Topo

Saúde

Sintomas, prevenção e tratamentos para uma vida melhor


UOL Debate: sem adesão à vacinação, pandemia não acabará nunca

Do VivaBem, em São Paulo

14/12/2020 19h28

O UOL Debate reuniu, nesta segunda-feira (14), especialistas na área da saúde para analisar a corrida mundial pela vacina contra covid-19. Os convidados discutiram sobre o momento atual da pandemia, os esforços para as aprovações nas agências regulatórias do mundo todo e a importância da adesão à vacinação. A conversa foi mediada pela colunista do VivaBem Lúcia Helena.

O debate começou com o médico doutor em imunologia pela USP e diretor superintendente de pesquisa do Hospital Israelita Albert Einstein, Luiz Vicente Rizzo, citando o aumento de casos no mundo todo. Na visão dele, as pessoas "perderam o medo da pandemia" e "estão achando, erroneamente, que está seguro". "O ser humano perdeu o medo de um negócio que deveria estar com medo ainda", afirma.

Cristina Bonorino, imunologista e integrante do comitê científico da SBI (Sociedade Brasileira de Imunologia), explica que a proteção da população depende da quantidade de pessoas que se vacinarem. Só assim a doença pode ser erradicada. "Se não houver adesão, a pandemia não acaba nunca. Vamos continuar transmitindo o vírus e as pessoas vão seguir doentes", diz.

Para reforçar a importância da vacinação, a imunologista citou ainda casos de reinfecção já documentados, inclusive no Brasil, além dos diferentes efeitos que a covid-19 pode causar e as sequelas da doença.

Fatores no desenvolvimento da vacina

Apesar de ainda não ser certo quando teremos uma vacina, a rapidez é surpreendente. Antes demoraria, em média, 10 anos para ficar pronta, sendo que cinco desses anos eram penas regulatórios. "Isso significa que as agências regulatórias do mundo inteiro, incluindo o Brasil, tinham exigências para as vacinas que vão muito além do que você tem, por exemplo, para outros medicamentos", explica Rizzo.

Neste grande desafio da pandemia, o médico afirma que o "grande ganho" é o entendimento das agências regulatórias de que havia uma regulação excessiva para aprovação das vacinas. "Metade do tempo que foi ganho no desenvolvimento das vacinas não tem nada a ver com a segurança delas ou com os riscos, mas sim com a 'água batendo no joelho dos burocratas' e eles dizendo 'precisamos fazer uma coisa'".

Gustavo Cabral, doutor em imunologia pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP e colunista do VivaBem, cita que, durante o desenvolvimento de uma vacina, é normal que ocorram interferências, como a financeira e estrutural, e dá um exemplo: "O nível de infecção pode não ser alto o suficiente durante a fase 3 para que se conclua o teste naquele ano. Muitas vezes, tem que esperar mais um ano, se for uma questão sazonal, para ter o número de infecção para ter um 'know how'".

Cabral também destacou o investimento público e privado, citando as empresas que, mesmo não necessariamente envolvidas na produção da vacina, passaram a investir por conta do "prejuízo incalculável de vidas e também financeiro".

Natalia Pasternak, doutora em microbiologia pela USP e especialista em genética molecular, ressaltou ainda a importância do investimento que foi feito nesta corrida pela vacina. "Teste clínico é uma das coisas mais caras do mundo. Ter investimento é essencial para as coisas corram mais rápido. Imagina que precisamos de financiamento para recrutar, monitorar e acompanhar 70 mil pessoas ao mesmo tempo e de uma vez?".

Pasternak explica que esse desenvolvimento foi rápido porque contou com a colaboração de diversas empresas e farmacêuticas, além da necessidade de urgência para conter a covid-19.

É melhor se vacinar ou pegar a doença?

Há também uma falácia de que é melhor contrair covid-19 para criar uma resposta imune do que tomar a vacina. A afirmação é considerada "irresponsável", segundo Bonorino. "Não sabemos o suficiente sobre a doença para dizer que a infecção causa imunidade duradoura, como já sabemos que ocorre com o sarampo, por exemplo".

Com os vírus respiratórios, caso da covid-19, a imunologista diz que ocorre o contrário. "Ele possui muitas estratégias de fugir do sistema imune e não deixar uma imunidade duradoura. Ainda estamos aprendendo como eles fazem isso", explica a imunologista.

"Grupo de idosos não deve ser prioritário"

O médico imunologista Luiz Vicente Rizzo explica que, na opinião dele, o grupo de idosos não deveria ser prioritário nas campanhas de vacinação —como está ocorrendo na Inglaterra e, em breve, nos EUA.

"Se você quer vacinar o grupo por idade, você vacina as pessoas acima de 60 anos ainda ativas. Porque essa pessoa tem risco muito maior de pegar [covid-19] e apresenta uma resposta razoável para a vacina", diz Rizzo. Ele explica que, quando analisou os dados brutos das vacinas, principalmente a desenvolvida pela Pfizer, os resultados começam a falhar em quem tem mais do que 70 anos.

Bonorino concorda: "Os idosos, a partir dos 70 anos, têm mais dificuldade em montar novas respostas imunes. A vacina, depois do 70, serve para estimular memórias que a pessoa já tem [que são criadas ao longo da vida], que não precisa ser superespecífica".

Por conta disso, a imunologista reforça a necessidade de estudos focados em idosos, para entender se eles devem ser, de fato, prioridade. "Precisamos de estudos que mostrem a proteção em idosos. O que estamos medindo hoje é a eficácia em adultos".

Rizzo diz que a prioridade deveria ser os profissionais de saúde e indivíduos ativos nos grupos de risco. E dá exemplos: os motoristas de táxi ou de ônibus e os professores.

"Estamos no fim da fila"

Muitas pessoas acham que ao tomar as primeiras doses de vacina, a vida voltará ao normal, mas não é bem assim, conforme explica Natalia Pasternak. "A eficácia das vacinas nunca é de 100% porque sempre vai ter uma parte das pessoas que receberam a dose, mas não estarão imunizadas", diz. "São as pessoas com imunodeficiências, as gestantes, quem está amamentando e, dependendo da vacina, em algumas crianças".

Pasternak explica que essa vacinação será feita em grupos prioritários, que serão definidos de acordo com a exposição à doença e o risco de desenvolver para uma doença grave e morte. "A maior parte da população, entre 18 e 55 anos, sem comorbidade, fora do grupo de risco, ficará no final da fila", afirma. E isso quer dizer que as medidas de proteção, como usar máscara, evitar aglomerações, devem ser mantidas até que toda população seja vacinada.