição de lei complementar federal, que até o momento não foi editada. Tramita no Senado Federal o Projeto de Lei 2.022/2019, que trata da matéria. Enquanto isso, a incumbência de fiscalizar o exercício da profissão de despachante é do CFDD (Conselho Federal dos Despachantes Documentalistas do Brasil).

Isso significa que, nos locais onde as leis estaduais estão invalidadas e enquanto o projeto de lei não for votado e sancionado, a profissão segue regulamentada apenas pela lei 10.602/2002, que é ampla e, basicamente, define que despachantes não podem realizar ofícios da competência de profissionais de outras áreas.

Para Felipe Brugg, diretor da Fenadesp (Federação Nacional dos Despachantes de Trânsito), a invalidação das leis estaduais corta o cordão umbilical que une os despachantes ao Estado.

"As leis estaduais estabelecem várias prerrogativas para o despachante perante o Estado. O problema maior será em unidades da Federação em que o profissional tem maior autonomia, como o Paraná, onde o despachante pode fazer vistorias e dar andamento a processos", explica.

Já o presidente do CFDD, Osnildo Osmar Silveira, argumenta que as atividades continuam, mas agora serão regulamentadas. Para o conselho, as decisões do STF estão corretas.

"Não cabe aos Estados regulamentar uma profissão e sim à União, através do Congresso Nacional. O mais importante nesse cenário é que temos um Projeto de Lei adiantado em andamento e que atende as demandas da categoria e dará mais segurança aos profissionais, assim como critérios e prerrogativas únicas para todos os entes da Federação", avalia Osnildo.

Segundo ele, um dos principais pontos positivos do PL é a criação de um curso de tecnólogo como pré-requisito para o exercício da profissão.

"É claro que só valerá para os novos profissionais, mas isso dará mais qualidade ao trabalho", comemora.

Meta é dar mais autonomia ao cidadão, dizem Detrans

Por meio de nota, a AND (Associação Nacional dos Detrans) afirma que os departamentos estão empenhados em simplificar os processos para que a população tenha mais autonomia em relação aos procedimentos burocráticos relacionados a veículos.

"A AND informa que os Detrans estão empenhados em tornar os processos de sua prestação de serviço cada vez mais simples, menos burocráticos e mais digitais, a fim de que o cidadão possa resolver suas obrigações por conta própria", diz a associação, ao ser questionada por UOL Carros.

"No entanto, a AND entende que os despachantes são profissionais que colaboram no atendimento e prestam um bom serviço à população. Inclusive, há condutores que preferem contratar o trabalho de despachantes. De qualquer forma, não cabe à AND nem aos Detrans se posicionarem sobre um tema que não é de sua competência, mas sim dos Estados que têm suas peculiaridades próprias em exercer sua política de trânsito", complementa a AND, comandada por Ernesto Mascellani Neto, diretor-presidente do Detran-SP.

Profissão ou atividade?

Enquanto o Conselho Nacional se posiciona a favor do cancelamento das leis estaduais, a Fenadesp, que representa despachantes, discorda e se diz mobilizada pela anulação das decisões do Supremo. Para o presidente da federação, Everton Calamucci, "há um erro no entendimento do STF", pois o trabalho de despachante, segundo ele, é uma atividade remunerada e não uma profissão.

"Existe uma classificação brasileira de ocupações que define que regulamentações de profissões são de competência da União, enquanto os Estados podem legislar sobre atividades remuneradas, que é o caso dos despachantes que atuam nos Detrans estaduais. O grande problema de uma única lei nacional é não atender as necessidades específicas de cada Estado", opina.

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