Terapeutas de casais expõem questões mais recorrentes nos consultórios

Todos nós almejamos a sorte de um amor tranquilo. Mas assim como eternizado nos versos de Cazuza, os relacionamentos inevitavelmente transitam entre o céu e o inferno, esbarrando por vezes na monotonia.

Nos altos e baixos da jornada, muitos casais se veem diante de desafios que parecem insuperáveis. Comunicação falha, conflitos persistentes e falta de intimidade podem criar fissuras que parecem impossíveis de serem reparadas. Nesse cenário, a terapia de casal oferece uma luz no fim do túnel. Segundo um estudo publicado em 2011 no periódico Journal of Marital and Family Therapy, essa abordagem demonstra resultados positivos para aproximadamente 70% dos cônjuges que participam das sessões.

O engenheiro de materiais Gustavo Jordão, 40, inicialmente via a terapia como um tabu e resistiu por um tempo antes de aceitar a sugestão de sua então esposa. "Fui surpreendido positivamente, pois a terapeuta atuou como uma mediadora imparcial, mantendo a conversa em um nível diplomático. No final, identificamos que havia muitas incompatibilidades, o que culminou no divórcio. No entanto, o término foi conduzido de forma respeitosa graças à terapia", conta.

Mesmo relacionamento não dando certo, Gustavo Jordão disse que terapia ajudou até no processo do divórcio
Mesmo relacionamento não dando certo, Gustavo Jordão disse que terapia ajudou até no processo do divórcio Imagem: Arquivo pessoal

A abordagem também ajudou o casal Gabriela Chagas, 40, e André Moreira, 37. No início da pandemia de covid-19, em 2020, ambos viram os conflitos se intensificarem e tomaram a decisão de buscar ajuda.

"Foi um divisor de águas, e ainda hoje recordamos as palavras e os progressos que alcançamos. Quando surgem dificuldades, conseguimos pausar, respirar fundo e realinhar nossos propósitos", afirmam.

De acordo com a psicóloga Larissa Castelo, embora a terapia de casais seja indicada para resolução de problemas, ele pode ser útil em qualquer fase do relacionamento.

Razões que levam casais à terapia

De acordo com o psicanalista Carlos Rosa, a falta de comunicação é uma das questões mais recorrentes nos consultórios. Muitas vezes, os parceiros podem sentir que não são ouvidos ou compreendidos, levando a ressentimentos e à distância emocional.

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Na terapia, ensinamos técnicas de comunicação assertiva para que ambos os parceiros possam expressar seus sentimentos e necessidades de forma respeitosa e compreensiva. Carlos Rosa, professor de psicopatologia clínica da UFT (Universidade Federal do Tocantins)

Além da comunicação ineficiente, outros temas aparecem com frequência nos consultórios. A seguir, destacamos quais são eles e como superá-los:

Problemas sexuais: a frequência, falta de desejo e as disfunções sexuais frequentemente se tornam fontes de tensão e frustração dentro do relacionamento. Para a terapeuta de casais Lúcia Soares, educação repressora, questões religiosas e tabus muitas vezes impedem, especialmente as mulheres, de desfrutarem plenamente de uma sexualidade prazerosa. Ela enfatiza a importância de investigar possíveis causas médicas por trás das queixas dos casais e recomenda uma abordagem de psicoeducação sexual, que visa explicar conceitos fundamentais sobre sexualidade, prazer e comunicação dos desejos e fantasias pessoais. Uma boa estratégia para aquecer o relacionamento, segundo Soares, é usar de filmes mais erotizados.

Nós temos que estimular o erotismo, porque é normal que as demandas de casa, filho e trabalho acabem esfriando a relação. Lúcia Soares, especialista em sexualidade humana pela Unicap (Universidade Católica de Pernambuco) e professora da Faculdade Esuda

Divergências financeiras: as finanças são causa comum de conflito para muitos casais, especialmente quando há diferenças na maneira de gastar, economizar ou investir dinheiro. Os terapeutas indicam que o par tenha conversas abertas e honestas sobre a situação financeira, identificando os problemas e de que forma eles podem trabalhar para superar. Também é necessário discutir hábitos e prioridades, criando metas e planos para o futuro.

Gabriela Chagas e André Moreira buscaram ajuda durante pandemia
Gabriela Chagas e André Moreira buscaram ajuda durante pandemia Imagem: Arquivo pessoal
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Problemas de parentalidade: a chegada dos filhos demanda uma reorganização da casa e da família. Nesse momento, é comum que os casais se percam em seus papéis: o homem reclama que foi abandonado e a esposa, sobrecarregada. Além disso, pensamentos divergentes de como criar os filhos também costumam levar a crises. A dica é fazer uma lista do que cada um considera importante, chegando a um consenso sobre valores que devem ser ensinados a eles. Os terapeutas também recomendam que os pais dividam as responsabilidades quanto a esse filho e reservem momentos para nutrirem sua relação como casal. A terapeuta sexual Carla Cecarello, mestre em saúde pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), afirma que muitos casais negligenciam a importância de dedicarem tempo um ao outro. "Recomendo que eles tenham um dia para se curtirem, irem ao cinema, andar de mãos dadas", sugere.

Traição: reconstruir a conexão perdida por mentiras ou traições requer tempo e dedicação, dizem os especialistas. Se o casal está disposto a seguir em frente e se perdoar, é preciso entender o percurso que antecedeu a traição ou a falta de confiança e se decorrem de aspectos transgeracionais apreendidos e internalizados, angústias, desejos não satisfeitos, entre outros. Também é indicado que o cônjuge expresse suas mágoas e inseguranças e que, juntos, estabeleçam limites saudáveis para ambos.

Ciúmes e falta de confiança: o ciúme, muitas vezes interpretado como um sinal de amor, pode prejudicar a qualidade do relacionamento quando se manifesta em excesso, resultando em uma dinâmica baseada no controle do parceiro. É crucial analisar se esse sentimento é motivado por comportamentos específicos do parceiro ou se decorre de inseguranças pessoais. Em casos de ciúme exacerbado, os especialistas indicam a terapia individual como forma de o cônjuge entender as causas subjacentes ao ciúme.

Nos dias de hoje, é comum que casais compartilhem suas senhas de celular, porém, acho importante preservar a individualidade de cada um, para que a relação seja fundamentada na confiança mútua. Lúcia Soares, especialista em sexualidade humana

Intromissão de familiares: de conselhos não solicitados a intromissões diretas nas decisões do casal, os sogros, ou mesmo outro familiar, podem atrapalhar a relação do casal. Diante desse cenário, os especialistas recomendam que o casal estabeleça limites claros sobre o que é aceitável e até onde permitem a participação da família do outro na dinâmica familiar. Além disso, é crucial que os cônjuges reconheçam que as diferenças familiares são naturais, e que cada família tem suas próprias dinâmicas e valores.

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