Surto na Bahia é alerta para transmissão da doença de Chagas por alimentos

Recentemente, conversei com Artur Gomes Dias Lima, professor pleno de ecologia médica da Uneb (Universidade do Estado da Bahia) e professor adjunto da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Publica.

Ele me falou do alerta emitido pela Vigilância Epidemiológica do Estado da Bahia sobre o surto de transmissão oral da doença de Chagas e a confirmação de cinco casos e uma morte que ocorreram no primeiro semestre na Bahia.

Conhecida há mais de um século, a doença de Chagas é causada pelo parasita Trypanosoma cruzi (T. cruzi).

O problema é transmitido pelo inseto popularmente conhecido como barbeiro.

A condição costuma afetar a população mais pobre, já que o barbeiro se esconde em rachaduras e fendas de casas velhas ou de taipas.

O barbeiro se alimenta de sangue humano e, ao no picar, geralmente também faz cocô em nossa pele. Aí, ao coçar o local da picada, a pessoa acaba levando as fezes com o parasita até o ferimento, e o T. cruzi entra na corrente sanguínea.

Apesar de a "picada" do barbeiro ser historicamente o principal meio de transmissão da doenças de Chagas, a transmissão oral também tem ocorrido frequentemente: ela pode acontecer quando alguém come alimentos contaminados com o inseto ou com suas fezes.

Exemplos clássicos são o açaí e o caldo de cana. O barbeiro pode ser triturado na produção desses alimentos, que ficam contaminados com o T. cruzi.

Mas a transmissão pode ocorrer também pelo consumo de carne de caça mal-cozida ou até mesmo em uma salada mal-lavada contaminada com as fezes do inseto.

"Doença silenciosa e silenciada"

O problema é chamado de "silencioso", pois muitas consequências relacionadas à doença, como as complicações cardíacas, podem ocorrer vários anos depois da infecção.

E é chamada de "silenciada" por causa da questão social, já que é mais comum em pessoas pobres, "que não têm voz" e contam com pouco acesso às políticas públicas e serviços de saúde.

Precisarmos alertar constantemente a sociedade sobre a doença de Chagas e também cobrar mais políticas públicas. É inegável o quanto evoluímos na luta contra essa doença. Isso se deve muito ao genial pesquisador brasileiro Carlos Chagas, que deveria ter recebido o Nobel, por sua enorme contribuição para a ciência médica.

Entre as diversas contribuições do pesquisador, é inegável a histórica descoberta do ciclo biológico da doença de Chagas, desde o parasita causador da doença (T. cruzi) até a caracterização de boa parte da patologia.

Carlos Chagas ainda identificou o inseto vetor (barbeiro) do parasita e reservatórios domésticos do vetor etc. Hoje nós devemos trabalhar para dar continuidade ao legado deste grande cientista.

Mesmo num momento de forte negacionismo que vivemos, não podemos baixar a bandeira da ciência e da saúde pública, pois doenças como a de Chagas ainda geram enorme sofrimento para muitas pessoas que precisam de atenção e cuidado,

Devemos entender e compartilhar a informação de que a ciência é uma das maiores conquistas humanas e sociais, e sua história de credibilidade faz com que sigamos trabalhando para utilizá-la em prol da vida nos mais diversos aspectos.