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Deputado diz que alertou Bolsonaro sobre suspeitas na compra de Covaxin

Do UOL, em Sâo Paulo

23/06/2021 12h52Atualizada em 23/06/2021 19h12

O deputado Luís Miranda (DEM-DF) afirmou que alertou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, sobre um suposto esquema de corrupção envolvendo a compra da vacina Covaxin.

Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo, o parlamentar explicou que se encontrou com Bolsonaro em 20 de março para levar a denúncia ao presidente. A reunião ocorreu um mês após o governo assinar contrato com a Covaxin. De acordo com o parlamentar, ele apresentou documentos que apontavam irregularidades.

Além disso, Miranda explicou que o irmão dele Luis Ricardo Fernandes Miranda, chefe de importação do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, sofreu pressões dos superiores para aprovação do contrato. Mesmo com o aviso, o governo manteve o acordo. Em reportagem publicada ontem por O Estado de S.Paulo, documentos do Ministério das Relações Exteriores mostram que a gestão Bolsonaro pagou 1.000% a mais no preço da vacina do que foi anunciado seis meses antes pela fabricante.

"No dia 20 de março, eu denunciei o esquema para Bolsonaro", disse o deputado ao Estadão hoje. "O presidente viu a gravidade e, naquele momento, ele fala pra gente 'vou acionar agora o DG (diretor-geral) da Polícia Federal para cuidar do caso'", disse Miranda. Procurada pela reportagem do jornal, a PF informou que "não comenta nem confirma a existência de possíveis investigações em andamento".

Miranda explicou que levou documentos para reforçar a denúncia ao presidente. "Quando eu levo para o presidente a informação, não só levo a informação, como levo documentos, o contrato e a invoice [fatura] emitida naquela semana, paga, de uma vacina que não possuía Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que não estava no nome do contratado e nem no do intermediário do contratado. Uma pressão, inclusive, dos chefes do meu irmão, para que ele cumprisse com aqueles documentos, para que ele importasse, algo que qualquer empresa, não só o governo, jamais fariam. Estava em desconforme. Escancarado ali uma ilegalidade", disse o deputado ao Estadão.

O autor da denúncia prestou depoimento ao Ministério Público Federal, quando revelou pressões do governo para assinar o contrato com a Covaxin e favorecer a Precisa Medicamentos, empresa que intermidia a negociação. Ele foi demitido do Ministério da Saúde e o deputado procurou Pazuello para que interviesse na situação.

Procurei o ministro e, vendo que não tinha nenhum erro por parte dele - o ministro se sente muito constrangido -, falei que ia levar à imprensa. O papel dele é defender o Ministério da Saúde, defender aquilo que acredita ser correto, e naquele momento [assinar a autorização de importação] seria o mesmo que o Ministério dizer que concorda com atos ilícitos, atos errados, no mínimo suspeitos. Obviamente o ministro entendeu isso e suspendeu a exoneração
Luís Miranda, em entrevista à CNN

O deputado revelou que seu irmão vinha sofrendo pressões desde 2020, e que em 2021, a história se repetiu

Uma pressão inacreditável, onde chegou ao cúmulo de, com um contrato assinado para importação da Covaxin em nome da empresa A, com interveniente B, chegar um invoice [nota fiscal para pagamento do governo] para que ele acatasse a importação em nome de uma empresa C, que nem contratava estava, com discrepâncias claras em comparação com o contrato assinado
Luís Miranda, em entrevista à CNN

"O contrato afirmava que o pagamento seria após o recebimento das vacinas, e na nota fiscal tinha informação de que o pagamento seria adiantado. No contrato a informação era de que seriam x milhões, e no invoice, de que estariam comprando agora 300 mil doses a 45 milhões de dólares, a serem pagos naquele momento. Ele [Luís Ricardo] falou que não iria assinar. E o que acontece: recebe uma mensagem do Coronel Pires, uma sexta-feira, às 23h, dizendo que está com a empresa pressionando para isso ser efetuado quanto antes. É o cumulo do absurdo o Estado, a União, estar trabalhando para uma empresa. Nós trabalhamos para o povo brasileiro, para vacinar a população. Quando ele me trouxe isso, disse que iríamos ao presidente Bolsonaro."

Ameaças à segurança

Luís Miranda foi categórico ao afirmar que existe uma organização criminosa agindo dentro do Ministério da Saúde, e disse temer por sua vida e pela do irmão, Luís Ricardo.

"Tem um sistema funcionando, é uma organização criminosa. Isso eu tenho certeza. Agora se eu disser que é A, eu vou ter que pagar pelo que eu falei, e numa estrutura como essa, talvez a gente tenha um aparelhamento de vários setores, e eu saia como errado, como já aconteceu. Me lembro bem o que eu já passei. Só que dessa vez, eu dei o azar ou sorte de ter uma CPI falando 'aqui não'. 'Se seu irmão vier falar a verdade, terá todo apoio'. PF estava lá dentro. Não acreditei em senadores, ou que a CPI tenha um proposito A, B ou C. Isso é crime, bandidos dispostos a tirar vidas. Eu não estou 'explodindo', fui colocado em uma confusão e nao queria estar dentro dela. Mas saber de algo tão grave e não passar para frente é o mesmo que compactuar".

"Nós temos uma empresa que tem interesse em bilhões de dinheiro público com um procedimento totalmente desconforme. Será que ela não tem interesse em calar quem está atrapalhando seus negócios? Talvez não, não posso afirmar, mas uma coisa eu posso: uma estrutura como essa não começou hoje, da noite para o dia, não começou agora esse tipo de lobby", afirma.

"Temos que abrir a caixa preta, espero que meu irmão tenha coragem de falar tudo que eu já escutei, e pelo que escutei, sairá muita gente presa do Ministério da saúde. E alguns até de fora, que estão acostumados a fazer lobby ali."

"Para chegar nesse nível, no tipo de documentação que me foi apresentado, não começou hoje, e ninguém chega nessa posição sendo bonzinho. E se ficar comprovado que existia corrupção, intenção de desviar dinheiro público, volto a dizer, minha vida e do meu irmão estão em risco, porque quem faz isso é bandido. Se não ficar comprovado, se foi um erro de procedimento, improbidade administrativa para os servidores para saúde, e talvez nossas vidas estejam preservadas. Mas se houve corrupção, e o senhor tem dúvidas de que os envolvidos são bandidos? Quem desvia dinheiro da saúde é bandido, tem que ir para a cadeia. Vocês acham que eles tão ligando para as vidas perdidas na pandemia? Não ligam. Acham que vão ligar para a minha?".

Após a entrevista concedida pelo deputado, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que a CPI da Covid iria requisitar segurança para Luís Miranda e Luís Ricardo.

Francisco Emerson Maximiano, sócio-administrador da Precisa Medicamentos, tinha depoimento marcado para hoje na CPI, mas alegou estar em quarentena após retorno da Índia. A Comissão então adiou a agenda para a próxima semana.