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Consumir fígado de boi pode fazer mal por causa de toxinas presentes nele?

Priscila Barbosa
Imagem: Priscila Barbosa

Renata Turbiani

Colaboração para VivaBem

04/04/2023 04h00Atualizada em 04/04/2023 10h09

A humanidade pode ser dividida em dois grupos: os que adoram comer fígado e os que detestam. Bastante controverso, o alimento gera ainda mais debates porque muita gente acredita que é nele que as toxinas do corpo (dos animais, neste caso) ficam armazenadas, o que tornaria o seu consumo perigoso à saúde. Mas será que isso é verdade?

Para alegria dos fãs da iguaria, a resposta é não. Ao contrário da crença popular, o fígado não é um órgão que armazena elementos prejudiciais. O que ele faz na realidade, dentre outras funções importantíssimas, é processar esses elementos, a fim de desintoxicá-los.

O processo funciona da seguinte forma: tudo o que é consumido pelo bicho (boi, galinha, porco etc.), seja alimento, veneno ou remédio, passa primeiro pelo trato gastrointestinal e, depois, vai através do sangue para o fígado, onde as células locais fazem a metabolização e a inativação das substâncias necessárias.

Na sequência, o sangue já "filtrado" é enviado para o coração e distribuído pelo corpo, e os materiais que não são necessários para o organismo são eliminados através das fezes e da urina.

Mas, atenção, todo esse complexo mecanismo só ocorre como deve se o animal estiver em perfeitas condições de saúde e não for exposto com frequência a poluentes ambientais e resíduos industriais ou for sobrecarregado com antibióticos, vacinas, hormônios, drogas, água ou alimentos contaminados com metais pesados como alumínio, chumbo e cádmio e grãos geneticamente modificados.

Sob essas condições, o seu fígado pode sofrer e não dar conta da desintoxicação e aí, quando o alimento vai para o mercado ou o açougue, há o risco de apresentar excesso de algumas toxinas. Diante disso, é fundamental fazer a compra em locais de confiança e, de preferência, de produtos que sejam oriundos de criadores orgânicos.

Alertas para a ingestão de fígado

O fígado, quando a saúde e o cuidado com o animal estão na mais perfeita ordem, não armazena toxinas, como mostramos, mas serve de depósito para muitos nutrientes importantes para o bom funcionamento do organismo.

Dentre eles estão vitaminas A e do complexo B, ferro e proteínas de alta qualidade, que ajudam a diminuir inflamações, produzir aminoácidos, prevenir anemia, fortalecer o sistema imunológico e a visão e manter a integridade da pele.

Todos esses benefícios tornam o alimento extremamente saudável para o ser humano, porém, há algumas ressalvas em relação ao seu consumo. A primeira delas é para quem tem colesterol alto, cardiopatias que exigem o controle de gordura no sangue ou risco aumentando para o desenvolvimento de doenças do coração.

A explicação para isso é que o fígado contém altas taxas de colesterol, já que uma de suas funções é produzir esse elemento. Por exemplo, 100 gramas de fígado de boi cru têm quase 400 miligramas de colesterol, e a recomendação das principais organizações de saúde é o consumo de menos de 200 miligramas por dia para pessoas adultas.

Outro alerta é para quem tem sofre de gota e outras patologias causadas pelo excesso de ácido urico no sangue. O fato é que o fígado é rico em purina, substância que, quando metabolizada, forma justamente o ácido úrico.

Além disso, há relatos —apesar de faltarem evidências científicas— sobre a vitamina A, de que, quando consumida em quantidades exageradas, pode ser tóxica, causando sonolência, dores de cabeça e nas articulações e vômito. No caso das grávidas, ainda pode ser prejudicial para o desenvolvimento do feto, especialmente durante o primeiro trimestre de gestação.

Pelos dados da TBCA (Tabela Brasileira de Composição de Alimentos), um bife de 100 gramas de fígado bovino cru tem 7.937 microgramas do nutriente, e o consumo diário ideal é de 900 mcg para homens adultos e 700 mcg para mulheres adultas.

Como e quanto consumir de fígado

As especialistas consultadas por VivaBem são unânimes em afirmar que o fígado pode ser consumido por qualquer pessoa, mesmo as que têm colesterol alto, doenças cardíacas ou gota —nestas condições, desde que o médico responsável pelo acompanhamento não imponha restrições.

Segundo elas, o importante é apenas ter cuidado com o consumo excessivo. A recomendação é entre 100 g e 250 g por semana e como parte de uma dieta equilibrada.

Quanto à forma de consumo, para evitar contaminação, o alimento não deve ser ingerido cru. Ao invés disso, deve ser cozido, frito ou grelhado.

Importante também é escolher bem a carne, que deve ser sempre fresca. Neste sentido, deve-se observar se tem coloração escura (amarronzada) e brilho. Caso a aparência seja opaca e em um tom amarelado, não compre, não prepare e não coma.

Fontes: Auzelivia Rego, gastroenterologista, hepatologista e professora da disciplina de doenças do trato gastrointestinal dos cursos de medicina da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) e da UnP (Universidade Potiguar); Luciana Setaro, professora doutora do curso de nutrição e coordenadora de pós-graduação em nutrição esportiva e wellness do Centro Universitário São Camilo (SP); Manuela Dolinsky, professora associada do Departamento de Nutrição e Dietética da Faculdade de Nutrição da UFF (Universidade Federal Fluminense) e diretora do CFN (Conselho Federal de Nutricionistas); e Renata Cintra, professora do Departamento de Ciências Humanas e Ciências da Nutrição e Alimentação do Instituto de Biociências - campus de Botucatu - da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo).