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Erundina, eleita deputada federal aos 87 anos: 'Será meu último mandato'

A deputada Luiza Erundina em sessão parlamentar; ela irá para sétimo mandato na Câmara - Reprodução/TV Cultura
A deputada Luiza Erundina em sessão parlamentar; ela irá para sétimo mandato na Câmara Imagem: Reprodução/TV Cultura

De Universa, em São Paulo

05/10/2022 11h51

Com mais de 113 mil votos, Luiza Erundina (PSOL-SP), de 87 anos, foi eleita para seu sétimo mandato como deputada federal. Em entrevista a Universa, ela, que entrou no Congresso Nacional pela primeira vez como parlamentar em 1998, afirmou que certamente este será seu último mandato.

"Pretendo dedicá-lo ao trabalho de base dos setores populares. O nível de consciência e participação política caiu muito de uns anos para cá. Os partidos de esquerda deixaram as bases populares e ficaram no plano institucional. É preciso retomar esse processo", disse.

A deputada conta que planeja fazer isso através dos mecanismos de participação direta do Congresso, com o fortalecimento de comissões participativas e assembleias. Segundo ela, a sustentação de um governo progressista, caso Lula seja eleito, vai depender desta participação.

'Renovação política não tem nada a ver com a idade'

Quando assumir seu novo mandato, Erundina já terá completado os 88 anos e será a parlamentar mais velha da Câmara dos Deputados.

A deputada Luiza Erundina, 87 anos: 'Renovação política não tem nada a ver com a idade' - Wesley Amaral/Câmara dos Deputados - Wesley Amaral/Câmara dos Deputados
A deputada Luiza Erundina, 87 anos: 'Renovação política não tem nada a ver com a idade'
Imagem: Wesley Amaral/Câmara dos Deputados

Em 2018, a deputada se queixou de preconceito de eleitores por ser idosa. Ela afirma que isso se intensificou na campanha deste ano: "As pessoas diziam coisas como 'ela é muito velha, vamos colocar alguém mais jovem'. Elas não entendem que renovação política não tem nada a ver com a idade. Nestes seis mandatos, vi muita gente jovem sendo eleita, mas eram filhos dos mesmos caciques políticos de sempre, que não representavam uma diferença".

Para Erundina, o importante é a renovação de ideias. "Ela se dá por meio de uma mudança de prática política, não por faixa etária. Não posso fazer o mesmo mandato que já fiz. Tenho que revolucionar meu mandato e servir à sociedade, que não é mais a mesma e pode ter outros problemas. Gostaria de influenciar mais jovens para que eles entendam isso: o poder não é deles [parlamentares], e a participação popular tem que se dar permanentemente e não só no momento de eleição."

Segundo ela, o etarismo [preconceito com pessoas mais velhas] se alia com o machismo já que políticos homens que têm idade próxima a dela não são tratados da mesma maneira. Ela cita seu colega Eduardo Suplicy (PT), que foi eleito como deputado estadual em São Paulo.

"Ninguém reclama que ele é velho demais. Ele é visto como um jovem de 80 anos, claro. Ele foi indicado pelo partido como candidato, porque o PT queria ter uma bancada para dar sustentação na assembleia. Ele teria condições de concorrer pelo Senado", diz.

"No meu caso, soma-se ao fato de ser idosa, ser mulher, ser nordestina, ser de esquerda. Esse era o preconceito que sofri como prefeita", diz.

"Quero ajudar as mulheres a não se sentirem velhas antes do tempo. Depois dos 60 anos, somos taxadas de idosas e só perguntam coisas relacionadas a nossa saúde, se já pensamos em ter cuidadoras, em aposentadoria. Ninguém pergunta a uma mulher idosa como sua experiência de vida pode contribuir com a sociedade" - Luiza Erundina, deputada federal

"Temos que rejeitar aquilo que nos foi imposto como velhice. Não é doença, não é defeito. É um estágio de vida que tem limites e possibilidades."

Na Câmara, a diferença entre ela e seus colegas mais jovens no Congresso será de 66 anos — os deputados mais jovens eleitos neste ano, Ícaro de Valmir (PL-SE), Amom Mandel (Cidadania-AM) e Lula da Fonte (PP-PE), têm 21 anos. Suas colegas de partido Sâmia Bomfim e Célia Xakriabá, também eleitas deputadas federais, têm 32 anos.

Fora da Câmara, Erundina fala que tem bons diálogos com os mais jovens. "Minha relação com a juventude é muito boa. Tenho facilidade e aceitação entre eles. Modéstia à parte, me mantenho jovem apesar do número de anos", afirma. "Paulo Freire me dizia que eu era mais educadora do que política e depois me disse que eu era uma 'política educadora'. Minha relação com as pessoas se dá de forma fraterna e afetiva, então quero sempre aprender com jovens, como a forma de lidar com as tecnologias, por exemplo", diz.

A deputada acredita no legado que vai deixar. "São eles que vão dirigir o país depois de mim. É uma felicidade saber que aquilo que sonho pela política terá continuidade desses jovens porque sonhos não envelhecem e não cabem em uma só vida."

Força bancada feminina na Câmara

Ela comemorou o aumento da bancada feminina na Câmara — que passou de 77 para 91 deputadas. "Em 2006, não éramos nem 10%. Crescemos consideravelmente essa bancada, ainda que sejam perfis ideológicos bastante diferentes. A bancada só atua unificadamente quando são questões relativas aos direitos e participação das mulheres", disse.

Erundina também comemorou o aumento de pluralidade com a eleição de parlamentares indígenas, quilombolas e LGBTQIA+. "É importante uma representação mais plural. Mas nós também temos que ter uma ação política que reflita os interesses de classe e para promover igualdade de direitos na sociedade", afirma.

No entanto, disse que nunca se elegeram tantas "figuras estranhas" como nesta eleição. Figuras, segundo ela, que vão acentuar o autoritarismo na política.

"Nunca tivemos um governo tão violento, tão obscurantista e de destruição da política e dos valores humanos. Nessa última legislatura, tivemos grupos que extrapolaram o estado democrático de direito. Havia momentos de votações e decisões de matérias que o presidente da Câmara se comportava como líder do governo e chegava ao extremo de alterar o regimento interno da Casa. Isso era muito autoritário e será mais acentuado e grave no legislativo, pelo perfil dos novos parlamentares eleitos."

Perseguida pela ditadura e 1ª prefeita de SP: quem é Luiza Erundina

Nascida em Uiraúna (PB), exerceu seu primeiro cargo público quando foi secretária de Educação de Campina Grande, no mesmo estado. Perseguida pela ditadura, foi para São Paulo em 1971. Na década de 1980, ajudou a fundar o PT, partido que ela deixou em 1997 ao entrar para o PSB. Ela se filiou ao PSOL em 2016.

Sua primeira vitória política foi em 1982, quando ganhou a eleição para vereadora na capital paulista - na época ela era filiada ao PT (Partido dos Trabalhadores). Depois, em 1986, elegeu-se deputada estadual. Erundina foi a primeira mulher a assumir a prefeitura de São Paulo, cargo que exerceu entre 1989 e 1992.

Erundina, que atua há quatro décadas na política institucional, foi eleita para seu 7º mandato como deputada federal.