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Kelly Fernandes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

No transporte coletivo, o que vem primeiro: a oferta ou a demanda?

Colunista do UOL

15/07/2022 04h00

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A resposta para essa pergunta certamente não é fácil. Porém, é consenso que a discussão sobre oferta e demanda esbarra no preço das tarifas de transporte, alicerce que mantém o sistema em operação na imensa maioria das cidades.

Os preços praticados impactam diretamente no número de pessoas que utilizam o sistema, sobretudo em meio ao contexto atual de aumento do trabalho informal, crescimento do índice de desemprego e crescimento da frota de motocicletas. E isso sem entrar em detalhes sobre os impactos causados pela pandemia de covid-19, que fez despencar a quantidade de deslocamentos realizados em ônibus, trens, metrôs etc.

Com menos pessoas utilizando as redes de transporte coletivo, respostas diferentes foram apresentadas pelos governos que, por vezes, optaram pela redução da oferta, isto é, do número de ônibus e vagões em circulação; pelo aumento da tarifa e/ou pela redução de tributos que incidem sobre combustíveis fósseis, a fim de conter aumentos no preço do diesel. Ambas medidas não necessariamente repercutem no aumento da demanda pelo sistema, no máximo contribuem para a manutenção dos parâmetros atuais.

O efeito do reajuste das tarifas é a redução da vantagem competitiva que o transporte coletivo costuma apresentar frente ao transporte individual motorizado (carros e motos) e o transporte por aplicativos, ou seja, o preço baixo, deixando esse mais vantajoso para trajetos curtos e compartilhados.

Em um outro polo, existem experiências que procuram enfrentar problemas similares com soluções opostas, o que significa reduzir o preço das tarifas de maneira drástica. A exemplo, a Alemanha implementou o que vem sendo chamado de 9-euro, que permite que a pessoa utilize o sistema de trilhos e ônibus durante um mês inteiro, quantas vezes quiser, por um ticket único de ?9 ($9.60).

Em reais, esse valor representaria pouco mais de R$ 50. Uma medida como essa, sem fazer nenhum tipo de ponderação entre as diferentes realidades econômicas e salariais, provavelmente reduziria expressivamente os custos com transporte coletivo em muitas das cidades latino-americanas.

Segundo matéria publicada no portal de notícias alemão DW, essa redução no preço das tarifas, iniciada em junho deste ano causou o aumento do número de pessoas que utilizam o sistema diariamente, inclusive, trazendo para o sistema aquelas que não estão habituadas a utilizar transporte coletivo para trabalhar, fazer compras ou passear aos finais de semana. Situação que acabou gerando uma demanda extra para as pessoas que trabalham na operação do sistema, que precisaram fazer adaptações de última hora no sistema operado pela empresa de transporte Deutsche Bahn.

De acordo com informações divulgadas nessa matéria, o aumento da quantidade de usuários e usuárias é vista com preocupação por pessoas que trabalham na operação, temerosas com a possível lotação excessiva de ônibus e vagões. Importante mencionar que, com o ticket, é possível acessar os sistemas ônibus, bondes, metrôs, VLT, trens expressos regionais e regionais.

Além disso, essa medida em implementação na Alemanha possui um caráter socioambiental, uma vez que é uma resposta à elevação dos custos com deslocamento induzidos pelo aumento crescente de derivados de petróleo. Todavia, possibilita desdobramentos que podem contribuir para a redefinição do papel que os sistemas de transporte ocupam para o enfrentamento da crise climática e de geração de energia, intensificada após a Guerra na Ucrânia.

Nesse sentido, tal projeto aponta um caminho a ser seguido por outros países que pretendem reduzir a dependência de combustíveis fósseis através de soluções social e ambientalmente mais justas. Fiquemos atentos a esses desdobramentos.

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