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Kelly Fernandes

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Câmara discute menor punição para quem estacionar em faixas e ciclovias

Carro é flagrado estacionado em cima de ciclovia no Rio de Janeiro; deputados federais analisam proposta de abrandar punição a motoristas - Arion Marinho/Parceiro/Agência O globo
Carro é flagrado estacionado em cima de ciclovia no Rio de Janeiro; deputados federais analisam proposta de abrandar punição a motoristas Imagem: Arion Marinho/Parceiro/Agência O globo

Colunista do UOL

21/05/2021 04h00

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No meio do caminho tinha um carro/Tinha um carro no meio do caminho/Tinha um carro no meio da calçada/No meio da ciclofaixa e da faixa exclusiva para ônibus/ Tinha um carro/ No meio da faixa de pedestres tinha um carro.

Mesmo carros e motos sendo detentores de aproximadamente 80% da infraestrutura viária das cidades, sempre tem um carro no meio do caminho. E isso ocorre a despeito de o CTB (Código de Trânsito Brasileiro) enquadrar o estacionamento e a parada de veículos em áreas exclusivas para pedestres e ciclistas como infração grave.

Agora imaginem se a lei ficar ainda mais branda em relação às infrações de motoristas? Pois é o que define o Projeto de Lei 700/21, proposto pelo deputado federal Carlos Bezerra (MDB-MT), cujo objetivo é reduzir a penalidade para motoristas que deixarem o seu carro no meio do caminho de pedestres e ciclistas.

De acordo com a legislação de trânsito atual, ao cometer uma infração grave, o condutor ou a condutora paga uma multa de R$ 195,23 e recebe cinco pontos na carteira de motorista. Já em caso de infração média, a multa é de R$ 130,16 e são acrescentados quatro pontos na carteira.

Apesar de atualmente serem configuradas como infrações graves, é muito comum encontrar carros estacionados em locais destinados a pedestres e ciclistas, para quem resta apenas desviar dos veículos, mesmo com o risco de sofrer um atropelamento.

É importante ressaltar que a medida avança em pleno Maio Amarelo, mês que propõe dedicar atenção à violência no trânsito; mês quando, em tese, a sociedade - principalmente o poder público -, deveria estar debruçada sobre o tema da segurança viária em busca por alternativas e soluções para tornar as cidades brasileiras mais seguras.

A fuga do estacionamento pago, a ausência de garagem ou vagas, a rua estreita e outros tantos motivos, muitas vezes, são utilizados como justificativa por motoristas para estacionar o carro na calçada. Mas há também as calçadas que são incorporadas por estabelecimentos comerciais, transformando-as em extensões do negócio ao utilizá-las como estacionamentos ou oficinas. Ou seja, monetizam um bem público para lucro individual.

Também não podemos nos esquecer das paradas, que, segundo o CTB, são definidas com a imobilização dos veículos pelo tempo necessário para realizar o embarque ou o desembarque de pessoas.

Se para alguns motoristas essas paradas são vistas como algo muito corriqueiro, para quem está pedalando, por exemplo, é algo não previsto e que pode significar um transtorno desnecessário ou até mesmo um atropelamento - uma vez que retira sua prioridade adquirida por direito.

Aliás, é recente - mais especificamente, a data de abril de 2021 - a inclusão de pena de multa remetida às pessoas que param veículos em infraestruturas destinadas para quem pedala, como ciclovias e ciclofaixas.

Segundo informações retiradas da Agência Câmara de Notícias, o projeto proposto pelo deputado Carlos Bezerra tramita em caráter conclusivo e será analisado pelas comissões de Viação e Transportes e de Constituição e Justiça e de Cidadania. O projeto uniu-se ao desmonte da legislação de trânsito brasileira que, durante os últimos anos, aumentou os benefícios para motoristas infratores - a despeito de pessoas que optam por meios de transporte ativos e coletivos, os mais utilizados pela população das cidades brasileiras.

Mais uma vez, o Governo Federal opta por atropelar tudo que foi construído ao longo das duas últimas décadas, que já não era nada além de uma mínima proteção aos direitos básicos, expondo quem mais precisa ser protegido no trânsito.

Imagino que você, ainda que tenha um veículo próprio, também seja pedestre ou vivencie a cidade por outros meios que não o automóvel. Portanto, tenho certeza de que já experimentou a importuna presença do carro ameaçando o seu caminhar.

Então, nunca se esqueça: quando estiver atrás de um volante ou votando por um projeto de lei, que você pode ser a pedra no caminho de alguém.