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Proibido, cigarro eletrônico pode causar infarto e síndrome coronariana

Divulgação/Sinagências
Imagem: Divulgação/Sinagências

De VivaBem, em São Paulo

27/03/2022 11h45

Apesar de proibido no Brasil, o cigarro eletrônico —ou vape— já está na quarta geração e seu uso vem crescendo em ambientes de festa, bares e restaurantes, principalmente por jovens. Seus efeitos na saúde já são comprovados. O equipamento gera partículas ultrafinas que conseguem ultrapassar a barreira dos alvéolos pulmonares e ganhar a corrente sanguínea, fazendo o corpo reagir com uma inflamação.

"Muitas vezes, quando a inflamação acontece na parede do endotélio, que recobre as artérias, ele pode ser lesionado e deflagrar eventos cardiovasculares agudos, como infarto e síndrome coronariana aguda. A nicotina também tem influência no coração, porque aumenta a frequência cardíaca e a pressão arterial", explica Jaqueline Scholz, especialista da SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia) em ações contra o tabagismo.

A síndrome coronariana é um conjunto de sinais e sintomas relacionados à obstrução de uma artéria coronária que pode ser causada por um infarto ou por uma angina instável. É sempre uma emergência médica.

Os cigarros eletrônicos expõem o organismo a uma variedade de elementos químicos gerados de formas diferentes. Uma pelo próprio dispositivo (nanopartículas de metal). A segunda tem relação direta com o processo de aquecimento ou vaporização, já que alguns produtos contidos no vapor de cigarros eletrônicos incluem carcinógenos conhecidos e substâncias citotóxicas, potencialmente causadoras de doenças pulmonares e cardiovasculares.

O efeito protetivo que se imaginava que o cigarro eletrônico pudesse ter, não se confirma. Em países que adotaram esses produtos, há um crescente aumento de eventos cardiovasculares na população abaixo de 50 anos.

Antes da pandemia de covid-19, os Estados Unidos registraram 2.800 internações e 68 óbitos de jovens, 70% deles tinham menos de 34 anos de idade. Eles foram diagnosticados com a síndrome chamada Evali, sigla em inglês para doença pulmonar associada ao uso de produtos de cigarro eletrônico.

Hoje, sabe-se que a mistura que mais causa Evali é composta por vitamina E, THC (principal componente ativo da maconha) e nicotina. Em 30% dos usuários, a utilização somente da nicotina já foi capaz de causar a doença.

"Diferentemente do cigarro convencional, que demora às vezes 20 ou 30 anos para manifestar doenças no usuário, o cigarro eletrônico, que prometia segurança, foi capaz de matar jovens rapidamente", aponta Scholz.

Vale lembrar que o narguilé é diferente, pois é um tabaco que sofre combustão, aquecido com carvão. No entanto, também é uma substância que traz danos à saúde, além do risco de contaminação ao ser compartilhado entre os usuários.

Estudos

Quando os vapes surgiram, as pessoas faziam uso bidual, ou seja, eram fumantes de cigarro convencional e também do eletrônico, utilizando um ou outro em caso de restrições ou na tentativa de fazer a migração.

Já na terceira e quarta gerações dos vapes, chama atenção o aumento do número de usuários exclusivos, ou seja, pessoas que não fumavam o convencional. Isso fez com que as evidências em relação aos seus efeitos ficassem mais claras de serem analisadas.

Estudo do Inca (Instituto Nacional de Câncer) também aponta para os riscos de iniciar o consumo de cigarros a partir do uso de cigarros eletrônicos. O artigo, feito por pesquisadores da Coordenação de Prevenção e Vigilância do órgão, foi aceito para publicação na revista Ciência & Saúde Coletiva, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva.

O uso de cigarro eletrônico aumenta em mais de três vezes o risco de experimentação de cigarro convencional e mais de quatro vezes o risco de uso do cigarro, segundo a pesquisa.

A iniciação do uso do cigarro convencional, a partir do uso do cigarro eletrônico, pode ser explicada pelo fato de que cigarros eletrônicos contendo nicotina podem levar à dependência dessa substância e à procura por outros produtos de tabaco, aponta a médica epidemiologista Liz Almeida, coordenadora de Prevenção e Vigilância do Inca. "Além disso, a utilização do dispositivo eletrônico repete os comportamentos de uso do cigarro convencional, como os movimentos mão-boca, inalação e expiração."

Segundo a SBC, já há estudos que indicam que os vapes podem levar substâncias cancerígenas para a bexiga, gerar disfunção endotelial, aumento do risco cardiovascular, além de piorar e desencadear asma brônquica.

"Ainda vai levar um tempo para avaliar se podem, de fato, causar câncer, já que envolve alterações genéticas, mas só o fato de saber que tem substância cancerígena já é um alerta", explica a especialista da SBC.

Mas eles são efetivos para ajudar as pessoas a pararem de fumar? Não. Aquelas que passaram a usar o cigarro eletrônico continuaram dependentes da nicotina. O percentual de indivíduos que utilizam o produto e conseguem largá-lo definitivamente é igual ao daqueles que tentam parar de fumar sem usar outro método: 3% a 5%.

"Isso é muito preocupante, pois além do risco para a saúde individual, o uso do vape pode colocar a perder os resultados já alcançados pela campanha antitabaco no Brasil. Em outros países, a taxa de fumantes chega a 25%, mas aqui chegamos a 10%, com muito sacrifício", conta Scholz.

Para ela, do ponto de vista de engrandecimento humano, civilizatório, não há nenhuma vantagem no uso dos cigarros eletrônicos, pelo contrário. "É um equívoco enorme pensar em liberar esse produto", enfatiza a especialista da SBC.

Combate ao uso

A RDC nº 46 da Anvisa, de 2009, proíbe a comercialização, a importação e a propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar. Cabe à sociedade como um todo fazer cumprir a resolução.

Os pais precisam perguntar aos filhos se estão usando os vapes e explicar que são proibidos e não fazem bem à saúde, que podem gerar dependência, além do gasto econômico. "Nós, da Sociedade Brasileira de Cardiologia, enquanto uma entidade líder no esclarecimento para a população, na assistência do que a cardiologia pode oferecer de melhor, estamos fazendo a nossa parte na conscientização", destaca a especialista.

Ela lembra que circulou recentemente uma fake news demonstrando que o produto é legal, mas a verdade deve ser esclarecida. "Os colégios precisam fazer campanhas educativas alertando, mostrando dados, convocando professores e convidando psiquiatras para palestrar. Os jovens são vulneráveis a todos os tipos de drogas, que podem modificar a capacidade cerebral, desencadeando, no futuro, depressão, ansiedade, doenças e instabilidades emocionais", ressalta.

Para Jaqueline Scholz, o que torna o ser humano feliz é a interação social, não a droga. "A droga foi inserida nesse contexto como se fosse capaz de promover a interação entre as pessoas, mas é o contrário. Isso precisa ser bem trabalhado, porque estamos vendo crescer uma geração de pessoas adictas em tudo: álcool, maconha e cigarro eletrônico", finaliza.