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Paola Machado

REPORTAGEM

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Entenda as mudanças físicas e emocionais do puerpério e o que fazer

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Imagem: iStock

Colunista do UOL

19/10/2021 04h00

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Muito se fala sobre as mudanças físicas que acontecem durante a gestação no corpo da mulher, mas ainda hoje pouco se aborda sobre as mudanças que ocorrem no pós-parto e o que a puérpera pode fazer para vivenciar essa fase da melhor forma possível.

Primeiro, vale elucidar que esse período que segue a chegada do recém-nascido é chamado puerpério, e assim como na gestação, envolve diversas mudanças físicas, hormonais, mentais e emocionais.

Didaticamente, o puerpério pode ser dividido em: imediato (1º ao 10º dia), tardio (11º ao 45º dia) e remoto (a partir do 45º dia). Pode ser compreendido como um processo em que o corpo da mulher se reorganiza e em que muitas mudanças acontecem de forma concomitante, como a queda de alguns hormônios e a produção de novos, o enchimento da mama, a perda de peso alterando a questão postural e articular, a reorganização dos órgãos, a eliminação de líquidos, entre diversas outras mudanças que perpassam as mudanças físicas apenas.

Não se compare

No pós-parto, algumas mulheres se preocupam com o retorno rápido do corpo ao que era antes da gravidez. Muito da expectativa de "voltar ao corpo" pré-gestação rapidamente é gerada pela exposição da mídia mostrando corpos "perfeitos" de artistas puérperas em capas de revista, que não representam a realidade da grande maioria das mulheres no pós-parto.

O que deveria ser normalizado nas imagens é um corpo pós-parto em recuperação. A reorganização de cada órgão, o sangramento, o inchaço sendo eliminado aos poucos, a permanência de uma "barriguinha" ou uma "barrigona", a flacidez… Nesse momento, vale lembrar que o corpo levou 9 meses para gerar diversas mudanças e seu retorno também será um processo que pode perdurar entre 6 meses a um ano.

No primeiro semestre pós-parto, pode haver a perda de peso corporal entre 0,6 e 0,8 kg. Dados mostram que no ano do parto, 42% das puérperas retornam ao seu peso pré-gestação, mas não necessariamente ocorre a perda significativa de gordura corporal.

No contexto da gestação e do pós-parto, há uma tendência de redução da atividade física. No pós-parto, além da diminuição da atividade física há uma tendência também ao aumento do aporte calórico. Por isso, cerca de 20% das mulheres mantêm ou, inclusive, aumentam seu peso, sendo ainda que este ganho adicional pode ter um efeito cumulativo sobre as gestações seguintes.

E é nesse caso que o cuidado vai além da preocupação estética, havendo um maior risco de obesidade e alterações do perfil cardiometabólico, como a resistência à insulina.

Existem diversas variáveis que influenciam nessa retenção ou ganho de peso. Além de a lactação aumentar a necessidade calórica diária, uma questão pouco abordada, mas que tem impacto importante na saúde da puérpera, é a influência da mudança de padrão de sono.

Por conta do contexto de cuidados com o bebê, há uma significativa privação de padrão de sono da puérpera que pode perdurar por semanas e meses. Para se ter ideia, o sono materno é considerado um fator de risco para o ganho de peso e obesidade no pós-parto. Estudos apontam que aos 6 meses pós-parto, as mulheres que dormem menos de 5 horas/dia de sono retêm cerca de 5 ou mais quilos no primeiro ano do nascimento do bebê.

Isso é, a perda ou retenção de peso da puérpera depende de comportamentos relacionados não apenas à dieta por si só ou ao sedentarismo, mas ao sono e várias outras questões que impactam diretamente com a rotina de cuidado e a rede de apoio dessa puérpera.

Você já ouviu falar em baby blues?

Na correria de trocas de fraldas, choros e reconhecimento de novos papéis, a mulher pode se sentir extremamente sobrecarregada em todos os sentidos. Fisicamente pode haver dores, inchaço, fadiga, adaptação com a amamentação e privação de sono.

Nessa fase é bastante comum a ocorrência do baby blues, que pode afetar cerca de 50% a 85% das mães até dez dias após o parto. Ele é marcado por um quadro melancólico, com choro frequente, ansiedade e irritabilidade. É importante ressaltar que esse é um quadro transitório e se diferencia da depressão, psicose e outros transtornos de humor pós-parto que necessitam de ajuda especializada.

Exercícios no puerpério

A realização da atividade física pós-parto é uma grande aliada da mulher, não só para a "recuperação" do corpo, mas também para a manutenção do seu bem-estar.

Sempre reforço a importância dos exercícios para garantir saúde física e mental, e no puerpério não poderia ser diferente. Os exercícios liberam neurotransmissores como serotonina, dopamina e noradrenalina. Além disso, estudos sugerem o papel do exercício na maior concentração de marcadores como GH (hormônio do crescimento) e IGF-1, responsáveis pela regulação do sono, função cognitiva e humor, proporcionando bem-estar.

Estudos epidemiológicos têm observado uma relação inversa entre a prática de uma atividade física e a depressão materna pós-parto. Além disso, no ponto de vista físico, as puérperas que se mantêm regularmente ativas apresentam menor retenção de peso quando associada à dieta e melhoram a capacidade cardiorrespiratória, os níveis de colesterol e a sensibilidade à insulina.

Reforço que para a mãe se exercitar é preciso a liberação médica independente da via de parto ter sido normal (vaginal) ou cesárea. No geral, a cesárea por ser uma cirurgia de grande porte exige mais tempo de recuperação. Mas lembre-se que cada caso deve ser avaliado individualmente e cada mulher pode levar um tempo específico para ser liberada para a atividade física.

Movimente-se sem neuras!

Pesquisas mostram que tanto a gravidez quanto o pós-parto estão associados a uma redução do nível de atividade física. O puerpério pode trazer mais limitações nesse sentido, uma vez que se torna um desafio ajustar a rotina de cuidados com bebê, com a casa e o cuidado consigo. Além disso, há o cansaço, a privação de sono, e até a falta de uma rede de apoio desmotivando a adesão a qualquer tipo de atividade física.

A fisioterapeuta Juliana Satake, especializada em saúde da mulher pela Unicamp, reforça que uma mãe que não está bem fisicamente ou emocionalmente, dificilmente conseguirá cuidar de seu bebê da forma que gostaria.

O ideal é que ela tenha apoio, seja do(a) parceiro(a), familiares e amigos para que possa se organizar e cuidar da melhor forma de si e do bebê, e claro, sempre dentro de sua realidade e possibilidades. Ela lembra que o autocuidado envolve encontrar pequenos momentos na rotina que a façam bem e não precisa ser nada grandioso, pode ser um banho, uma caminhada, uns minutos alongando na cama antes de se levantar.

No puerpério já há muitas mudanças e transformações acontecendo e a mulher não precisa de mais autocobrança em relação à estética do corpo, o foco deve ser em se manter saudável para estar bem, cuidar bem de si e do bebê. Caso esteja com dificuldades nesse período, conte com pessoas de confiança, fale com seu médico e a equipe de saúde.

*Colaboração de Ângela May, especializada e responsável pela fisioterapia da mulher na Clínica La Posture e Renata Luri, fisioterapeuta doutorada pela Unifesp

Referências:

Cartilha puerpério: http://www.ee.usp.br/cartilhas/cartilha_puerperio.pdf

https://www.febrasgo.org.br/pt/

Institute of Medicine (US); National Research Council. Weight gain during pregnancy: reexamining the guidelines. Washington, DC: The National Academies Press; 2009.

Jardí C, Aparicio E, Bedmar C, Aranda N, Abajo S, March G, Basora J, Arija V, Study Group TE. Food Consumption during Pregnancy and Post-Partum. ECLIPSES Study. Nutrients. 2019 Oct 14;11(10):2447. doi: 10.3390/nu11102447. PMID: 31615024; PMCID: PMC6836140.

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MA Falivene, AB Orden. Maternal behavioral factors influencing postpartum weight retention. Clinical and metabolic implications. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, 2017 - SciELO Brasil.