Elânia Francisca

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Opinião

Cada regra, um motivo: como conversar com adolescentes e tecer combinados?

Não, esse texto não é um manual de como conversar com adolescentes. "Ué, mas não é isso que diz o título?" Sim, o título é exatamente esse, mas a ideia aqui é de propor reflexões sobre um tema extremamente desafiador para pessoas adultas que convivem com adolescentes: a construção e respeito às regras e combinados em casa ou em serviços de acolhimento institucional.

Quando o assunto é convivência com adolescentes, muitas pessoas adultas expressam o quanto é difícil fazer com que as regras sejam cumpridas e respeitadas.

"É sempre uma luta lá em casa, eu falo para levar o lixo para fora, ele concorda, mas dali a pouco ele simplesmente não cumpre o que pedi." Essa foi a fala da madrasta de um adolescente de 16 anos.

Casada com o pai do garoto há dez anos, Joana (nome fictício) diz que na infância, os combinados eram construídos coletivamente na sala com cartolina e colada na parede. Tudo era lúdico e funcionava bem, mas agora o menino afirma esquecer o que foi pedido e se zanga quando a família cobra maior atenção da parte dele.

O caso de Joana e do enteado de 16 anos foi trazido para ilustrar uma situação muito comum na adolescência: o esquecimento de uma regra ou combinado que foi feito há poucas horas.

Acredito que a primeira coisa que nós, pessoas adultas, precisamos fazer nesse caso, antes mesmo de abordar o adolescente, é reforçar internamente que nós somos as pessoas adultas da situação e é nosso papel explicar o motivo da existência daquela regra e combinado, além de reafirmar a importância coletiva daquela regra quantas vezes for necessário.

Quando uma criança não cumpre algum combinado, o que fazemos?

Nós a chamamos para uma conversa e recordamos o combinado ou regra. Nós dizemos algo como: "Você se lembra do que falamos? Lembra que combinamos que você arrumaria seus brinquedos depois de brincar? Você se lembra por que é importante organizar os brinquedos?".

Com adolescentes algo parecido precisa acontecer: "Pedro, você se lembra que combinamos de levar o lixo para fora? O que é possível fazer para que você não se esqueça dessa tarefa na próxima vez?"

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Pedro (que também é nome fictício) já sabe que esqueceu a tarefa e que não foi legal. Ele sabe que o lixo ficará ali até a próxima vinda do caminhão de coleta. Então precisamos ajudá-lo a criar estratégias para cumprir esse combinado numa próxima vez.

Colocar o lixo para fora é uma tarefa que impacta na coletividade e é por isso que essa tarefa ajuda adolescentes a pensarem sobre comunidade, sobre seu papel e formas de ter responsabilidade sobre algo que é de todo mundo.

Brigar, gritar ou fazer com que adolescentes se sintam mal por não conseguirem cumprir um combinado de primeira pode fazer com que sintam que não são capazes de viver coletivamente ou desistirem de cooperar.

Você nem precisa me dizer aquela famosa frase: "Para você é fácil falar".

Eu sei que é fácil falar e e é justamente por isso que precisamos entender a prática desse exercício como um desafio e não como uma atividade fast food (que já vem prontinha num pacotinho).

Tudo é mais fácil na teoria, e eu sei disso, mas precisamos nos propor a fazer o exercício difícil de dialogar com adolescentes em nome do fortalecimento emocional e desenvolvimento saudável.

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Esse texto é um início de conversa, em breve trarei mais algumas reflexões sobre regras, combinados e acolhimento de adolescentes.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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