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Quarentena pode agravar quadro de quem sofre de transtornos alimentares

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Imagem: iStock

29/04/2020 14h46

Diminuição das interações sociais, saídas de casa reduzidas, angústia, estoques de alimentos a serem gerenciados. Pessoas que sofrem de transtornos alimentares passam pelas mesmas dificuldades que todos os que estão submetidos à quarentena durante a pandemia de coronavírus.

No entanto, esses problemas que se tornaram comuns no dia a dia de vários países podem agravar o quadro de indivíduos que lidam com distúrbios como a anorexia e a bulimia.

"Os distúrbios alimentares são transtornos que têm uma grande dimensão psicológica. A quarentena implica em mais stress para quem sofre com esses problemas", afirma a pedopsiquiatra Nathalie Godart, presidente da Federação Francesa Anorexia Bulimia.

Na França, entre 6% e 10% da população enfrenta esse tipo de distúrbio. Segundo a especialista, eles podem ser divididos em três tipos: a anorexia, caracterizada pelo controle drástico de ingestão de alimentos; a bulimia, caracterizada pela ingestão de grandes quantias de alimentos seguida de mecanismos compensatórios para a perda de peso, como indução de vômito; e a hiperfagia, que é ingestão exacerbada de comida devido ao stress e a quadros de depressão.

Segundo Godart, as reações durante a quarentena podem variar de acordo com o transtorno. "As pessoas que sofrem de anorexia, podem tentar limitar ainda mais a ingestão de alimentos durante o confinamento, quando a possibilidade de realizar uma atividade física é reduzida. Já as pessoas com impulso de comer podem limitar seu estoque de alimentos de maneira obsessiva para ter apenas o mínimo de comida. E esse gerenciamento dos alimentos em um lugar fechado, sem a possibilidade de sair e de socializar, pode virar um pesadelo", observa a pedopsiquiatra.

Sozinhos diante a geladeira ou da balança, a situação dos indivíduos que enfrentam esse tipo de transtorno também pode ser agravada no meio familiar. "Durante a quarentena, esses distúrbios serão mais visíveis para os parentes que, muito provavelmente, vão tentar intervir. Essa iniciativa pode ser mais problemática do que positiva, sobretudo se essas observações terminarem em briga", afirma Godart.

A especialista descreve cenários comuns para os diferentes distúrbios alimentares. Para as pessoas que sofrem de anorexia, durante as refeições em família, por exemplo, a pedopsiquiatra afirma que o problema será a aceitação do olhar dos outros sobre seus hábitos. "Por isso, esses indivíduos vão tentar comer a mesma quantidade que os outros. Tudo isso pode ser motivo de tensão extra na preparação da comida, no momento das compras, e pode resultar em bloqueios suplementares. O resultado é que essas pessoas terão ainda mais dificuldade para comer".

Já as pessoas que sofrem com excessos alimentares, a tendência é viver o período da quarentena com vergonha de seus comportamentos. Nesses casos, segundo a especialista, é bem provável que esses indivíduos se isolem ainda mais e tentem se esconder para viver momentos de crise.

Serviço Nacional contra Anorexia e Bulimia

Prova que os transtornos alimentares foram agravados durante a quarentena na França é que o Serviço Nacional contra Anorexia e Bulimia - através do qual as pessoas podem consultar especialistas gratuitamente por telefone - recebe atualmente 20% a mais de ligações.

A coordenadora deste serviço, Annick Brun, percebeu outra mudança. Normalmente são pais ou parentes da pessoa que sofre de transtornos alimentares que acionam este suporte. Atualmente, são os próprios doentes que telefonam em busca de informações. Muitos se dizem angustiados com o confinamento e ameaçados pelo coronavírus, já que os distúrbios alimentares fragilizam o sistema imunitário e a obesidade é um fator de risco severo à Covid-19.

Godart enumera algumas dicas para quem sofre de transtornos alimentares e está em confinamento. "É preciso realizar refeições regularmente e não deixar de se alimentar, que isso é o que intensifica os transtornos. Também é preciso ter uma boa higiene de vida, manter um ritmo. Tentar tomar um pouco de sol e dormir corretamente porque problemas com o sono pioram os distúrbios alimentares", recomenda.

A pedopsiquiatra também aconselha que a atividade física seja "limitada, adaptada e que não represente riscos".

"Não é possível ser rígido em todos os aspectos práticos da vida durante a quarentena. É preciso que cada um avalie sua situação e, se essa pessoa é acompanhada por uma equipe, a recomendação é acionar esse suporte sempre que necessário para gerenciar os eventuais problemas", conclui.