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Justiça proíbe venda de livro que ensina pais a castigarem fisicamente

Livro e palestras ensinam pais a utilizar correção física contra as crianças e adolescentes, diz MP - Getty Images
Livro e palestras ensinam pais a utilizar correção física contra as crianças e adolescentes, diz MP Imagem: Getty Images

De Universa, em São Paulo

28/07/2020 10h12Atualizada em 28/07/2020 12h25

O MPRJ (Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro) obteve na sexta-feira (24) decisão favorável à ação civil pública ajuizada para que seja proibida a venda do livro "O Que Toda Mãe Gostaria de Saber Sobre Disciplina Bíblica", de Simone Gaspar Quaresma, que ensina pais a educarem seus filhos através de castigos físicos.

Além da comercialização, foi impedida a publicação do conteúdo na internet. De acordo com a decisão, os links para palestras da autora sobre o mesmo assunto também devem ser retirados de circulação na internet, sob pena de pagamento de multa.

Em nota, a defesa de Simone informou respeitar a decisão judicial, mas que não há ilegalidade nas ações dela (veja abaixo o comunicado na íntegra).

A 1ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância e da Juventude da Capital relata na ação que no livro e em suas palestras, a autora ensina a utilizar correção física contra as crianças e adolescentes, com uso de vara e colher de silicone, além de explicar como realizar as agressões em locais que não sejam visíveis.

Além disso, diz o MPRJ, a escritora critica os pais que não aderem à disciplina física, alegando que seus filhos crescem com problemas na vida adulta sem saber lidar com eles e se tornam pessoas que "vivem para si".

O livro também indica que o uso da vara deve ser investido na infância para ser menos recorrente na adolescência, e destaca que a punição deve causar dor para fazer a criança ou adolescente pensar sobre suas condutas.

Em sua decisão, o juiz Sergio Luiz Ribeiro de Souza afirma que o direito à integridade física e psicológica das crianças e adolescentes deve prevalecer sobre o direito à liberdade religiosa e de expressão.

"A ré tem plena ciência de que o que prega é contrário à lei, tanto assim que ensina os pais a baterem em locais que não sejam visíveis, bem como a orientar seus filhos a não delatar as agressões. O perigo de dano é evidente, haja vista que os livros e vídeos incitando os pais a agredirem seus filhos estão acessíveis ao público, colocando em risco a integridade física de crianças e adolescentes", destaca um dos trechos da decisão.

"O livro de autoria da primeira ré, 'O Que Toda Mãe Gostaria de Saber Sobre Disciplina Bíblica', em todos os trechos que trata de uso de qualquer tipo de violência (física ou psíquica) contra crianças e adolescentes, sob todo e qualquer fundamento, agride a Constituição Federal, o Pacto de São José da Costa Rica, o Estatuto da Criança e do Adolescente e as demais normas protetivas de crianças e adolescentes. Assim, sua comercialização somente será legítima se forem extirpados tais trechos de seu conteúdo", afirmou o magistrado.

Outro lado

Veja abaixo a nota na íntegra enviada pela defesa da autora:

"Respeitamos a decisão judicial, mas afirmamos, categoricamente, que não há qualquer ilegalidade nas ações orientadas pela Sra. Simone Quaresma, respeitada escritora e conferencista no meio cristão evangélico. A nosso juízo, uma decisão liminar, dada num contexto em que sequer se ouviu os argumentos da escritora, proibindo-se o livre exercício da sua atividade intelectual, a própria liberdade de expressão da autora, é temerária e impactante. Num momento em que a liberdade de expressão é debatida na Suprema Corte e Parlamento do nosso país, é triste reconhecer que não se tem mais receio de violação de liberdade civil fundamental tão básica. Vamos esclarecer os fatos ao Magistrado e recorrer ao Tribunal de Justiça que, certamente, levará em conta esta grave violação de direito humano fundamental perpetrada."

Edmilson Almeida, advogado e assessor Jurídico da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (ANAJURE)