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Equilíbrio

Cuidar da mente para uma vida mais harmônica


Pandemia é um período propenso à paranoia; saiba identificar e como lidar

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Simone Cunha

Colaboração para o VivaBem

23/08/2021 04h00

Resumo da notícia

  • Estamos em um período propenso à paranoia, afinal a pandemia potencializa a sensação de medo e desconfiança
  • Ser mais desconfiado difere daqueles que passam a ter um julgamento da realidade dentro de uma distorção psicótica
  • Sintomas paranoicos podem levar a variados graus de prejuízo no relacionamento interpessoal e social

Pensamentos paranoicos fazem parte da experiência humana e podem ser mais comuns em momentos de extremo estresse. Por isso, vivemos um período propenso a paranoia, afinal a pandemia tende a potencializar a sensação de medo e desconfiança. A incerteza em todos os níveis, o risco de adoecimento e de morte, a solidão e o sentimento de desamparo nos colocam uma carga excessiva de tensão.

"O cérebro interpreta esse momento como de perigo iminente e aciona as estratégias psicológicas, com isso nossos fantasmas interiores se manifestam e a situação é tão desafiadora que tem afetado até o mais convicto dos otimistas", comenta o psiquiatra Rodrigo Leite, coordenador dos Ambulatórios do Instituto de Psiquiatria (IPq) da Universidade de São Paulo.

Um nível de desconfiança protetivo é natural e necessário. A paranoia se tornou um termo até comum na linguagem popular, indicando um indivíduo desconfiado em excesso —aquele que se sente ameaçado de alguma forma ou acredita que estão olhando ou falando dele mesmo que haja evidências de que isso não é real. O problema é quando tudo isso é sentido com muita intensidade e de forma constante, o pode indicar algum tipo de doença.

Ser mais desconfiado que o habitual é quase uma distorção psicótica. "Nestes, a barreira da desconfiança ultrapassa a realidade, precisando do auxílio de um tratamento psiquiátrico", diz Maria Francisca Mauro, mestre em psiquiatria pelo Programa de Pós-Graduação em Psiquiatria e Saúde Mental do Instituto de Psiquiatria da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

Quando a paranoia é doença

Uma pessoa pode apresentar pensamentos paranoides por um período e, em outro momento, reduzir essa sensação. Porém, quando a causa da paranoia é uma doença, essa situação se torna mais difícil e de controle mais desafiador.

"A paranoia pode ser uma característica de muitos diagnósticos de saúde mental, incluindo depressão e transtorno bipolar. Mas é mais comumente associada aos transtornos psicóticos, como a esquizofrenia. Além de ser uma característica definidora do transtorno de personalidade paranoide e do transtorno delirante persistente", informa o psiquiatra Luan Diego Marques, especialista em terapia interpessoal pelo Prove (Serviço de Assistência e Pesquisa em Violência e Estresse Pós-Traumático), ligado à Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), e professor colaborador da Faculdade de Medicina da UnB (Universidade de Brasília).

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Dificilmente quem tem a doença irá notar que está com algum distúrbio, por isso é importante pessoas próximas se atentarem a mudanças no comportamento
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A diferença entre o normal e o patológico reside no grau de prejuízo à qualidade de vida, à capacidade profissional e aos vínculos afetivos. "Sintomas paranoicos podem levar a variados graus de prejuízo no relacionamento interpessoal e social", reforça Leite. E tais prejuízos emocionais podem se manifestar desde um isolamento total, pelo medo de exposição e de risco externo, até atos de agressividade devido à sensação de que alguém pode fazer mal a você.

Será que estou muito paranoico?

Cada um tem sua própria régua interna. "É importante medir se a cautela se transformou em um medo ameaçador que está limitando a vida, ou ajuda para que possa ponderar e estabelecer melhores decisões", ensina Mauro. Por isso, se a pessoa anda sentindo um medo constante e desconfortável, vale buscar ajuda de um psiquiatra para analisar em que nível essa apreensão se encontra.

É importante destacar que a pessoa que sofre com esse quadro não se percebe doente. "Geralmente, quanto mais grave a doença mental, menos consciência ou percepção a pessoa tem de que está realmente experimentando o sintoma de paranoia", confirma Marques. Portanto, aos que percebem uma mudança de comportamento em alguém que passa a questionar tudo, se isolar, não querer falar ou sempre achar que tem algo ameaçador, apresentando mudanças em relação ao comportamento anteriormente, considere indicá-lo a uma avaliação psiquiátrica.

Já os melhores antídotos para a paranoia do dia a dia são o suporte social, a amizade, o humor e atividades voltadas à qualidade de vida como meditação, esporte e espiritualidade. Até mesmo a fuga do noticiário constante e principalmente das fake news pode ajudar. "Não disseminar informações de caráter parcial e duvidoso pode ser particularmente útil e socialmente responsável num momento tão delicado como o que vivemos", finaliza Leite.